Só se fala em outra coisa 19/03/2016
- Mariliz Pereira Jorge*
Cinco meses para o maior evento esportivo do mundo, a Olimpíada saiu da pauta. Só se fala em outra coisa. O caos político no qual o país mergulhou vem produzindo tantos episódios, que nem bem uma crise fica morna vem outra para reavivar o fogaréu.
E o brasileiro reedita de uma forma ainda pior o mesmo climão anti-Copa que reinou antes do Mundial em 2014. A Olimpíada caiu no esquecimento. Ninguém fala, ninguém viu, ninguém se interessa.
O eco disso fora do país já é perceptível. Quem gostaria de visitar um país, que vive uma epidemia de zika (que também anda esquecida por aqui) e onde os ânimos borbulham por causa de uma crise política que só cresce?
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Coincidência ou não, apenas 50% dos ingressos foram vendidos. No caso da Paraolimpíada o cenário é ainda mais preocupante, as vendas não chegam a 15%.
Desde que o zika se tornou uma preocupação mundial, o site Ticketbis registrou queda de 56% na procura de ingressos.
Não é um bom sinal.
Para ter uma ideia, nos Jogos de Londres, em fevereiro de 2012 restavam poucos ingressos só para o futebol. Na Paraolimpíada, o país anfitrião bateu recorde de vendas e três semanas antes do jogos, 2,1 milhões de ingressos tinham sido vendidos num total de 2,5 milhões.
A pouca procura pode ter tido reflexo na decisão do Comitê Olímpico Internacional em diminuir o número de assentos em algumas arenas, como a de vôlei de praia. A construção da arquibancada flutuante na lagoa Rodrigo de Freitas foi cancelada, o que irritou o diretor-executivo da Federação Internacional de Remo, Matt Smith.
O prefeito Eduardo Paes, que está se especializando em fazer piadas sem graça (vide o caso de Maricá), recomendou que as pessoas assistam às competições de remo na beira da lagoa, tomando cerveja com suas famílias.
O mesmo jeitinho brasileiro já é cogitado caso a linha 4 do metrô do Rio não fique pronta. Em fevereiro, o prefeito se disse preocupado e veio com a salvadora solução de implementar o BRT (corredores exclusivos para ônibus), campeão de reclamações entre os usuários.
A falta de interesse do público interno é particularmente danosa no que se refere à cidadania porque tanto cariocas como brasileiros deixaram de cobrar pelos compromissos assumidos pelas autoridades.
Não dá pra culpar o cidadão pela indiferença, a Olimpíada até agora só trouxe más notícias.
Jogou-se fora talvez a única oportunidade concreta de melhorar a qualidade das águas que banham a cidade do Rio. O zika desnudou a faceta triste da falência das políticas públicas de saneamento e de saúde do país inteiro.
Sabe-se lá se haverá metrô, o que dos males ainda é o menor, diante de todos os outros problemas da cidade, e que ficará pronto mais cedo ou mais tarde. Torçamos que seja mais cedo.
No meio de tudo, o Ministério do Esporte talvez mude de titular. Por razões políticas, George Hilton, que não entende nada de esporte, pode sair, o que criaria um ambiente ruim de indefinição.
Até a Olimpíada muita coisa pode acontecer. Muita coisa pode piorar. A tensão nas ruas pode explodir. O governo pode cair. E quando a gente piscar, será dia da abertura dos Jogos. Imagine o clima.
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*É jornalista e roteirista. Apresenta o programa "Sem Mimimi com Mariliz", no YouTube.