FHC: Bolsonaro é autoritário e Ciro Gomes, imprevisível e errático 17/06/2018
- Germano Oliveira - ISTOÉ
Em entrevista exclusiva à ISTOÉ, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse considerar um atraso para o desenvolvimento do País a polarização entre Jair Bolsonaro, que para ele representará a volta do autoritarismo, e Ciro Gomes, considerado como “imprevisível” por não ser possível caracterizá-lo nem como direita nem como esquerda.
Por isso, o ex-presidente, que amanhã completa 87 anos, defende com vigor a união dos sete candidatos do centro em torno de uma única candidatura que, necessariamente, não precisa ser a do PSDB.
“Eu não posso dizer: só caso se for com a Maria”.
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FH afirma que até às convenções a negociação em busca da unidade será importante para a consolidação de um “projeto progressista e democrático”. Alegou estar convencido, porém, que Geraldo Alckmin é o melhor candidato e que o PSDB “não tem plano B”.
O senhor subscreveu há alguns dias o manifesto “Por um pólo democrático e reformista”, pedindo a união dos partidos do centro, para evitar uma volta ao passado. Qual é a ameaça política que o senhor vê ao futuro do Brasil?
– Eu falo da criação de um pólo progressista e democrático, respeitando a Constituição e o Estado de Direito. No quadro atual, a gente até se esquece das ameaças que podem acontecer. De forma dramática, acho pouco provável que aconteça uma quebra formal das regras do jogo. De forma não dramática, ou seja, pela absorção paulatina dos que vierem a governar o País, com a adoção de medidas mais arbitrárias, isso pode acontecer sim.
Temos que evitar uma volta ao passado. Eu não me refiro tanto ao lulopetismo, do risco do PT voltar a governar, porque a gente já tem experiência do que é o PT no poder. Não acredito que eles quebrem as regras e rumem para o viés autoritário.
O risco vem do pólo à direita. As declarações do candidato Jair Bolsonaro nos assustam. Ele é autoritário. Tem feito declarações autoritárias.
É preciso que o Brasil não tenha também um governo imprevisível e arbitrário. No caso do Ciro Gomes, eu não posso dizer que ele seja de direita ou de esquerda. Ele não é uma coisa, nem outra. Ele é mais errático, portanto, é imprevisível.
Como unir o centro? O deputado Marcus Pestana, do PSDB, chegou a propor que todos os sete candidatos do centro desistam de suas candidaturas e se escolha então um nome de consenso. Isso é possível?
– Na vida partidária, é difícil imaginar que as pessoas, no ponto de partida, se disponham a abrir mão. Elas se dispõem a dizer que vão ganhar. No momento em que estamos há o risco de que nenhuma dessas candidaturas de centro chegue ao segundo turno.
Há o risco sim de termos uma imprevisibilidade ou uma tendência autoritária no segundo turno.
Portanto, seria aconselhável que as pessoas olhassem para as pesquisas. Como os políticos, naturalmente, puxam a brasa para a sua sardinha, têm que ter capacidade de entender que isso é um processo.
Mesmo os candidatos ligados a grandes partidos não têm mostrado capacidade de juntar e acho que precisamos chegar a um entendimento até as convenções.
Ou seja, faltam menos de dois meses…
– Sim, as convenções vão até 5 de agosto. É o tempo que vamos ter para isso. Os que têm consciência histórica e o sincero desejo de ver o Brasil andar, e que não vêem apenas a sua candidatura, têm esse tempo para alinhavar uma possibilidade de se chegar a um nome que represente a maioria da população.
A população não quer que fiquemos na mão dessas duas candidaturas mais radicais e que hoje estão à frente nas pesquisas. Quer alguém mais palatável. Centro não quer dizer “centrão”, que no Brasil significa a união de tendências fisiológicas. O País cansou disso.
A chave de tudo é alguém que inspire confiança. A crise mais perceptível hoje é de confiança. Temos que voltar a ter entusiasmo pelo Brasil. A falta de entusiasmo deriva dos fracassos recentes que sofremos.
Geraldo Alckmin não consegue sair dos 6%. Por que não decola?
– No primeiro momento de qualquer campanha você tem a seguinte dificuldade: tornar-se conhecido ou ser demasiadamente conhecido. Até o muito conhecido, como é o caso do Geraldo, precisa fazer as pessoas tomarem conhecimento de que ele é candidato outra vez e isso leva tempo. No Brasil tem muita coisa nova acontecendo.
Tem o novo no cinema, tem o novo no teatro, na música, tem novo no futebol. Agora, o que falta é o novo na política.
O PSDB tem o novo?
– Nem o PSDB e nenhum outro partido tem o novo.
Como se obter o novo?
– Isso passa pelos meios de comunicação e nós estamos habituados aos meios de comunicação tradicionais, rádio, televisão, jornal e revista. Mas hoje temos as mídias sociais. Os meios de comunicação estão ansiosos pelo bizarro ou pelo novo.
Então, um político tradicional como o Geraldo, leva mais tempo para se consolidar. Mas também esse novo não pode queimar na largada. O Geraldo é um candidato experimentado, é maratonista. Tem que se dar tempo ao tempo. Isso não significa, porém, que temos que ficar de braços cruzados.
Alckmin está jogando parado?
– Ele está fazendo o que é necessário. Procurando alianças, com o objetivo de ter mais tempo de rádio e televisão. E ele tem um outro objetivo: as estruturas políticas estão desgastadas, mas elas existem.
Quem imaginar que a Câmara vai mudar de cabo a rabo, está enganado. Os candidatos a deputado dependem muito das estruturas organizadas, dos clubes, das empresas, das igrejas.
Então, o candidato está costurando alianças para ter apoios nos Estados. E ele precisa escolher também o vice.
Vai escolher no Sul, Sudoeste ou no Nordeste? E o que faz com Minas e com o Rio, que são Estados que decidem?
Em Minas, ele tem o Anastasia, mas e no Rio? Dificilmente o PSDB terá um candidato próprio com força lá. Vai se aliar a quem no Rio?
O MDB, DEM, PP e outros estão resistindo em fazer aliança com o PSDB?
– Li hoje que o DEM já está decidindo não ter candidato a presidente. Acho que o nosso candidato, como ex-governador de São Paulo, tem um problema a resolver. Os palanques no Estado. O problema é que há dois candidatos a governador que apoiam o Geraldo (João Doria pelo PSDB e Márcio França pelo PSB).
Eu tive dois palanques dificílimos em São Paulo quando fui candidato: Mário Covas e Paulo Maluf. Não foi fácil, mas saí com uma votação estrondosa de São Paulo.
O que une hoje é a crença no candidato, que ele toque o coração das pessoas. Alckmin ganhou várias eleições e do jeito dele. Eu sei que São Paulo não é o Brasil, mas de qualquer maneira ele é bom de televisão, fala claro, e é simples.
Se o Brasil cansou de desordem, de imprevisibilidade, o Geraldo é o candidato mais seguro. Me lembro que quando me elegi presidente pela primeira vez, em junho eu estava com 12% e o Lula com 40%.
Aí veio o Plano Real em julho e disparei em agosto. Tá certo que agora não tem o Plano Real…
O senhor acha que o eleitor continua procurando o novo?
– E não é só aqui, essa tendência de se procurar o novo. Aconteceu na Espanha, na França e nos Estados Unidos, embora o Trump não seja o novo que eu goste, mas ele propôs uma coisa que juntou os cacos. E aqui tem que juntar, ter coesão, uma chama nova. Aqui estamos às cegas.
Com o quadro atual para o segundo turno, o empresário reflui, o consumidor compra menos, as pessoas ficam preocupadas com o futuro.
O senhor já disse que a população quer o novo e lá atrás pensou em nomes como o do apresentador Luciano Huck, mas ele não aceitou ser candidato. O senhor também já defendeu nomes como o de João Doria.
– Primeiro vamos falar do Luciano Huck. Ele é popular, tem densidade social e é ligado ao PSDB. Mas ele teve que tomar uma decisão. A decisão era dele e não minha. E ele escolheu ficar na Globo
E o Doria, tem gente do PSDB que defende trocar Alckmin por ele?
– Nunca vi ninguém defender. Vejo no jornal, mas nunca vi nenhum líder do partido defender isso. Acho a troca pouco provável. E o Doria tem chance de ser governador de São Paulo.
Então o partido tem que insistir com o Alckmin até o fim?
– Não sei qual será seu potencial de crescimento, mas certamente o candidato do PSDB é o Alckmin. Não vejo plano B.
O senhor acha que pode ter um nome alternativo para impedir a polarização do Bolsonaro e Ciro, que o senhor já disse que representam um atraso para o País?
– Não se pode dizer: eu só caso se for com a Maria. Tem que ver o que vai acontecer nesses dois meses até as convenções. Eu, por exemplo, não acho a Marina um terror. Acho que a Marina tem muitas virtudes. O Alvaro Dias não sei qual é a base efetiva. Hoje tem votos no Paraná. O problema do Alvaro é que quem vota nele, votaria no Geraldo.
Mas esses nomes seriam para cabeça de chapa ou para vice do Alckmin?
– Estou dizendo que você não pode, no ponto de partida de uma negociação para se encontrar um candidato de centro, falar que eu só caso se for com a Maria…
O Geraldo tem mais conhecimento da máquina, capacidade administrativa, olha para o fiscal. Podem dizer: ah ele é muito religioso. Sim, pode ser. Mas não é uma pessoa que julgue as coisas pelo ângulo da religião ou pela ideologia. Ele é tolerante. A Marina também é tolerante. O que ela não tem é partido, tempo de televisão. É barreira grande.
Ela seria uma boa vice para o candidato do PSDB?
– Ela não quer ser vice. Eu não vou propor uma coisa que pode ser entendida como menor. Eu respeito a Marina. Na eleição de 2014, ela apoiou o Aécio contra a Dilma. Ela é previsível. Mas neste momento não há razão para propor também que o Geraldo seja seu vice.
O centro unido vence a eleição?
– Sim, podemos vencer. E qual é o medo de não ganhar? Nós já perdemos muito tempo. É patético. Perdemos a centralidade no mundo. Temos que resolver problemas óbvios.
Não dá para ter o endividamento público crescente como temos. Isso termina em inflação ou algo pior, como confisco, sei lá o que.
Temos que tomar decisões cruciais, que já deveríamos ter tomado a mais tempo.
O Brasil vai acabar? Não, não vai acabar. Mas se não unirmos o centro e permitirmos a vitória dos que polarizam hoje vamos atrasar nosso desenvolvimento.
E polarização entre esquerda e direita? O senhor acha que é tudo o que a maioria da população não quer ou ainda há quem prefira o Fla-Flu?
– Não ajuda. Não é nem a questão de esquerda. O PT é previsível. Eu posso não gostar, mas sei mais ou menos o que eles vão fazer. Eu tenho mais medo da imprevisibilidade do Ciro.
Com ele, não se sabe o que vem pela frente. O País fica tonto. Não estamos num momento de arriscar. Não podemos voltar atrás. Se crescermos 3% ou 4% durante dez anos, mudaremos o sentimento de todo mundo. Isto aqui não é para principiantes.
A denúncia de que recebeu caixa 2 da Odebrecht pode estar afetando desempenho de Alckmin?
– Geraldo tem passado limpo. Ele é pobre, classe média/média, e todo mundo sabe que ele não rouba.
Falando em Odebrecht, o senhor pode explicar o pedido de dinheiro que fez a Marcelo Odebrecht para campanhas de tucanos em 2010?
– Eu pedi mesmo. Sou presidente de honra do PSDB e quando via candidatos razoáveis que precisavam de apoio, eu pedia. Não só para a Odebrecht. Pedi, mas dei o número da conta de campanha. E eu não tinha cargo nenhum no governo. Não teve toma-lá-dá-cá.