Edmar Bacha: É absurdo o PSDB não fechar questão pela Previdência 29/11/2017
- Alexandre Calais - O Estado de S.Paulo
O economista Edmar Bacha, um dos formuladores do Plano Real, fez críticas diretas ao seu partido, o PSDB, por não ter fechado questão em torno da reforma da Previdência.
Para ele, a mudança é uma das bases de tudo que o partido sempre defendeu para a economia.
Junto com outros integrantes do PSDB, os economistas Elena Landau e Luiz Roberto Cunha e o sociólogo Bolívar Lamounier, ele publicou uma carta às bancadas do partido no Congresso dizendo que negar apoio à reforma agora seria abandonar “todo o esforço nessa direção feito ao longo do governo Fernando Henrique Cardoso”.
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Em relação à eleição do ano que vem, disse que o primeiro pilar da campanha do PSDB precisa ser a ética.
ENTREVISTA
Os parlamentares do PSDB estão pedindo mudanças no projeto de reforma da Previdência que reduzem ainda mais o alcance da proposta. Como o sr. está vendo isso?
– Não estou acompanhando diretamente a tramitação. Mas fiquei muito preocupado, junto com meus amigos, quando vi, na semana passada, que o PSDB não estava querendo fechar questão com a reforma proposta. Isso é um absurdo.
É uma coisa fundamental para o País, está na origem fiscal do Plano Real. É uma reforma que nós já tentamos, e perdemos por apenas um voto...
A situação é terrível. O Brasil gasta por ano 12% do PIB com Previdência, o que é inacreditável para a estrutura etária da população. Gasta como a Bélgica, que tem três vezes mais velhos, proporcionalmente à população.
Por qualquer projeção que você faça, não vai sobrar dinheiro para mais nada, com a população envelhecendo na taxa em que está.
Os parlamentares estão colocando a questão política na frente da questão econômica?
– Nas conversas que venho tendo sobre a questão da Previdência, fico muito impressionado com o grau de ignorância que existe.
Quantas vezes eu já ouvi que não tem déficit, porque impostos que deviam ir para a Previdência não estão indo para a Previdência, e eu respondo: imagine que tudo que você quer que fosse para a Previdência fosse para lá, como você iria financiar educação e saúde, por exemplo?
As pessoas têm uma enorme dificuldade de entender essa questão orçamentária, impressionante como isso é tão abstrato.
Mesmo entre os parlamentares?
– Pois é, é engraçado como falta essa percepção dos limites das finanças públicas, há uma crença subjacente de que o governo tem a capacidade de criar dinheiro.
E os políticos veem a reação do eleitorado contra a reforma, aí eles ficam com medo.
Eu não sei como é que a gente resolve isso, tem de fazer um esforço de comunicação.
Qual o risco de a reforma estar sendo tão modificada?
– Vamos ter de fazer outra em 2019. Quando entrar um outro governo, vai ter de voltar com um pacote mais completo.
Mas vamos votar esse agora, desde que haja a compreensão de que é uma porta de entrada, e não uma porta de saída. Precisamos dar esse impulso.
O sr. e outros economistas defenderam no meio do ano a eleição de Tasso Jereissati para a presidência do PSDB e a saída do partido do governo Temer. Na segunda-feira, porém, fechou-se acordo para o governador Geraldo Alckmin assumir a presidência do partido. Como o sr. viu esse movimento?
- Eu preferia que o Tasso tivesse sido escolhido, desde lá atrás. Nosso movimento começou em agosto, quando enviamos uma carta para o Tasso e um manifesto pedindo a saída do governo.
Em novembro, fizemos outra carta, com um pouco mais de substância, não só dando apoio ao Tasso, mas insistindo nos pontos anteriores, como a saída do governo, resolver o problema do Aécio (senador Aécio Neves, acusado de pedir R$ 2 milhões a Joesley Batista, da JBS), apresentar uma proposta de refundação programática e ética do partido.
Mas a avaliação agora foi de que, se o partido fosse decidir o presidente no voto, ia implodir. Foi a avaliação que o próprio Fernando Henrique fez, aí ele apresentou o nome do Alckmin.
Eu não gostei da proposta, o próprio Alckmin não gostou. Mas aí, quando se pergunta, quem poderia assumir? Qual o nome que tem? Tem o Fernando Henrique, mas ele não iria querer. Então, não tinha outro nome.
Foi a única alternativa?
- O que se vai fazer, né?
O grupo de economistas do qual o sr. faz parte chegou a cogitar deixar o partido, e o Gustavo Franco fez isso. Ainda está no radar?
- Agora, não. Mas, na política, cada dia é um dia, sabe-se lá o que ainda vai acontecer... Mas eu estou de tal maneira vinculado ao partido... Se houvesse obviamente uma nova dissidência, e se fundasse um outro partido, do jeito que a gente saiu do PMDB... Mas acho que há uma possibilidade muito clara de o partido ganhar com o Alckmin.
O PSDB divulgou um documento que traz o que deve ser o pilar para a campanha de 2018. Fala da retomada do crescimento, do combate à pobreza e às desigualdades, de reduzir a máquina estatal e de um amplo programa de privatizações. O sr. participou da elaboração desse documento?
- Não, isso é coisa lá do José Aníbal (presidente do Instituto Teotônio Vilela, centro de estudos e formação política do PSDB). Eu não participei, não.
Mas quais pontos o sr. considera ser fundamentais na campanha do ano que vem?
- Na frente de tudo, ética. É o ponto fundamental. Sem o primeiro, não adianta o segundo. O segundo ponto são as reformas. E as reformas têm três eixos básicos: abertura da economia; a desburocratização, no sentido de se ter um Estado a serviço do cidadão, e as privatizações.
Tudo isso dentro de uma proposta de retomada de um crescimento sustentável e equitativo. A questão da equidade é fundamental, por isso o partido é social-democrata.
Que cenário o sr. traça para a eleição de 2018?
– Acho que as pessoas ainda não se deram conta de que teremos uma eleição inglesa, o que eles chamam de “snap election”, no sentido de que, apesar de todo esse longo preâmbulo, de campanha mesmo serão 35 dias.
O que vai chegar mesmo no Brasilzão nem são mais os longos programas eleitorais, são spots na rádio e na televisão e, eventualmente, debates.
Não sei se o Huck desistiu por causa disso, mas que tempo ele teria? Que tempo terá a Marina, que tempo terá Bolsonaro? Zero! Quem vai ter tempo é o Lula. E o PSDB, se se aliar com mais três ou quatro. Então, eu acho que ainda vai afunilar muito.