Fila para cidadania italiana tem 500 mil brasileiros 25/03/2008
- Valquíria Rey - BBC
Passaporte italiano facilita a entrada nos EUA e na Inglaterra, por exemplo
Números da Embaixada da Itália, em Brasília, mostram que cerca de 500 mil brasileiros estão na fila de espera em consulados para o reconhecimento da cidadania italiana.
O número é praticamente o dobro do total de brasileiros que já conseguiu cidadania por descendência.
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¨O número de brasileiros que já conseguiu obter a cidadania italiana por descendência é de cerca de 215 mil¨, informou à BBC Brasil o primeiro conselheiro do Departamento de Assuntos Consulares da Embaixada Italiana, em Brasília, Alberto Colella.
Apesar de ter direito garantido à segunda nacionalidade, a grande maioria não sabe quando o documento chegará. Apenas que poderá demorar meses, anos e até mesmo décadas.
Isso porque os consulados não se prepararam para a grande demanda e o governo italiano ainda não acenou com processos de informatização, ou mesmo contratação de novos empregados para lidar com o crescente número de pedidos.
¨Os principais consulados no Brasil fazem uma média de 50 a 60 legalizações por mês, em processos que englobam famílias de cinco, seis e até dez pessoas¨, disse Imir Mulato, diretor da Agência Brasitalia, especializada em buscas genealógicas e serviços sobre cidadania italiana. ¨O governo italiano sabe que se colocasse mais funcionários, acabaria com as filas. Sabe também que, se fizer isso, mais ítalo-brasileiros irão para a Itália¨.
Segundo Imir Mulato, dentro dessa média, demoraria 30 anos para que todos os pedidos feitos no Brasil até o momento terminassem de ser avaliados.
Opção mais rápida
Para os que não querem esperar tanto, a opção é encaminhar a papelada diretamente em uma prefeitura italiana e comprovar residência fixa no país. Nesse caso, bastaria esperar de dois a quatro meses até se conseguir o reconhecimento da cidadania.
Foi o que fez a empresária Silvia Lezcano, que mora nos Estados Unidos há mais de uma década e resolveu passar uma temporada em Roma.
¨Decidi encaminhar a papelada para facilitar a vida da minha filha mais velha¨, disse. ¨Ela sonha em fazer uma faculdade em Londres. Com o passaporte italiano, tudo se tornaria mais fácil¨.
A cidadania italiana é regulamentada pela lei número 91 de 5 de fevereiro de 1992. Baseia-se no princípio do jus sanguinis – termo latino que indica direito de sangue – e pode ser transmitida a todos que têm ascendência italiana por parte de pai em todas as gerações. Podem ser filhos, netos, bisnetos ou mesmo descendentes de gerações mais distantes.
Já do lado materno, a nacionalidade é restrita a quem nasceu depois de 1948, quando a Itália igualou direitos de homens e mulheres.
Mercado
Em função do contingente de cidadãos brasileiros com direito à segunda nacionalidade, a quantidade de escritórios especializados em processos de cidadania italiana é grande. Alguns escritórios cobram até R$ 5 mil para reunir e encaminhar documentos aos consulados.
Se o cliente desejar o auxílio na Itália, alguns escritórios arrumam residência fixa no país, onde a pessoa ficará morando até conseguir a cidadania. O serviço custa em média 2,5 mil euros (R$6,7 mil).
Por ter uma das legislações mais flexíveis da União Européia, a Itália criou vantagens para seus descendentes inexistentes nos países do bloco europeu, que limitam a concessão da cidadania a filhos e netos.
Para os descendentes de italianos é tudo mais fácil. Um bisneto, por exemplo, pode obter a cidadania italiana e trabalhar regularmente em Londres ou Madri, o que é impossível para um bisneto de espanhóis, que não tem direito ao passaporte.
Estima-se que entre 300 e 400 brasileiros com passaporte italiano viagem à Itália todos os meses. Desses, apenas 10% ficam no país, 10% retornam ao Brasil, 40% vão à Inglaterra e os restantes 40% têm como destino outros países europeus, principalmente Espanha e Portugal.
¨O sonho do imigrante brasileiro na Europa é ir para Londres¨, assinala o demógrafo do Programa de Pós-graduação em Geografia da PUC-Minas, Duval Fernandes. ¨Lá trabalha-se por hora, o mercado é desregulamentado e ganha-se numa moeda estável e forte.¨
Rumores de mudança
Apesar dos rumores no ano passado de que a lei da cidadania mudaria, restringindo o direito apenas a filhos e netos de italianos nada aconteceu.
Mas um Projeto de Lei de iniciativa do governo está em análise na Câmara dos Deputados e prevê algumas modificações.
Entre elas, a introdução do jus soli – nacionalidade pelo lugar de nascimento –, como princípio de transmissão da cidadania, e o direito dos descendentes de italianas nascidos antes de 1948.
¨Não existe nenhum projeto de lei ou emenda que prevê alguma limitação ao jus sanguinis¨, afirmou o senador Edoardo Polastri, eleito em 2006 pelos italianos que moram na América do Sul.