Ex-gerente diz ao MP que alertou sobre desvios na Petrobras 20/12/2014
- Laryssa Borges - Veja.com
A ex-gerente da Diretoria de Refino e Abastecimento da Petrobras, Venina Velosa da Fonseca prestou depoimento na manhã de ontem por cinco horas seguidas ao Ministério Público, em Curitiba, e confirmou que os altos diretores da companhia, incluindo a presidente da Petrobras Graça Foster foram avisados previamente por ela e sabiam pelo menos desde 2009 de irregularidades e desvios de recursos na estatal.
Venina prestou esclarecimentos na condição de testemunha de acusação e sob juramento e apresentou às autoridades notas fiscais, cópias de e-mails, atas de auditoria, relatórios internos da petroleira e deixou com o Ministério Público até seu próprio computador pessoal, com detalhes de como foram celebrados contratos na companhia.
A ex-funcionária vai ser ouvida pelo juiz Sergio Moro, responsável pela Lava Jato na Primeira Instância, em fevereiro.
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De acordo com reportagem publicada pelo jornal Valor Econômico, Venina começou a suspeitar que havia problemas quando percebeu que os gastos com pequenos contratos de prestação de serviços avançaram de 39 milhões para 133 milhões de reais em 2008, sem razão aparente.
Em sua apuração interna, a gerente detectou que a estatal estava pagando por serviços de comunicação que sequer estavam sendo prestados.
Sua primeira atitude foi informar Paulo Roberto Costa, seu superior direto, e pedir mais rigor na fiscalização dos contratos.
Costa, relata Venina, apontou para o retrato de Lula em sua sala e perguntou "Você quer derrubar todo mundo?".
A gerente então encaminhou as denúncias ao presidente Gabrielli que, após auditoria interna, acabou demitindo o diretor de Comunicação, Geovanne de Morais.
"Venina confirmou que a cúpula da Petrobras sabia das irregularidades. O depoimento foi no sentido de que ela já havia denunciado os problemas há tempos aos chefes, aos diretores e ao conselho", disse ao site de VEJA o advogado Ubiratan Mattos, que defende a ex-gerente.
De acordo com Mattos, todos os documentos apresentados por Venina serão agora periciados e a presidente Graça Foster, que contesta a versão da ex-funcionária, deverá ser confrontada com dados que confirmam que toda a cúpula tinha conhecimento de que as irregularidades ocorriam há anos.
Conforme o jornal Valor, a diretoria atual da Petrobras não impediu um esquema de desvio de milhões de reais no exterior, causado pelo pagamento de comissões extras a negociadores de óleo combustível, ostraders.
A informação tem como base documentos internos e mensagens encaminhadas por Venina.
Segundo a publicação, os negociadores da Petrobras vendiam petróleo a um valor mais baixo, recebendo, por fora, comissões dos compradores -- o que prejudicava os resultados da empresa.
Os traders beneficiados atuavam em Cingapura, onde Venina trabalhou, e também em outros escritórios da petroleira no exterior.
Apesar das denúncias, esses negociadores não foram descredenciados pela estatal, mas receberam suspensões temporárias e voltaram a trabalhar.
Já Venina teve seu salário cortado em aproximadamente 40% e foi afastada do cargo.
Proteção policial
Desde que revelou que altos funcionáriso da petroleira sabiam do esquema de fraudes na empresa, Venina tem sido ameaçada, mas por ora não cogita aceitar proteção policial.
O próprio Ministério Público colocou o benefício à disposição da testemunha. Para a defesa da ex-funcionária, há uma "evidente campanha de desconstrução da imagem" dela.
"Ela era um arquivo vivo, mas a orientei a abrir tudo, toda a história e entregar o computador para o Ministério Público. Com isso mais pessoas passam a ter conhecimento da história e ela deixa de ser esse arquivo", explicou Ubiratan Mattos.
Ontem, os advogados de Venina entraram na Justiça do Trabalho contra a Petrobras por assédio moral e anexaram pedido para que sejam incorporadas à sua remuneração verbas em comissão que recebia da empresa.
Comissão de Ética
Além de poder abrir novos rumos para a investigação do escândalo do petrolão, as revelações de Venina devem comprometer diretamente a presidente da Petrobras Graça Foster, até o momento blindada pelo governo federal.
É que o presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República, Américo Lacombe, aguardava o depoimento da ex-gerente para discutir se recomenda ou não punição ou até a demissão de Foster.