Estátuas do Cristo e de Nossa Senhora são feitas na China 04/02/2011
- Verena Fornetti - Folha de S.Paulo
Grande parte das estátuas do Cristo Redentor e de Nossa Senhora Aparecida, no Brasil, são da China. Bolsas de palha, colheres de madeira e cestas de vime parecidas com as do artesanato indígena e tapetes "persa" vêm do país. E, em Veneza, metade do vidro vendido como Made in Murano é feito por mãos chinesas, fora da Itália.
A China avança nas cópias de produtos típicos, e os clones vão do artesanato, caso do vidro veneziano e do tapete do Irã, aos materiais sintéticos, cuja semelhança com os originais engana os leigos.
Bordado chinês afeta indústria nacional
O preço é o principal atrativo. José Ribamar Ramos, que vende objetos de palha no atacado em São Paulo, diz que as bolsas chinesas custam até metade do preço. "O cara que compra para revender nem quer saber se a mercadoria é chinesa ou não."
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Na loja Minas Presentes, na rua 25 de Março -região de comércio popular em São Paulo-, estátuas de santos feitas na China ocupam prateleiras do chão ao teto. "Só os vendedores são brasileiros. O resto é tudo chinês", graceja a vendedora.
Em Aparecida (SP), que recebe devotos de Nossa Senhora Aparecida, as imagens chinesas também ganharam espaço.
O vendedor Wilson Bueno de Gouvea, dono da loja Todos os Santos, diz que a indústria chinesa é inovadora. "Eles inventam porta-caneta, fonte de Nossa Senhora... Às vezes, eles lançam primeiro e depois a gente é que copia."
CHINA EM VENEZA
Na Europa, com a crise, a dificuldade de competir com o produto chinês é ainda maior. O artesão italiano Paolo Birello, da Ama (Associação dos Mestres Artesãos), de Veneza, diz que a recessão impôs um padrão de preços muito difícil de igualar.
Enquanto um brinco de vidro italiano custa cerca de 25 (R$ 57), o chinês é comercializado por 6 (R$ 14).
O artesão italiano destaca que os produtos chineses estão cada vez mais perfeitos. Mas ele critica a prática de vender o produto asiático como se fosse o italiano.
"A Itália é um país livre, cada um vende o que quer. Mas que digam o que estão vendendo, que aquilo é feito por um artesão chinês, e não um artesão veneziano."
O mesmo problema é enfrentado pelo artesão Janio Vargas, do Rio de Janeiro, que vende objetos feitos com pedras brasileiras. Enquanto seus anéis saem por cerca de R$ 20 na feira hippie de Ipanema, peças com cópias de pedras "brasileiras" feitas na China são vendidas por R$ 7.
"De 100 pessoas, 99 são leigas. Eu é que tenho de convencê-las de que meu produto é de boa qualidade, feito à mão, e que o outro vem de uma fôrma de onde saem milhões de peças iguais."
Também na feira de Ipanema, famosa por itens de couro, há vendedores que trabalham com isqueiro a tiracolo, diz o artesão Ivan Jilek. Ele afirma que o sintético é difícil de ser identificado a olho nu, mas não resiste ao fogo.
ACABAMENTO
Em alguns casos, o produto chinês pode ter acabamento mais perfeito que o original. Najad Khouri, dono da Isfahan Tapetes e Kilims, no Rio, destaca que o tapete chinês que clona o persa não tem imperfeições na trama.
"O tapete chinês é tão perfeito que parece feito por uma máquina. E o tapete persa não pode ser perfeito. No islamismo, só Alá é perfeito."
Khouri destaca que os tapetes chineses são padronizados -algumas estampas são escolhidas e o artesão as reproduz em série. "O chinês fabrica mais rápido e o preço cai. E o artesão persa é mais indisciplinado que o chinês. Ele cria enquanto trabalha."