A resistência da pecuária 09/04/2007
- O Estado de S.Paulo
Tolhida pelas restrições sanitárias impostas por diversos parceiros comerciais do Brasil e espremida internamente pela expansão da área dedicada a culturas financeiramente mais atraentes para o produtor rural, a pecuária brasileira resiste - e muito bem. Em 2006, mesmo com as vendas prejudicadas pela identificação de focos de febre aftosa em Mato Grosso do Sul (e pelo temor causado pela gripe aviária, no caso das aves), as exportações brasileiras de carne aumentaram 5,5% em relação a 2005. Embora a área de pastagem venha encolhendo há anos, o rebanho cresce.
A vitalidade da cultura canavieira, estimulada pelas perspectivas de rápida expansão do consumo mundial de etanol - que fizeram subir os preços internacionais do açúcar e do álcool -, vem reduzindo as áreas destinadas à pecuária e às culturas de café, soja, milho e laranja em diversos Estados. No Centro-Sul, o fenômeno é mais intenso em São Paulo, Paraná e Triângulo Mineiro; no Norte e Nordeste, nos Estados de Pernambuco, Alagoas e Paraíba.
Instituições privadas estimam em 6,5 milhões de hectares, entre 2001 e 2004, a área que a pecuária cedeu para a produção de cana-de-açúcar e de grãos, cujos preços foram mais remuneradores para o produtor. Entre 2005 e 2006, a área dedicada à pecuária se manteve estável, mas a projeção para 2007 é de nova redução. Pesquisadores da Embrapa calculam que, mantida a tendência atual, em quatro ou cinco anos as áreas de pastagem terão encolhido mais 20 milhões de hectares, e a maior parte dessas terras terá sido ocupada pela cana-de-açúcar.
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Mesmo assim, o rebanho cresce. Dados do IBGE mostram que, entre 2004 e 2005, o aumento foi de 1,3%. É um aumento inferior à média do crescimento dos últimos cinco anos estimado por alguns economistas especializados no agronegócio, para os quais o aumento acumulado nesse período foi de quase 19%.
Produtores experientes não se iludem com a estabilização ou eventual aumento de área de pastagem, como pode ter ocorrido em 2006. São situações passageiras, decorrentes de dificuldades para a agricultura, não de recuperação da pecuária.
O lucro e a taxa de retorno propiciados pela cana-de-açúcar desestimulam o crescimento da pecuária. Mas os pecuaristas não desistem. Para alguns, de regiões mais adequadas à produção agrícola, a diversificação tem sido uma saída para a preservação da atividade principal - a pecuária -, sem grande perda de lucratividade. Para outros, os investimentos que levam a ganhos de produtividade são o caminho mais adequado.
Investimentos em desenvolvimento genético, que resultam em gado de melhor preço e em produção de animais mais precoces, compensam perdas resultantes da redução da área de pastagem. Animais de melhor preço ou que podem ser oferecidos para abate aos dois anos melhoram a rentabilidade do pecuarista e o estimulam a manter-se na atividade.
Também o melhoramento das pastagens e maior cuidado com a sanidade do rebanho ajudam a melhorar a produtividade da pecuária e a assegurar a rentabilidade do negócio. O problema é quando os ganhos de produtividade, a preservação dos atrativos da pecuária e a expansão das vendas internas e externas passam a depender de ações do governo. Aí a coisa empaca, quando não anda para trás.
O surgimento do foco de febre aftosa em Mato Grosso do Sul mostrou como era ineficaz o sistema de defesa sanitária do governo federal. Deficiência de pessoal, seguidos cortes nos recursos orçamentários e falta de planejamento na liberação das escassas verbas disponíveis mostraram o desleixo com que as autoridades federais tratavam um segmento da economia responsável por resultados tão expressivos no comércio exterior brasileiro.
Depois das desastrosas ocorrências em sua área, e não necessariamente por sua culpa, a Secretaria de Defesa Sanitária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento fala em erradicar a febre aftosa no continente até 2010 e diz ter verba para isso. Se pelo menos conseguir realizar melhor seu trabalho, ajudará muito a pecuária e o País.