Projeto adia prescrição de crime de pedofilia 28/06/2009
- Johanna Nublat - Folha de S.Paulo
Joanna Maranhão pode virar o nome de uma lei que pretende reduzir a impunidade de quem abusa sexualmente de crianças e adolescentes. A nadadora virou símbolo do limite da Justiça na punição de abusadores após ter dito, no ano passado, que foi abusada por um técnico quando tinha nove anos.
São hoje duas as restrições aos adultos que querem processar seus abusadores de infância: a prescrição do crime (o fato deixa de ser punível) e a decadência (o direito de ação contra o abusador deixa de existir).
É sobre o primeiro limite que quer agir um projeto de lei apresentado pela CPI da Pedofilia no Senado. Pela proposta, o prazo de prescrição de crimes contra a liberdade sexual de crianças e adolescentes (estupro e atentado violento ao pudor, basicamente) passaria a contar do momento em que a pessoa faz 18 anos.
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A medida quer dar mais chance para o adulto abusado quando criança poder ele mesmo acionar a Justiça, sem depender dos pais, que, muitas vezes, estão envolvidos ou querem esconder o que se passou.
Segundo levantamento do Hospital Pérola Byington, referência para vítimas sexuais, 50% das vítimas atendidas em 2008 tinham menos de 12 anos. E a maior parte dos agressores é pai, padrasto, tio, primo ou avô, segundo Ana Cristina Amaral Moura, do Instituto Sedes Sapientiae, que acompanha crianças por convênio com a Prefeitura de São Paulo.
A alteração proposta pela CPI evitaria a prescrição retroativa, quando o culpado pelo crime deixa de cumprir a pena dada porque já passou muito tempo do fato ocorrido até a pena recebida. Um exemplo: uma criança abusada pelo vizinho aos sete anos decide, aos 18, denunciar o caso. Aos 22, consegue a decisão favorável. Se a pena for mínima (réu primário, sem antecedentes), de seis anos, o crime estaria prescrito 12 anos depois do fato, ou seja, quando a pessoa tinha 19 anos.
Assim, o acusado não é punido, diz André Estevão Ubaldino, procurador do Ministério Público de Minas Gerais. Ele é formulador do projeto, feito com o senador Magno Malta (PR-ES), presidente da CPI. E dar pena mínima é o comum na Justiça brasileira, diz o advogado Roberto Delmanto Jr.
Na vigência da nova lei, o crime prescreveria 12 anos depois de a criança completar 18 anos, levando o abusador à cadeia.
"O que me preocupa é uma criança de pouca idade que quer agir, mas não pode. Quando ela tem direito de agir por conta própria, o crime está prescrito", diz Ubaldino.
Provas
A outra limitação frente à Justiça é a decadência, que dá o prazo de seis meses após a pessoa completar 18 anos para acionar a Justiça contra o agressor. Após esse prazo, mesmo que não prescrito o crime, a ação não seria possível. Ubaldino diz que não mudou a questão porque recebeu sinalização do Ministério da Justiça de que não seria uma alteração aceita.
Mas a decadência não existe se o abuso foi cometido por pai, mãe, madrasta, padrasto e tutor. Nesses casos, o projeto teria mais alcance, permitindo que a vítima buscasse a Justiça com até quase 40 anos. Hoje, abusada aos cinco, por exemplo, tem até os 25 para iniciar ação.
Provar o crime tantos anos depois pode ser um problema, apontam especialistas. Mas provas em crimes como esses já são difíceis, mesmo em curto espaço de tempo, diz a advogada Thaís Dumet Faria. "Como você prova que alguém ficava se masturbando na frente da criança? Não acho que é o tempo que vai fazer com que isso seja frágil, porque já é."
É comum, dizem especialistas consultados, que os abusados tomem consciência do que ocorreu apenas com a idade, quando já não podem mais agir. "Elas têm maior consciência da gravidade do delito quando se tornam maiores de idade", diz o promotor Tomás Ramadan, do Ministério Público paulista.