Virgindade vista por gente experiente 09/05/2006
- O Estado de S. Paulo
Série de cinco programas da GNT reúne depoimentos de famílias inteiras sobre o assunto.
Na Grécia antiga, garotas que perdiam a virgindade eram vendidas como escravas por arruinar a honra familiar. Na Roma imperial, um pai podia matar a filha e o homem que a seduziu se ela perdesse a virgindade antes do casamento.
Até hoje, em alguns países árabes e africanos, mulheres são mutiladas ou apedrejadas por causa de um preconceito que, segundo antropólogos, vem desde a era neolítica, quando os homens começaram a domesticar animais e reprimir suas mulheres.
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Mas as coisas estão mudando, como mostra a série de cinco documentários Quando Éramos Virgens, que a GNT/Globosat exibe até sexta-feira, às 21:30 -- 20:30, no horário de MT.
Realizada pela cineasta Rosane Svartman (Como Ser Solteiro), 37 anos, virgem até os 18, e pela roteirista e escritora Juliana Lins, 34 anos, virgem até os 16, a série expôs suas idealizadoras a tremendas dificuldades.
Uma delas: manter uma garota virgem até a gravação de seu depoimento. Um dia antes do compromisso, ela telefonou para as entrevistadoras e confessou, constrangida, que não poderia mais participar do programa. Não resistiu ao assédio: foi para a cama com o namorado.
A série de cinco programas, com meia hora de duração cada, intercala registros documentais com dramatização e reality show. Homens e mulheres dão seus depoimentos sobre a primeira vez e excertos dessas lembranças são reconstituídos em ficção.
Como foram muitos os entrevistados, os cortes na edição dos programas levaram automaticamente à idéia de aproveitar o material num livro, que está sendo lançado com o mesmo título da série, Quando Éramos Virgens (Casa da Palavra, 176 págs., R$ 32,90).
O livro apresenta personagens que não estão nos programas. Traz ainda uma entrevista com a historiadora Mary del Priore, que traça um panorama histórico da virgindade no Brasil desde o século 18.
A cineasta Rosane Svartman explica que esse enfoque histórico ficou fora da série televisiva porque ¨a idéia não era criar uma teoria sobre a virgindade, mas saber como foi a primeira relação sexual dos entrevistados, sejam eles membros de uma mesma família, de uma religião ou que assumiram uma diferente orientação sexual¨.
No último caso estão quatro casais do segundo programa da série, Fora do Armário, que será apresentado hoje, homossexuais que tiveram, segundo ela, ¨alguma dificuldade de expor sua vida privada em público¨.
O programa inaugural, que vai ao ar ontem, Encontro Marcado, reuniu três casais que não se viam há anos após o primeiro contato amoroso.
¨É curioso que, depois de 10 ou 20 anos, eles tenham vagas lembranças do que aconteceu e visões diferentes dessa experiência¨, comenta Rosane.
Mais curioso ainda é o encontro familiar do terceiro programa, Gerações, que reúne avós, mães, pais e netos numa conversa franca sobre como perderam ou pretendem perder a virgindade, garantindo boas risadas entre eles.
O mais ousado é o quarto programa, Sexo na Vitrine, que vai atrás de atores de filme pornográficos para descobrir como foi a iniciação sexual desses atletas da cama.
As realizadoras acompanharam também os bastidores do primeiro ato sexual público de um casal jovem - ele, que sempre sonhou ser astro pornô, e ela, uma garota conduzida pela curiosidade à indústria pornográfica.
Por causa desse episódio, a dupla Rosane e Juliana quase perde a colaboração de uma virgem evangélica que participa do programa final, A Primeira Vez.
Daniele, que queria casar virgem, concordou, afinal, que cineasta e roteirista a acompanhassem desde o casamento até sua noite de núpcias. E ainda deu seu depoimento sobre o dia seguinte.
Se a virgindade, para os antigos, era uma virtude e estava associada a Artemis (Diana), deusa da lua e da caça que protegia crianças, hoje, segundo muitos depoimentos, ela incomoda.
Muitas mulheres ouvidas na série revelam ter decidido, por conta própria, perder a virgindade com medo da discriminação. É o caso de Fabi, que fez sexo pela primeira vez em 1987 e queria ¨resolver o problema¨ logo para não ser segregada pelas amigas experientes.
O tema virgindade voltou à ordem do dia com a surpreendente caça aos ginecologistas para uma himenoplastia e a publicação do livro Virgin: Un Untouched History, vendido pela editora Bloomsbury como a primeira história da virgindade, dos gregos até nossos dias.
Nele, a historiadora Hanne Blank fala dos diferentes papéis que a virgindade teve na história, desfaz mitos ao mostrar que muitas mulheres nascem sem hímen e aborda temas polêmicos como os comentários dos doutores da igreja sobre o assunto.
A realizadora da série diz que evitou justamente essa abordagem acadêmica para atingir um público amplo. Muitos garotos partem para a primeira experiência sexual sem nenhuma orientação e sem camisinha no bolso, o que explica a profusão de mães solteiras e menores num país como o Brasil.
¨Nossa curiosidade era apenas saber se, ao longo dos anos, essa experiência tem alguma coisa em comum com a de seus antepassados¨ , diz Rosane.