Treinador vê Andrés como escudo para Seleção Brasileira 31/03/2012
- Leandro Canônico - globoesporte.com
Sai Ricardo Teixeira, entra José Maria Marin no comando da CBF. Logo em seguida, Andrés Sanches coloca o cargo à disposição. Mas continua, assim como o técnico Mano Menezes, à frente da Seleção Brasileira. Apesar das mudanças políticas na entidade, o treinador do time canarinho acredita na continuidade do trabalho.
É verdade que pelo futebol pouco empolgante da Seleção e pelo fato de ter sido contratado por Ricardo Teixeira, muitos imaginaram que Mano poderia estar na berlinda nessa nova fase. Ele, no entanto, não se sente assim. Sabe que precisa melhorar o rendimento do time, mas confia nas palavras do novo presidente.
- O Marin deixou bem claro a intenção de continuar aquilo que o Ricardo começou como planejamento para a Copa do Mundo. Estou falando em termos de Seleção. Fiz algumas colocações, daquilo que entendo e acredito, sobre respeito e lealdade mútuos. E vou repetir: nunca pedi a um dirigente para ter estabilidade - falou o treinador.
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A relação de Mano Menezes com Andrés Sanches, agora diretor de seleções da CBF, sempre foi próxima. Desde os tempos de Corinthians. Não por estabilidade, mas pelo bem da Seleção Brasileira, o treinador acredita que o principal papel do cartola é ser uma espécie de escudo para jogadores e comissão técnica.
- O vejo com uma responsabilidade muito grande de dar proteção à Seleção Brasileira, principalmente em um momento político como esse. O papel dele também é passar confiança aos jogadores e à comissão técnica. Dar tranquilidade para conduzirmos o trabalho - disse Mano Menezes.
Neste bate-papo, realizado nas dependências da TV Globo, em São Paulo, Mano Menezes também falou sobre a polêmica presença de Ronaldinho Gaúcho na pré-lista para as Olimpíadas, comenta sobre a ascensão de Neymar no futebol e fala que Messi tem capacidade para superar Maradona. Se vencer uma Copa do Mundo... Ele só não quis falar sobre ter sido parado por uma blitz da Lei Seca, no Rio de Janeiro, durante a semana. Confira a íntegra da entrevista abaixo:
Como você vê a troca no comando da CBF? O que muda para você com José Maria Marin no cargo?
- Nós tivemos uma conversa. Ele (Marin) deixou bem claro a intenção de continuar aquilo que o Ricardo (Teixeira) começou como planejamento para a Copa do Mundo. Estou falando em termos de Seleção Brasileira. Fiz algumas colocações, daquilo que entendo e acredito, sobre respeito e lealdade mútuos. E vou repetir: nunca pedi a um dirigente para ter estabilidade no cargo, porque técnico não tem estabilidade mesmo. Em um momento especial, de Copa do Mundo no Brasil, a dois anos dela, nós temos uma responsabilidade grande com a Seleção Brasileira, que é o bem maior do torcedor. Precisamos cuidar dela.
Mas muda muita coisa sem o Ricardo Teixeira?
- Precisamos tomar cuidado até com as propostas de mudança (no comando do futebol brasileiro). Eu não acredito muito em campanha. Aliás, eu tenho uma preocupação grande com campanha, porque assim você gera radicalismo, seja para um lado ou para o outro. Acredito nas coisas sendo mudadas de forma constante, porque aí você tem uma evolução verdadeira do que você realmente quer mudar, do que é o anseio das entidades que envolvem o futebol. Penso que esse é o caminho da Seleção Brasileira também. Exatamente para não ser apontado ali na frente como responsável direto por uma frustração ao povo brasileiro. Já vivemos uma frustração muito grande em termos de resultado na primeira Copa que realizamos aqui. E temos de ser muito responsáveis nessa hora com o que propomos como alteração.
Você e o Andrés Sanches, agora diretor de seleções da CBF, trabalharam juntos no Corinthians e ele chegou a lhe bancar após uma eliminação de Libertadores. A relação antiga com ele o ajuda agora na Seleção?
- Tudo tem dois lados. Externamente as pessoas pensam que a chegada do Andrés me dá uma condição que eu não teria como profissional da Seleção em termos de estabilidade. Não é isso! O que me manteve no Corinthians não foi a amizade com o Andrés, foi o trabalho que executamos. Se naquela eliminação da Libertadores (2010) ele não mudou foi porque ele olhou para o trabalho, viu que era consistente e capaz de continuar mesmo em um momento conturbado como aquele. E o desempenho depois, no Brasileiro, comprovou isso. Isso é mais importante ressaltar.
A Seleção Brasileira passou muitos anos sem um diretor de seleções. Qual você acha que é o principal papel do Andrés?
- O vejo com uma responsabilidade muito grande de dar proteção à Seleção Brasileira, principalmente em um momento político como esse. O papel dele também é passar confiança aos jogadores e à comissão técnica. Dar tranquilidade para conduzirmos o trabalho. O jogador não pode sentir incertezas internas. De forma desconfiada não rende bem. Nesses momentos, o atleta é capaz de entender que seus direitos individuais valem mais que o coletivo. E temos de pensar o contrário nesse momento. Temos de ter uma unidade muito forte, porque as dificuldades serão grandes.
Falando em jogador, o fato de o Ronaldinho Gaúcho ter aparecido na pré-lista de 52 nomes para as Olimpíadas gerou algumas críticas ao seu trabalho. Você fica incomodado com isso? Como lida com essa pressão?
- Periodicamente, a crítica se volta para um nome. Geralmente as soluções, quando você não está satisfeito, estão fora do grupo. Quem não é escalado sempre é a possibilidade melhor quando você perde. Quando não está tão bom, aquele que está convocado não é o nome que deveria estar. E eu tenho certeza que se eu tivesse convocado um dos nomes mais pedidos (N. do R: Mano se refere a jogadores como Kaká e Robinho), ele estaria sendo questionado como o Ronaldinho, que está dentro. Eu fui coerente com aquilo que fizemos até aqui para fazer a lista de 52. E acho que as pessoas não devem levar essa lista em consideração para tecer críticas a A ou B para formação que vamos levar para as Olimpíadas. Ainda teremos uma lista de 35, que vai contemplar mais jogadores acima de 23, porque é necessário. E quando fizermos a lista de 18 mais quatro, aí acho que todos têm o direito de gostar ou não gostar, porque esses serão os que vamos levar para Londres.
Além da coerência que você diz, é possível considerar que o Ronaldinho serve também como exemplo para os jogadores mais jovens?
- Existem exemplos de fora de campo como postura e comportamento. E existem exemplos técnicos. Eu acho que o Ronaldinho pode ser considerado importante para a Seleção Brasileira com seus exemplos técnicos. É isso que estou utilizando até esse momento e vou utilizar até quanto entender que temos um ganho. Às vezes você usa determinadas palavras no futebol brasileiro e ninguém te escuta. E as mais importantes ninguém dá bola, ninguém repete. Um dia eu usei projeto e as pessoas ficaram batendo nessa tecla. Projeto não é uma coisa engessada. Projeto pode ser planejamento, de vez em quando pode ser estratégia. É isso que estamos fazendo. Quando considerarmos que devemos mudar isso, certamente vamos modificar. Não temos compromisso com A ou B. Isso precisa ficar claro para o torcedor brasileiro. Porque, do contrário, vamos voltar àquelas discussões de que tal jogador é chamado porque tem de jogar tal amistoso. Não existe isso! O que existe é um contrato feito para que a Seleção Brasileira principal se apresente. Então não podemos levar um time olímpico para determinado jogo, porque há uma exigência de que seja a equipe principal.
A Seleção Olímpica que você pretende levar para Londres deve ser a que mais se aproxima da principal em relação aos últimos anos?
- Se conseguirmos levar para Londres todos os jogadores que estamos querendo, a Seleção Brasileira que vai disputar os Jogos Olímpicos talvez seja a que mais se aproxime da que vai para Copa do Mundo de 2014.
Por falar nisso, como você, sua comissão técnica e a CBF estão lidando com a tão polêmica liberação dos clubes europeus para a competição?
- O primeiro caminho é conversar com os jogadores. Você precisa ter claro se eles querem ou não jogar as Olimpíadas. Esse foi o primeiro passo com todos eles. Diria que é a parte que mais me agradou, porque senti um desejo muito grande de todos eles. Isso mostra que eles entenderam o que planejamos e que as Olimpíadas são importantes para 2014. Depois, tem de conversar com os técnicos dos clubes. Fizemos isso com a maioria já. E depois com um dirigente executivo. São esses os três passos. Agora é preciso esperar um pouco mais para os últimos momentos, porque isso não é acordo tratado no papel, é um acordo verbal. Às vezes muda o técnico nesse período, às vezes muda o diretor e pode ter uma alteração de conduta. Esperamos que isso não ocorra, para podermos tomar nossas decisões.
Você comentou recentemente que o futebol está melindrado demais. Por que acha que chegou a esse ponto? Falta mais discussão?
- Sem dúvida nenhuma falta discussão. Exatamente porque fomos nos fechando em torno de um cuidado necessário para não se expor. Se não quero me expor, não dou a opinião que realmente acho, que penso, porque isso pode melindrar A ou B e não quero ter toda hora uma indisposição com alguém. A pessoa do outro lado faz a mesma coisa e acabamos não discutindo coisas importantes para o crescimento do nosso futebol. Precisamos encontrar locais adequados para fazer isso, nos despir da nossa vaidade pessoal, porque isso é um entrave. Não temos de ser melhor do que o colega, o jogador não tem de ser melhor que o outro jogador. Tem de ser melhor do que ele mesmo. A Seleção me mostrou muito a necessidade de fazer isso. Você tem de aprender, estudar com os novos problemas, a nova realidade.
A polêmica recente foi sobre o que seria melhor para o Neymar: ir para Europa ou seguir no Brasil. Aproveitando, você considera que hoje, independentemente de onde jogue, ele é o melhor brasileiro em atividade no mundo?
- Sem dúvida nenhuma, ele é a referência mais indiscutível que se tem em termos de jogadores brasileiros. E é bom deixar claro que acho que ele vai continuar crescendo no futebol brasileiro. Não tenho dúvida disso. Podemos discutir a velocidade e a intensidade que isso está acontecendo, dependendo da opinião de cada um. Mas ele continua nos últimos anos aproveitando as oportunidades, isso é importante ressaltar, porque ele está sendo maduro para isso. Penso que seja muito difícil para um jogador de 20 anos passar por isso que ele está passando. E ele tem continuado dentro do campo demonstrando a vontade de jogar futebol. Isso é altamente positivo.
Outro jogador que tem encantado o mundo é o Messi. Você acredita que, se mantiver o ritmo, ele tem condições de alcançar Pelé e Maradona?
- De Pelé, não. Mas de Maradona, talvez. Talvez não tenhamos um jogador como o Pelé, tão completo e tão vitorioso em tudo aquilo que disputou, embora o Messi em termos de vitórias e de resultados tem se tornado, muito cedo um destaque, uma referência mundial. Acho que ele é um exemplo a ser seguido, porque realmente o seu comportamento também é elogiável. Mas penso que tem muito ainda a conquistar por tudo aquilo que está mostrando. Vamos tê-lo como adversário logo à frente, contra a seleção da Argentina. Mas até lá vamos aproveitar e usufruir daquilo que ele tem oferecido com seu belíssimo futebol no Barcelona.
De que maneira ele pode superar o Maradona?
- Eu acho que existem algumas coisas importantes para superar um jogador como o Maradona. Conquistar uma Copa do Mundo, por exemplo. Já tivemos grandes atletas no Brasil que ganharam muito em termos de conquistas fora da seleção, mas nós brasileiros achamos importante passar por isso. Então acho que para ele também é importante passar.
Essa cultura brasileira de que um jogador precisa ser campeão do mundo para chegar a determinado patamar não é injusta? Pensando assim, nunca um jogador de um país emergente no futebol pode ser Pelé ou Maradona.
- Acho que é um pouco injusto, mas ainda é a nossa valorização. Eu acho que, às vezes, por não fazer parte de um país onde seja maior o número de bons jogadores e o futebol não seja tão desenvolvido, você perde a chance de ganhar um Mundial. Mas não é o caso da Argentina, que é composta por grandes jogadores. Então no caso do Messi essa cobrança é proporcional.