Três zagueiros ou quatro atacantes? 30/04/2019
- Alexandre Lozetti - GloboEsporte.com
O número de envolvidos nos processos de preparação e execução de uma partida de futebol inibe a criação de rótulos.
A quantidade de variáveis que se encontra semana após semana não permite que se atribua resultados a apenas um fator.
São diferentes adversários, gramados, necessidades, climas, e destaca-se a adaptabilidade de treinadores e jogadores.
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A primeira rodada do Campeonato Brasileiro debochou dos rótulos.
Jorge Sampaoli escalou o Santos com três zagueiros e está claro não ser essa uma ação defensiva.
O São Paulo da década passada, o Grêmio de Tite e a Seleção de Felipão – em 2002 –, para falar apenas de exemplos nacionais, já nos ensinaram.
O argentino não abriu mão de qualquer conceito em Porto Alegre. Apenas adequou-se ao duelo contra o Grêmio, dono do futebol mais encantador do país, e de forças bem conhecidas.
Os índices finais de posse de bola – 63% dos gaúchos e 37% dos paulistas – têm de ser relativizados.
O Santos fez 1 a 0 aos cinco minutos de jogo. Ampliou aos 34. Daí em diante, natural que o Grêmio tenha tido o domínio.
A posse sempre precisa ser analisada em relação ao placar, senão pode distorcer realidades.
Além da versatilidade coletiva da equipe de Sampaoli, ficou de um belo jogo a impressão de que Diego Tardelli terá, em breve, lugar cativo com Renato Gaúcho.
Mais próximo de uma forma física que lhe permita rendimentos de alto nível, ele tem inteligência rara no futebol brasileiro para usar o pivô a seu favor: encontra o passe e o espaço para receber a tabela.
Como Renato não abre mão de um 9 com essas características, logo formará essa parceria.
Se três zagueiros não significam um time defensivo, quatro atacantes não necessariamente configuram uma missão ao gol.
Rogério Ceni não pensou em pressionar o Palmeiras quando optou pela manutenção da base campeã estadual, com Edinho e Osvaldo pelos lados, Júnior Santos e Wellington Paulista centralizados.
Tratou-se da aposta em dedicação sem a bola e velocidade em sua retomada.
Não foram suficientes. O atropelo dos campeões representa a diferença entre os elencos. O Fortaleza não tem jogadores de meio-campo.
No Palmeiras, quando Ricardo Goulart teve de ser substituído por Zé Rafael, imaginou-se um problema. Virou solução.
Não se trata de análise individual, mas o ex-Bahia supre mais as carências de criação de um time que pouco cadencia sua construção de jogadas ofensivas do que o caríssimo meia-atacante bicampeão brasileiro.
Tal qual substituir Ricardo Goulart por Zé Rafael, trocar Alexandre Pato por Toró também pode ser positivo e necessário.
Em sua estreia, o São Paulo precisava de força e velocidade ofensivas que, àquela altura do segundo tempo, o reforço, há meses sem atuar, não poderia mais entregar.
A movimentação do garoto fez o Botafogo retrair sua saída de bola e criou espaços aproveitados pelos homens de meio – o gol da vitória teve participação de Tchê Tchê, Hernanes e Hudson.
Ainda na caça aos rótulos, Mano Menezes começa o Brasileirão com o carimbo dos melhores, senão o melhor, técnicos do país, enquanto Abel Braga é réu pelo fato de o Flamengo não apresentar o futebol que se espera com tantos talentos reunidos.
No primeiro grande jogo, o Cruzeiro não se impôs em momento algum no Maracanã.
É como se Mano construísse ano a ano um andar no edifício de sua carreira, mas insistisse em morar no segundo.
Sua competência e as peças deste Cruzeiro são bons estímulos a pegar o elevador.
Esse time tem ingredientes para tentar controlar qualquer adversário, e conseguir contra a maioria.
A velocidade de circulação de bola do Flamengo no segundo tempo fez diferença.
NA INGLATERRA
Ao mesmo tempo em que Sampaoli vencia no 3-4-1-2 e no 3-5-2, Pep Guardiola trocava dois atacantes por dois zagueiros nos minutos finais para se defender de um time que nem atacava.
O Manchester City se sentiu pressionado, não pelo frágil Burnley, mas pela proximidade do título. Faltam duas rodadas e o Liverpool segue na cola, um ponto atrás.
Desmistificando rótulos: Guardiola nunca foi nem será “retranqueiro”, mas é capaz de agir sobre reações mentais que afetam até mesmo mentes preparadas no mais alto nível de excelência.
Ofereceu aos seus jogadores a segurança de ter dois grandalhões a mais na área diante de uma única possibilidade de perigo do rival de alta estatura, a bola aérea.
Em entrevista à revista digital “The Tactical Room”, em 2017, o técnico colombiano Juan Carlos Osorio, ex-São Paulo, seleção mexicana e Atlético Nacional, disse:
– Desgraçadamente, sabemos muito pouco sobre a mente humana e dedicamos muito pouco tempo a estudá-la. (...) Eu faço um esforço genuíno para entender que a preparação mental é a mais importante para qualquer atleta.