Nova central mira setor público e disputa espaço com a CUT 02/08/2015
- CLAUDIA ROLLI - FOLHA DE S.PAULO
Uma central sindical que pretende representar exclusivamente os servidores será criada nos próximos dias.
Cerca de 300 entidades de funcionários públicos federais, estaduais e municipais devem se associar à Pública, a 13ª central sindical do país.
O Brasil tem ao redor de 12,5 milhões de servidores (ativa e aposentados), 60% estão ligados aos 5.500 municípios do país.
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São representados por sindicatos independentes ou filiados às centrais tradicionais, como a CUT (Central Única dos Trabalhadores).
Já existem hoje 12 centrais no cadastro das entidades sindicais do Ministério do Trabalho, número recorde se comparado ao movimento sindical de outros países.
Somente metade é reconhecida pelo governo federal e tem acesso ao imposto sindical -- cobrado de forma compulsória de todos os trabalhadores com carteira assinada no país (filiados ou não a sindicatos).
Para abrir uma central, é preciso criar uma associação sem fins lucrativos e registrá-la em cartório.
Com diretoria, CNPJ, ata de fundação e endereço, ela pode ser cadastrada no governo.
Mas só receberá parte dos R$ 2,3 bilhões arrecadados com o imposto sindical, no período de janeiro a junho deste ano, se cumprir critérios como ter uma cota de cem sindicatos em cada região do país, ter sindicatos filiados em cinco setores da economia e ao menos 7% de sindicalizados dos empregados representados.
"Não estamos preocupados com a arrecadação sindical", afirma Nilton da Paixão Júnior, que comanda o Sindilegis, sindicato de servidores do Legislativo federal e do Tribunal de Contas da União.
Ele deixa o cargo de um dos vice-presidentes da Força Sindical para assumir a Pública no dia 10 de agosto, em Brasília.
"Há um descontentamento do servidor público com o sindicalismo atual, que tem foco no setor privado e está partidarizado", diz Paixão Júnior.
Entidades que reúnem funcionários de Câmaras Municipais, prefeituras, Assembleias Legislativas estaduais, Tribunais de Contas, do Legislativo e do Judiciário estimam que, em dois anos, cerca de 30% dos sindicatos ligados a CUT, Força, UGT (União Geral dos Trabalhadores), CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil) e Conlutas migrem para a Pública.
PAUTA
Proibir a terceirização nas atividades essenciais do funcionalismo público, valorizar a carreira do servidor, investir na qualificação desses profissionais, reduzir cargos comissionados e indicações políticas e criar aferição para produtividade no setor são itens que constam na pauta da Pública.
A nova central também quer a implementação de uma data-base para a categoria, instituir em lei a negociação coletiva e garantir outras condições de trabalho previstas na convenção 151 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) para a função pública.
Amauri Perusso, presidente da Fenastc, entidade que representa 70 mil funcionários dos 34 Tribunais de Conta do país, diz que, houve um duro "ataque" à carreira dos servidores e que, agora com a crise, o custo da máquina pública é apontado como se fosse a razão dos problemas na economia.
"De cada R$ 100 gastos, segundo a previsão orçamentária federal, o gasto de pessoal não chega nem a 10%."
"Uma central que nasce com esse discurso, de revalorizar a carreira do servidor, que foi destruída desde o governo Collor, e que se descola da partidarização criará problemas para a CUT, que é a central mais forte e presente no funcionalismo", afirma o cientista político Rudá Ricci.
"Existe uma estrutura de Estado que precisa ser mantida no país, independentemente do governo que ocupa o comando. Não temos a menor intenção de adotar uma postura política, e sim defender os servidores que mantém essa estrutura funcionando", diz Antonio Carlos Fernandes Lima Jr, presidente da Fenalegis, federação que representa 250 mil servidores das 5.569 câmaras municipais do país.
A Pública prepara um manual de conduta para os futuros associados, em que defende a prestação de contas de forma pública e transparente, a adoção de critérios da ficha limpa para eleger diretorias e a criação de uma ouvidoria na central.
CONCORRÊNCIA
Força, UGT e CTB informaram que não são contrárias à criação de mais uma central.
"Mas, com a fragmentação, o trabalhador é prejudicado", afirma Ricardo Patah, presidente da UGT.
Cerca de 150 sindicatos entre as 1.125 entidades que estão filiadas à UGT atuam no setor público.
Wagner Gomes, secretário-geral da CTB, que fundou a central em 2006, após deixar a CUT, crê que a tendência é a central angariar cutistas.
"Desde 2013, a CUT perde espaço no funcionalismo. A vinculação ao governo, em tempos de mensalão e petrolão, a prejudica."
Na Força, Miguel Torres acredita que a nova central vá atuar com uma confederação. "Se não está presente em cinco setores da economia, não preenche essa exigência do MTE, nem reconhecida será."
O secretário de Relações do Trabalho do MTE, Manoel Messias, diz que, ao criar a lei que reconheceu as centrais, em 2008, o governo esperava que houvesse uma fusão das centrais já existentes.
"Não foi isso que se configurou."
A CUT, que representa as categorias do funcionalismo nas áreas de saúde, educação e segurança, foi procurada pela reportagem, mas não se pronunciou.