Acordo Ortográfico é bom para leitores, diz gestor de Museu da Língua 02/01/2009
- Luisa Alcântara e Silva - Folha de S.Paulo
O escritor Frederico Barbosa, 47, considera a reforma ortográfica interessante, apesar de ter estranhado ao ver um texto seu recém-publicado com a palavra ¨estreia¨. Ele ocupa o cargo de diretor-executivo da Poiesis, organização social que administra o Museu da Língua Portuguesa, a Casa das Rosas e a Casa Guilherme de Almeida.
A adaptação à nova ortografia no museu deve ser concluída até o fim de 2010. Segundo o superintendente da instituição, Antonio Carlos Sartini, já no início deste ano os visitantes receberão um manual com as mudanças do Acordo.
Leia os principais trechos da entrevista de Barbosa à Folha de S.Paulo:
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O que o senhor acha do Acordo Ortográfico?
- Bom, ortografia é uma convenção, começa por aí. E sempre existem mudanças, já houve uma série delas. Acho que é interessante quando essas mudanças vêm para aproximar a língua. Acho importante que a escrita e a fala sejam razoavelmente conectadas, então, as mudanças que tendem a aproximar a escrita da fala me parecem ser bem interessantes. Eu só não concordo com a exclusão do trema.
Por quê?
- Porque é uma das poucas coisas lógicas da língua portuguesa. Trema é uma coisa que tem uma lógica clara, não há nenhuma dúvida sobre como você vai grafar uma palavra, com trema ou sem trema, e com a abolição disso eu não concordo.
Para os editores, será melhor?
- [Será melhor] Para os editores e para os leitores em geral, porque você não terá duas grafias diferenciadas. Isso eu acho muito interessante, para que não haja duas línguas ou três ou nove línguas portuguesas diferentes.
O sr. já passou pela reforma de 1971. Vai se adaptar a essa?
- Já escrevi alguns textos que foram publicados e, quando os vi no livro, estavam com a nova regra. Tinha ¨estreia¨, sem acento.
O senhor estranhou?
- Estranhei. Evidentemente existe um estranhamento, uma adaptação, até na lei não está errado escrever ¨ideia¨ com acento até 2012. Então, até 2012 eu estou coberto. Mas tem gente que tem mais dificuldade mesmo.
A de 1971 foi mais difícil que a de agora?
- É, acho que foi mais radical mesmo. O ¨êle¨, com acento, eu vi muita gente usando até muito tempo depois.
O sr. acredita que haja um interesse da população sobre o assunto?
- É interessante que se faça um esforço coletivo [para divulgar o Acordo]. O museu mais visitado hoje é o Museu da Língua Portuguesa. É impressionante, porque quando foi inaugurado as pessoas falavam: ¨Ai, museu da língua, ninguém vai querer saber¨. Sobre o Museu do Futebol ninguém fala isso, todo mundo acha que vai atrair multidões, e o Museu da Língua atrai mais gente.
É um preconceito das pessoas terem pensado isso na época da inauguração?
- Sim, claro que é. O que mostra claramente que as pessoas têm interesse na língua, têm interesse em aprender, têm interesse em entender a sua própria língua. Existe esse interesse, essa vontade das pessoas de entenderem a sua própria língua para melhorar a sua comunicação, e até essa consciência de que a língua é como roupa.
Como assim?
- Se você vai a uma entrevista de emprego e fala ¨nós vai fazer¨, acabou, né? Eu estou falando que a língua é como roupa no sentido de que é como você se apresenta. Então, eu acho importante isso, que as pessoas tenham cada vez mais consciência de que a língua que elas usam faz parte delas e é um cartão de apresentação. Então, posso estar enganado, mas acho que essa mudança ortográfica vai ser assimilada rapidamente. Talvez seja com maior facilidade do que a de 71, talvez porque seja menor, mas principalmente porque, hoje em dia, 38 anos depois, existe um maior interesse.
E nos seus livros, o senhor já vai entrar na nova regra ou vai deixar para a editora?
- Não, vou tentar, vou tentar escrever na nova regra.