Quantos gays a Rio-2016 terá? 20/02/2016
- Mariliz Pereira Jorge*
Em 2014, a ONU fez um apelo para que jogadores homossexuais assumissem sua orientação sexual durante a Copa do Mundo, com o intuito óbvio de promover a aceitação da diversidade sexual no esporte.
Não preciso lembrar que não havia um único jogador declaradamente gay. Não porque não haja gays jogando futebol, mas porque é mais fácil o Brasil voltar a ganhar uma Copa do Mundo do que um atleta sair do armário.
Na Olimpíada pode ser diferente. Em Atenas, eram 11 participantes LGBT. Pequim registrou dez, e Londres teve recorde, com 23. É pouco no universo de 10.500 atletas que vêm ao Rio. Por isso, a importância de dois acontecimentos, que envolvem duas das maiores empresas de material esportivo do mundo.
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Na quinta (dia 18), a Nike rompeu o contrato com o boxeador filipino Manny Pacquiao, após ele ter dito que homossexuais são "piores do que animais" ao ser questionado sobre casamento entre pessoas do mesmo sexo.
A resposta da Nike foi tão rápida e reforça o posicionamento da marca que, desde 2011, patrocina o LGBT Sports Coalition, uma iniciativa para diminuir a discriminação no mundo esportivo.
Uma semana antes, foi a vez da Adidas anunciar que vai incluir uma cláusula de contrato em que garante o não rompimento de acordos de trabalho com seus atletas que se assumirem gays, bissexuais ou trans.
Dois dias depois, em pleno Valentine's Day, o Dia dos Namorados gringo, a marca postou uma foto em suas redes sociais onde aparecem as pernas de duas pessoas, numa posição que remete a um beijo.
Claramente, as pernas na imagem são de duas mulheres. A legenda não deixa dúvida: "O amor que você recebe é igual ao amor que você dá." Teve chilique, mas a marca, sabiamente, nem se abalou.
A Nike já havia, em 2013, dado mais um passo para fora do armário quando lançou a linha #BeTrue, um recado claro para seus atletas e consumidores. No ano passado, foi a vez da Adidas lançar uma edição limitada de seus produtos icônicos, inspirada na bandeira do arco-íris, batizada de Pride Pack.
As ações desses gigantes são, talvez, mais importantes do que um atleta assumir sua orientação sexual. Sair ou não do armário é uma decisão pessoal e ninguém deve ser obrigado. Mas é importante que saibam que estarão amparados em suas escolhas.
Atletas de elite vivem uma pressão enorme para melhorar suas performances. Manter a sexualidade na clandestinidade é, para muitos, um peso difícil de suportar. Há dois anos, o nadador Ian Thorpe, nove medalhas em duas Olimpíadas, contou em sua biografia que sofreu muito em todos os anos que passou negando ser gay. Entrou em depressão, tentou o suicídio e encerrou a carreira aos 24 anos.
Muitos atletas devem viver o mesmo terror. O medo de perder patrocínios, a exposição e também a eventual pressão que sofrerão para levantar uma bandeira –ninguém deveria ser obrigado a advogar por uma causa, por mais nobre que ela seja.
Ter o suporte de seu patrocinador é essencial para que essa transição seja feita da forma menos traumática. Com essa retaguarda, posso apostar que a Rio-2016 baterá o recorde de Londres e mais atletas se libertarão do pesado fardo de ter que esconder parte da biografia.
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*É jornalista e roteirista. Apresenta o programa "Sem Mimimi com Mariliz", no YouTube.