Senado da Argentina veta impostos sobre grãos 17/07/2008
- Folha Online
O projeto do governo da Argentina para atribuir impostos móveis às exportações de grãos foi rejeitado nesta quinta-feira no Senado pelo voto do vice-presidente, Julio Cobos.
A decisão surgiu após mais de 18 horas de debate entre governistas e oposição sobre o projeto de lei que prevê o aumento dos impostos sobre as exportações do setor agropecuário. A sessão, que começou por volta das 10h30 de ontem, se estendeu por quase toda a madrugada.
Aprovado no início do mês pela Câmara dos Deputados, a medida é motivo de uma queda-de-braço entre o governo e o setor rural desde que foi lançado, em março. O projeto pretendia impor impostos móveis às exportações de grãos.
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A extensa discussão no plenário do Senado transcorreu em meio a estritas medidas de segurança e sem a presença no recinto de simpatizantes dos setores em disputa.
Durante a sessão, legisladores fizeram duras críticas contra o campo e o governo, lamentando a situação de pobreza e atraso de várias províncias argentinas e argumentando a favor e contra a reforma tributária.
Desempate
O vice Julio Cobos, que também é presidente da Casa, se viu obrigado a desempatar a votação quando o placar do Senado mostrava 36 votos a favor do aumento de impostos e 36 votos contra o projeto. Por duas vezes os senadores deixaram a votação empatada.
Sua decisão contra o governo derrubou a aposta de Cristina Kirchner, que esperava a aprovação da medida no Congresso, e pode provocar um racha na Presidência, segundo informou o jornal argentino ¨Clarín¨.
¨Sua decisão aprofunda a distância que já existia no Executivo, principalmente por sua postura no conflito do campo¨, declarou o jornal.
¨Obviamente o consenso não está presente, e o país está dividido¨, afirmou o vice-presidente. ¨Hoje deve ser o dia mais difícil da minha vida.¨
Manifestações
Enquanto os senadores participavam de uma intensa jornada de discussões no interior do Palácio do Congresso, do lado de fora as mobilizações dos simpatizantes do governo e do campo refletiam a divisão vivida na Argentina.
Centenas de simpatizantes governistas aguardaram durante todo o dia em frente às portas do Parlamento.
Já os defensores do setor agrário decidiram se concentrar a poucos quilômetros do local, no bairro de Palermo, para acompanhar o debate através de telões instalados nas ruas.
Durante a noite de quarta-feira, foram ouvidos em vários bairros de Buenos Aires ¨panelaços¨ contra o governo e a favor da postura dos produtores agrários.
O projeto governamental chegou ao Senado após ser aprovado pela Câmara dos Deputados por 129 votos a favor e 122 contra, em uma sessão que foi encerrada no dia 5 de julho e que durou mais de 17 horas.
O setor agrário afirmou que, se o Senado aprovar a iniciativa, o próximo passo a ser adotado será recorrer à Justiça alegando que o polêmico esquema tributário é ¨inconstitucional¨.
Apelo
Os líderes ruralistas fizeram um apelo aos senadores para que não aprovem o projeto de lei.
¨Legisladores nacionais, vocês têm a possibilidade de votar pelo povo¨, disse Alfredo di Angelis, da Federação Agrária da província de Entre Ríos, o primeiro a falar no comício de apoio ao campo.
¨Essa medida não pode ir adiante¨, disse o presidente da Sociedade Rural, Luciano Miguens. ¨É injusta, confiscatória e inconstitucional.¨
O conflito entre o campo e o governo começou no dia 11 de março, quando o então Ministério da Economia, Martín Lousteau, ditou uma resolução na qual impôs impostos móveis às exportações de grãos.
Historicamente, o setor agropecuário sempre foi o principal da economia argentina. Atualmente, o setor representa mais de 20% do PIB (Produto Interno Bruto).
A rejeição ao novo esquema tributário gerou quatro greves que impediram a comercialização de grãos, além de bloqueios de estradas e desabastecimento de alimentos para a indústria, que causaram milionárias perdas ao país.
A crise provocou um intenso desgaste da imagem de Cristina Fernández, que viu seus índices de popularidade despencarem após sete meses de administração. Além disso, os protestos provocaram a saída de Lousteau do governo.