Após fracasso de Doha, nova agenda exigirá acordos bilaterais 30/07/2008
- Iuri Dantas - Folha de S.Paulo
A frustração de um acordo na Rodada Doha da OMC vai impor ao Brasil a necessidade e o desafio de ampliar a rede de acordos de livre comércio com outros países, a começar pelos EUA, reeditando uma espécie de nova Alca (Área de Livre Comércio das Américas), inviabilizada justamente pelo Itamaraty no início do governo Lula.
A decisão de negociar um acordo de livre comércio com os Estados Unidos já foi tomada pelo Brasil. Na prática, significa uma ¨nova Alca¨ porque os americanos já têm tratados semelhantes com Chile, Peru, Colômbia e países da América Central. Faltam Mercosul, Equador e Venezuela.
Não bastassem as dificuldades de obter concessões da maior economia do planeta, caberá aos negociadores brasileiros convencer os sócios do Mercosul, atualmente Argentina, Paraguai, Uruguai e em breve também Venezuela, de que os novos acordos trarão mais benefícios que prejuízos.
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Não vai ser fácil nem rápido. Autoridades venezuelanas já adiantaram que não aceitam sequer negociar com os EUA.
Pelas regras atuais, é preciso haver consenso entre todos os países do Mercosul para assinar um acordo de livre comércio. Foi assim com Israel, que no início do ano encerrou as negociações e firmou o tratado. O texto não está em vigor.
Como a tarefa precisa começar pela vizinhança, o caminho é ainda mais delicado. Especialistas ouvidos pela Folha são unânimes em criticar o Mercosul e apontar deficiências no formato de negociações do bloco que dificultam consenso interno e tornam quase impossível a assinatura com outros países. O maior problema seria a enorme diferença de porte das economias do bloco.
O Brasil se prepara para negociar acordos com Estados Unidos, México, Índia, Turquia e Rússia. Também há interesse em blocos como a União Européia e o Conselho de Cooperação do Golfo (Arábia Saudita, Bahrein, Qatar, Emirados Árabes, Omã e Kuait).
Estratégias
Quando a Rodada Doha foi lançada, em novembro de 2001, ainda sob o impacto dos atentados de 11 de Setembro, a diplomacia brasileira apostou todas as fichas na negociação multilateral na OMC.
Os EUA optaram por negociar acordos bilaterais, o que chegou a irritar o Brasil quando as conversas com o Uruguai avançaram. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisou agir pessoalmente para convencer os uruguaios a continuar no Mercosul.
¨A estratégia do governo brasileiro de ficar só concentrado em Doha foi um grande equívoco. Temos que discutir uma nova estratégia¨, disse o ex-embaixador Rubens Barbosa. Segundo o ex-diplomata, ¨vai ser muito difícil negociar com os americanos, porque eles não vão querer apenas livre comércio, vão voltar com as exigências feitas na Alca, na área de propriedade intelectual, concorrência e investimentos.¨
Na contramão, o professor de relações internacionais da Universidade de Brasília Virgílio Arraes acredita que essas assimetrias no Mercosul podem favorecer o Brasil. ¨Não seria um problema tão complicado negociar com os EUA porque, em termos de indústria sofisticada, só temos o Brasil no Mercosul.¨
Para o presidente da Sobeet (Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais), Luis Afonso Lima, o Mercosul precisa ¨construir uma aliança que seja benéfica para todos os membros.¨