Em 2006, três países expulsaram mais de 20 mil brasileiros 25/03/2008
- Fernanda Nidecker - BBC
Apenas a Grã-Bretanha repatriou 11,3 mil brasileiros em 2006
A mineira de Belo Horizonte Célia*, de 48 anos, trabalhava na cozinha de um restaurante brasileiro no norte de Londres, quando oficiais de imigração fizeram uma batida para verificar a documentação dos funcionários. Foi levada com outras três pessoas para uma delegacia onde ficou três dias antes de ser deportada.
O drama de Célia é comum a milhares de imigrantes todos os anos. A soma das estatísticas disponíveis em três dos principais destinos de brasileiros indica que pelo menos 21,9 mil foram expulsos da Grã-Bretanha, da Espanha e dos Estados Unidos em 2006. A soma inclui barrados nas fronteiras e deportados após um período de ilegalidade.
Metade desse total vem da Grã-Bretanha, que apresenta números anuais tanto para o total de barrados nos aeroportos quanto para o de deportados. Em 2006 (os dados mais recentes), 11,3 mil brasileiros foram mandados de volta, uma média de 31 brasileiros por dia. Desse total, 4,9 mil foram barrados nas fronteiras e 6,3 mil, deportados (cifra inclui um pequeno número que retornou voluntariamente).
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¨Eles não vão descansar enquanto não mandarem de volta todos os brasileiros ilegais que estão lá¨, disse Célia, que está desempregada no Brasil, mas não pensa em se aventurar no exterior novamente depois de sua deportação em novembro de 2007.
Espanha
O número de brasileiros barrados nos aeroportos espanhóis é ainda maior do que nos aeroportos britânicos. Em 2006, a Espanha impediu a entrada de cerca de 7,7 mil brasileiros.
O cálculo foi feito segundo estimativa da polícia espanhola que indica que 40% dos 19,2 mil barrados no aeroporto de Barajas, a principal porta de entrada na Espanha, vêm do Brasil.
As estatísticas oficiais espanholas, no entanto, oferecem uma visão limitada do fenômeno, já que não há dados sobre o número de brasileiros deportados após um período na ilegalidade.
O número total de deportados da Espanha – que inclui todas as nacionalidades – chegou a 99,4 mil em 2006.
A Espanha é o único dos três países que já divulgou dados de 2007.
Com o endurecimento das leis em 2007 – que levou ao aumento de 62% no número de policiais nas fronteiras – a quantidade de brasileiros barrados foi ainda maior.
Cerca de 9,7 mil brasileiros não conseguiram entrar em território espanhol e foram enviados de volta.
Estados Unidos
Os Estados Unidos, por exigirem visto expedido no Brasil, não apresentam números expressivos de barrados em aeroportos nem divulgam tais estatísticas.
Fornecem apenas o total de deportados, ou seja, ilegais descobertos em território americano e expulsos do país. Em 2006, o país devolveu 2.957 brasileiros, um número muito inferior ao do ano anterior, quando 32.112 foram removidos.
Segundo o Centre for Immigration Studies, com sede em Washington, essa diminuição se explica, entre outros fatores, por uma nova lei mexicana, aprovada em outubro de 2005, que prevê a exigência de vistos para várias nacionalidades, entre elas a brasileira.
Desanimados com a nova barreira, muito brasileiros que pretendiam entrar pela fronteira mexicana nos Estados Unidos, onde frequentemente são presos e deportados, desistiram.
¨É difícil saber por que uma certa nacionalidade apresentou uma redução tão expressiva de um ano para outro. Sabemos que o México era a principal via de acesso e supomos que o maior controle das autoridades mexicanas tenha reduzido o número de brasileiros que tentam cruzar a fronteira ilegalmente¨, explicou um porta-voz à BBC Brasil.
Outros países europeus, como a Itália, também são conhecidos destinos de brasileiros, mas apresentam números muito inferiores de barrados ou deportados. Na Itália, por exemplo, 683 brasileiros foram barrados em portos e aeroportos do país em 2006. O país também não fornece o número de deportados brasileiros.
Motivação
Apesar dos riscos, milhares de brasileiros continuam deixando o país. O maior controle faz imigrantes em potencial apenas buscarem portas de entrada consideradas ¨mais abertas¨, segundo especialistas no tema.
Para Gláucia Assis, pesquisadora especialista em imigração da Universidade Estadual de Santa Catarina (Udesc), o que impulsiona esses brasileiros continua sendo a busca por uma vida melhor, conceito que tem ganhado diferentes aplicações com o passar dos anos.
¨Nos anos 80, por exemplo, o Brasil estava imerso numa crise econômica. Hoje, não estamos em crise e muitos migrantes não deixam o Brasil porque estão desempregados¨, disse.
¨Preferem o subemprego em Londres ao subemprego em São Paulo¨, resumiu Assis.
Mesmo os trabalhos que não exigem qualificação nos países desenvolvidos permitem que esses imigrantes tenham acesso ao mundo do consumo. ¨Podem não ter documentos, mas passam a ter uma espécie ´cidadania do consumo´, algo que lhes falta no Brasil¨, conclui.