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Argentina cogita restringir ¨avalanche¨ de produtos do Brasil
10/10/2008 - Marina Guimarães - Agência Estado

Medidas de salvaguardas contra o Brasil já estão na mira da Argentina. O governo de Cristina Kirchner está decidido a proteger seu mercado de uma possível ¨avalanche¨ de produtos brasileiros com a desvalorização do real, confirmam fontes ligadas à Casa Rosada, ouvidas pela Agência Estado. Para isso, o país poderia colocar em uso, pela primeira vez, o Mecanismo de Adaptação Competitiva (MAC), que prevê cotas de importação.

A presidente deixou sua decisão bem clara durante discurso na última quinta, por ocasião de um anúncio de investimentos no setor de gás. ¨Queremos um comércio administrado, que vai usar todos os instrumentos necessários que temos no Mercosul para manter o superávit comercial, chave para defender o trabalho dos argentinos, também os investimentos¨, disse Cristina.

Algumas horas mais tarde, a presidente convocou os secretários de Relações Internacionais da Chancelaria, embaixador Alfredo Chiaradía, e o secretário de Indústria, Fernando Franguío, na residência oficial de Olivos, para uma reunião. Antes, os funcionários já haviam se reunido com o chefe de Gabinete da Presidência, Sergio Massa, na Casa Rosada, sede do Executivo, segundo notícias dos jornais argentinos confirmadas por fontes oficiais à Agencia Estado.


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Uma alta fonte do governo argentino explicou à AE que o assunto ¨está sendo tratado com ponderação porque o setor empresarial sempre chora, pede mais e age como se tudo fosse terrível¨. Segundo a fonte, ¨o governo argentino vai operar em defesa de seus interesses nacionais e de suas indústrias, parta que as medidas tenham o menor efeito daninho em relação aos sócios¨.

A iniciativa argentina se deve basicamente à diferença cambial entre os dois países. Enquanto no Brasil, a alta do dólar à vista (negociado em balcão) frente ao real acumula 29,97% em 2008, na Argentina, a moeda norte-americana subiu apenas 2,57% frente ao peso no mesmo período (cálculos feitos com cotações desta tarde). Assim, a grande preocupação da Argentina é que o real desvalorizado num mundo em recessão implica que os produtos brasileiros chegarão ao mercado vizinho custando menos e, portanto, em maiores volumes, já que a mercadoria que iria para outros países poderia ser desviada para o mercado argentino.

Perda de competitividade

Há três semanas a Agência Estado vem ouvindo alertas nesse sentido de analistas e empresários, mas nos dois últimos dias o assunto tem ganhado o destaque principal na agenda oficial e empresarial do país. O presidente da União Industrial Argentina (UIA), Juan Carlos Lascurain, levantou a voz para fazer as advertências sobre a perda de competitividade da indústria argentina e das reivindicações dos industriais: uma desvalorização do peso que acompanhe a do real e medidas protecionistas contra Brasil, China e Índia.

O governo argentino vai tentar convencer o brasileiro de que o Mecanismo de Adaptação Competitiva (MAC), nesse momento, é fundamental para evitar que a Argentina sofra estragos mais profundos em sua economia e que o déficit comercial com o Brasil tenha um salto brutal dos atuais US$ 4 bilhões para uma cifra insustentável. Porém, antes de usar a MAC, que seria a colocação de cotas para aqueles produtos que estiverem provocando dano à indústria local, a Argentina vai pedir ao Brasil que tenha a iniciativa de limitar suas próprias vendas de produtos sensíveis, como têxteis, calçados, eletrodomésticos, metal mecânica, brinquedos e outros.

G-20

Os funcionários argentinos vão conversar com os brasileiros na reunião do G-20, em Washington, neste fim de semana. Os argentinos pediram para a próxima semana, uma reunião do Conselho Mercado Comum (CMC), do qual participam os ministros de Economia e chanceleres dos países do Mercosul (Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai, Venezuela, Chile e Bolívia) para coordenar ações conjuntas com o objetivo de enfrentar a crise financeira internacional. Neste encontro, o assunto seria aprofundando. Porém, segundo uma alta fonte da chancelaria argentina, o Brasil, como presidente pro-tempore do bloco regional, marcou a reunião, ¨a princípio¨, para o dia 27.

¨Nesses tempos, com a deterioração ocorrendo a uma velocidade tremenda, 27 de outubro é tempo demais, é muito tarde¨, reclamou a fonte. Nos últimos três dias, continuou a fonte, ¨vimos um aprofundamento da crise financeira de uma dimensão impensada que está definitivamente provocando um impacto na economia real¨. A fonte afirmou à AE que o governo de Cristina não pretende tomar nenhuma medida unilateral e, por isso, esse processo ¨vai requerer consultas e um diálogo muito fluido, tratando de que tudo seja harmônico¨.

Indagada se as medidas serão de consenso, a fonte insistiu na palavra ¨harmônico¨.

Comércio bilateral>

Na Argentina, a decisão não precisa passar pelo Congresso porque todas as medidas do Mercosul já estão avalizadas pela Constituição local. No Brasil, porém, a MAC só poderá ser acionada depois que for aprovada pelo Legislativo. No próximo dia 23 haverá uma reunião da comissão de monitoramento do comércio bilateral. A comissão que se reúne periodicamente tem a missão, entre outras, de detectar os setores que estão sendo ameaçados com a importação de um ou de outro país.

A Ásia, especialmente a China e a Índia, também estão na mira do governo, que pretende colocar todas as travas possíveis aos seus produtos. A questão é que qualquer barreira ao comércio não pode ser discriminatória, segundo as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). Isso significa que as barreiras contra a Ásia valeriam também para o Brasil e os demais países. Por isso, as medidas de proteção que a Argentina eventualmente adotar para se resguardar de uma ¨invasão chinesa¨, como dizem os empresários, terão que ser informadas e, dependendo do caso, discutidas com o Brasil, já que é seu principal sócio comercial. Caso contrário, isso poderia gerar ruído na relação entre os dois países, porque seriam medidas unilaterais.

  

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