Comunidade tradicional quer debater ¨desmate evitado¨ 05/12/2008
- Giovana Girardi - Agência Estado
A eventual regulamentação de um mecanismo financeiro que possa render ganhos com o desmatamento evitado tem movimentado comunidades de povos tradicionais de florestas de várias partes do mundo, que pedem para participar do debate.
Índios e seringueiros do Brasil estão otimistas, achando que poderão lucrar se for feito algum pagamento por essa redução. Já povos dos demais países com cobertura amazônica prevêem um ¨desastre¨ se as emissões evitadas em florestas forem negociadas em um mercado de carbono. O temor é que, com a valorização do carbono florestal, as populações tradicionais acabem expulsas de suas terras por quem quer ganhar com esse novo comércio.
Esse medo é mais sentido nos países que, ao contrário do Brasil, não têm política de proteção de terras indígenas. Líderes florestais manifestaram, em um encontro em outubro em Barcelona (Espanha), acreditar que um mecanismo de redução das emissões por desmatamento (RED) pode acabar minando o direito à terra, que há anos vem sendo reivindicado em nações como os demais países amazônicos, a República Democrática do Congo e a Indonésia.
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¨Já estamos enfrentando uma pressão crescente por causa das mudanças climáticas, dos conservacionistas que querem nos impedir de usar nossas terras na floresta para fins econômicos e das empresas que detêm concessões governamentais para extrair minério, água e biocombustíveis das terras que são nossas há gerações¨, afirmou, no evento, Tony James, da Guiana, presidente da Associação dos Povos Ameríndios. ¨Cada vez mais se ouve falar a respeito do comércio de carbono, mas os povos indígenas não estão sendo incluídos nas discussões. Queremos saber: quem será o dono do carbono? Que impacto isso terá sobre nós?¨, questionou.
A situação no Brasil, único país do mundo que tem uma lei que garante aos povos indígenas a manutenção de suas terras - e que tem reservas de desenvolvimento sustentável para povos extrativistas -, é bastante diferente. Aqui eles consideram que um mercado de carbono ou o Fundo Amazônia podem ser revertidos em investimentos nos próprios povos.
¨Há anos já discutimos a necessidade de um sistema de beneficiamento, de um modelo de pagamento pelos serviços ambientais que prestamos¨, afirma Manoel Cunha, presidente do Conselho Nacional dos Seringueiros, que se apresenta em Poznan na semana que vem em um evento paralelo à conferência principal. ¨Vivemos da floresta, conservando essa floresta, por que não sermos recompensados por isso?¨
Ele acompanha o tema desde a COP em Bali e acredita que a inclusão de florestas no debate foi um avanço. ¨Pelo Protocolo de Kyoto, só recebe quem plantou (vendendo créditos por reflorestamento, por exemplo), mas não quem evitou o desmate. Conseguimos incluir e já foi um ganho. Em Poznan, queremos fortalecer as bases desse mecanismo. Ele vem ao encontro das nossas necessidades, é parecido com a gente.¨
Agora, se isso vai vir por meio de um mercado ou de um fundo, ele já não sabe. Só defende que o investimento seja vinculado à melhoria do processo produtivo dos extrativistas. ¨Se recebemos uma simples bolsa, pode incentivar um comodismo. Se investir na produção, ficaremos motivados a manter aquela atividade¨, diz.