A um mês de referendo sobre reeleição de Evo, direita ganha força na Bolívia 19/01/2016
- SYLVIA COLOMBO - FOLHA DE S.PAULO
Em um mês, os bolivianos irão às urnas para decidir se o presidente Evo Morales, 56, — no poder desde 2006 — poderá concorrer ao quarto mandato seguido. Pela primeira vez em uma década, porém, Evo não tem no horizonte perspectiva de vitória clara.
Habituado a vencer pleitos com ampla vantagem (teve 65% dos votos em 2009, por exemplo) e com a popularidade mais alta entre os líderes da América Latina (65%), Evo estava seguro de obter um "sim" fácil no referendo de 21 de fevereiro sobre a mudança constitucional necessária para que ele concorra.
As pesquisas recentes, porém, apontam diferença muito apertada entre "sim" e "não".
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Nas que privilegiam áreas urbanas, como a da ATB (do dia 14), o "não" vence por oito pontos. Nas mais nacionais, como a da Mori do dia 12, com maior peso da população rural, o "sim" ganha, mas por apenas quatro pontos.
"O fato de o cenário estar incerto é a grande novidade dessa votação", diz à Folha o analista político Fernando Molina.
"É uma tendência que teve início em 2015, na eleição regional, quando o governo perdeu centros importantes."
Apesar disso, naquela eleição o MAS (Movimento ao Socialismo, partido de Evo) manteve o poder em cerca de 80% dos municípios.
Especialistas concordam que o cenário regional, com vitórias da direita na Argentina (com Mauricio Macri na Presidência) e na Venezuela (Parlamento), favorece a alta da oposição nas pesquisas.
"Os adeptos do 'não' usam esse aparente giro à direita da região a seu favor. Também se fala do Brasil como exemplo de um governo de esquerda que está há muito tempo no poder e não está sendo eficiente em lidar com a crise econômica", afirma Molina.
"A oposição ganhou fôlego nas regionais e agora está se animando com as vitórias direitistas na América Latina", diz o jornalista e analista político Raúl Peñaranda.
Para os analistas, a aproximação de Evo do empresariado da região de Santa Cruz de La Sierra vem desgastando a relação do presidente com sua base mais fiel, os indígenas da área rural boliviana.
Isso provocou o surgimento de uma oposição à esquerda de Morales, com a criação de partidos como Solidaridad y Libertad, que tendem a desinflar o MAS. Outros líderes indígenas, como o deputado aimará Rafael Quispe, elevam o tom da crítica ao governo.
"O discurso de Evo não é mais o da defesa da soberania indígena, mas o da inclusão das burguesias –mais desenvolvimentista, que se apoia nos avanços dos últimos anos. Isso causa insatisfação em setores de sua base histórica", explica Molina.
Curiosamente, o apoio regional vem se invertendo. Em Santa Cruz de La Sierra, que já chegou a propor a separação do resto do país, pesquisas dão vantagem ao "sim". Já na periferia de La Paz e em zonas do altiplano, redutos de Evo, o "não" ganha força.
ECONOMIA
É na área econômica que estão os principais trunfos com os quais Evo pretende defender a continuidade de seu mandato até 2025 — se o "sim" vencer o referendo, o presidente poderá concorrer de novo na eleição de 2019.
"A Bolívia cresce num cenário regional complicado, em que Argentina e Brasil, os principais parceiros comerciais, estão em dificuldades. A mensagem, que antes era a da mudança, agora é a de manter a estabilidade e o crescimento", diz Peñaranda.
De 2004 a 2014, o país cresceu em média 4,9%. Para 2016, mesmo com o fim do ciclo das commodities, o FMI prevê que a Bolívia cresça 3,5%. A gestão Evo também celebra a queda acentuada do desemprego e da pobreza.
O surgimento de pesquisas não tão favoráveis, porém, já resultou em declarações inflamadas. O vice-presidente Álvaro García Linera disse ver "risco de confrontação". Evo, por sua vez, afirmou que ganhará com 70% dos votos e que a campanha do "não" é patrocinada pelos EUA.