Exportação do agronegócio deve recuar US$ 20 bilhões 12/01/2009
- Mauro Zafalon - Folha de S.Paulo
A balança comercial do agronegócio, que trouxe quase US$ 400 bilhões ao país nos últimos dez anos, perde força em 2009, contribuindo para a forte redução do saldo comercial, que recuará para próximo de zero.
A queda nas exportações do agronegócio deve chegar a US$ 20 bilhões, levando-as a um patamar próximo de US$ 50 bilhões, apontam projeções.
Um dos motores da economia brasileira e um dos responsáveis pela enxurrada de dólares no mercado interno nos últimos anos, o agronegócio se defrontará com demanda e preços internacionais menores devido à crise financeira.
As consequências serão drásticas. O saldo de toda a balança comercial do país, de US$ 24,7 bilhões em 2008, deverá ficar entre zero e US$ 5 bilhões neste ano, segundo Victor Abou Nehmi Filho, gerente da Sparta, administradora de fundos de investimento.
PUBLICIDADE
As exportações do agronegócio em 2008, que fecharam em US$ 71,9 bilhões (recorde), devem recuar para US$ 52 bilhões. A queda vai mexer ainda mais com o humor da economia. A menor entrada de dólares eleva a pressão sobre o valor da moeda, que poderá atingir R$ 3 neste ano, diz Nehmi.
O país não perde apenas os dólares das exportações, mas também o de investidores. Mesmo com a taxa de juros hoje acima de 13%, os investidores externos vão se retrair.
A taxa de juros, embora elevada, pode não compensar no momento em que o investidor sair do país. A depreciação do real fará o investidor obter menos dólares quando fizer a conversão da moeda nacional.
Nehmi acredita que o saldo entre exportações e importações do agronegócio brasileiro recue para US$ 43 bilhões neste ano -a primeira queda após dez anos de alta. Em 2008, o saldo foi de US$ 60 bilhões.
Fernando Muraro, da Agência Rural, diz que ¨2009 será um período difícil¨. O mercado internacional está retraído e as vendas externas serão ainda mais complicadas devido à falta de crédito para os negócios.
Segundo ele, o mesmo agronegócio que ajudou o dólar a recuar para R$ 1,55 em 2008 agora deverá empurrar a moeda norte-americana para cima.
Leonardo Sologuren, da consultoria Céleres, diz que ¨a grande dúvida está nos preços, que continuam oscilando bastante. Neste cenário de crise, dificilmente vamos ter resultado de preço como o de 2008¨.
As receitas em dólares com as exportações devem recuar ao menos 20% e só o complexo soja, líder nas exportações no setor, perderá 30%, afirma.
Não são apenas os preços que trazem indefinição para as exportações do agronegócio, mas também a demanda, que ainda está um pouco confusa, na avaliação de Sologuren.
¨Continuamos com uma demanda que pode se dizer ¨forte¨, pois não houve redução generalizada no consumo de alimentos, mas muito provavelmente teremos um fluxo mais lento, devido à falta de crédito.¨
Apesar do cenário difícil, o Brasil ainda leva vantagem sobre países que estão com moeda mais forte, como os EUA, segundo o analista da Céleres. ¨Essa vantagem, no entanto, está limitada à expectativa de crescimento, que já mudou. Falava-se em 4% para este ano, e, agora, as projeções mais otimistas indicam de 1,6% a 1,7% de crescimento global¨, diz.
Nehmi adverte, ainda, que essa contração do comércio mundial vai levar a um aumento do protecionismo. ¨Com a queda de consumo, começa-se a dar preferência para o produtor nacional na tentativa de proteção do emprego local. [...] Os importadores aproveitarão para impor novas barreiras.¨
Produtor
Demanda e preços menores no mercado externo poderiam bater direto no bolso do produtor, que estaria exportando menos e recebendo menos dólares. Mas esse conceito não vale para os chamados produtos dolarizados: soja, algodão, café.
A queda nos preços internacionais pode ser compensada pela desvalorização do real na comparação com o dólar. Exportam menos, mas recebem mais reais pelo produto.
Não é o que pensa o analista José Pitoli. ¨A valorização do dólar não muda muito a renda do produtor, já que muitos dos custos agrícolas continuam atrelados ao dólar.¨ Diante desse cenário, ele recomenda que o produtor avalie bem o plantio deste ano, ¨que deve ser feito com segurança e até com redução de área para que haja queda na oferta de grãos e recuperação de preços¨.
Sologuren concorda. A conversão cambial traz vantagem, mas é preciso verificar como vão ficar os custos. ¨É preciso analisar a rentabilidade¨, diz.
¨Nos preços atuais, as margens já são boas no mundo inteiro e não há motivo para crer que vai faltar grãos, ainda mais com as perspectivas de queda da demanda¨, acredita Nehmi.
Mas, para Muraro, nem todos os produtores se beneficiam do dólar forte. ¨A elevação de renda é boa para quem não tem dívidas em dólares, como os produtores do Sul. No cerrado, a situação é outra, e a renda maior não paga as dívidas.¨