Sobrepreço é falha mais recorrente em obras do PAC 16/11/2009
- Andréa Michael e Andreza Matais - Folha de S.Paulo
Somente duas das 14 obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) nas quais o TCU (Tribunal de Contas da União) detectou irregularidades foram paradas por determinação do órgão. Seis estão paralisadas, mas por outros motivos. As demais encontram-se em execução, em ritmo lento.
Um ponto recorrente entre as irregularidades encontradas nas fiscalizações do TCU é o sobrepreço, presente em quase um terço das 14 obras. Total apurado: R$ 652,88 milhões, o suficiente para bancar metade de um mês do Bolsa Família, o maior programa social do país.
O valor pode ser maior, pois em alguns casos a auditoria é feita por amostragem.
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Em regra, as irregularidades detectadas pelo tribunal não são novidade. O problema é que ficam anos sem ser resolvidas. Exemplo é a ponte sobre o rio Madeira, em Porto Velho, para a qual já havia um projeto básico em 2002. Na ocasião, o TCU identificou as primeiras irregularidades no empreendimento.
A ponte, porém, continua no papel. Deu sinais de que decolaria em 2008, quando o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte) lançou o edital da obra. O TCU apontou sobrepreço de R$ 39 milhões em um total de R$ 166 milhões. Neste ano, técnicos do tribunal e do Dnit discutiram termos de um novo projeto, mas em setembro o Dnit revogou o edital. Para o governo, contrato rescindido não pode ser considerado irregular.
Outra "obra de papel" que o governo coloca na conta do TCU é a construção de um sistema de irrigação em Santa Cruz (RN), com 9.236 hectares, na Chapada do Apodi. O contrato foi assinado em 2002. Fiscalizado dois anos depois, o TCU descobriu que faltava licença ambiental e condicionou o repasse de verbas à adoção de providências. A situação persiste até hoje, segundo o TCU. O governo diz que já apresentou as justificativas.
Entre as obras paradas por determinação do TCU está um trecho de 102 km da BR-265, na divisa entre Minas Gerais e Rio. Em 2007, quando o trabalho ia começar, uma fiscalização descobriu irregularidades, como falta de desapropriação de terras, para o que seria necessário investir, em dinheiro da época, R$ 27 milhões, além de sobrepreço no contrato.
A outra obra paralisada é composta por quatro contratos para conservação e restauração da BR-364, em Rondônia. As principais irregularidades, apontadas inicialmente em 2004, foram subcontratação e medição e pagamento de serviços não realizados. Neste caso, diz o TCU, "a paralisação é parcial e atinge só um subtrecho".
Com o pré-sal, as refinarias se tornaram prioridade para o governo. A Abreu e Lima, em construção em Pernambuco, caiu na malha fina do tribunal. Em 2008, por sobrepreço no contrato de terraplenagem. Em 2009, por irregularidades em diversos contratos.
Maiores contratos
Neste ano, o TCU selecionou dez contratos entre os mais expressivos firmados pela Petrobras, num total de R$ 15,6 bilhões. O trabalho está em fase preliminar, mas há, como informado pelo órgão à Folha, indícios de sobrepreço.
No caso da ampliação da refinaria Presidente Vargas, no Paraná, o TCU analisou 19 contratos, que somam R$ 8,6 bilhões, nos quais os técnicos apontaram um sobrepreço de R$ 39 milhões, classificaram as irregularidades como graves e recomendaram ao Congresso a suspensão de vários contratos. É uma decisão soberana da Comissão Mista de Orçamento.
Quando se trata de paralisação de obras, o caso da ampliação e modernização dos aeroportos de Vitória e Guarulhos é emblemático. Em ambos, os canteiros foram fechados pelos consórcios contratados, mediante licitação, depois de o TCU recomendar a retenção de percentuais do pagamento diante da constatação de irregularidades, como alterações de projeto e sobrepreço, calculado em R$ 70 milhões para o terminal paulista e R$ 176 milhões para o capixaba.
A Infraero negocia extrajudicialmente com os consórcios o valor a pagar pelo que restou construído. A empresa está proibida pelo TCU de pagar por este passivo, mas pode licitar de novo os empreendimentos.
Outro lado
A Casa Civil, que coordena o PAC, informou que o governo já apresentou ao TCU todas as justificativas de sua responsabilidade quanto às irregularidades apontadas.
Informou ainda que, atendendo ao TCU, cancelou contratos, além de novas licitações estarem em curso. Em alguns casos, diz a Casa Civil, os questionamentos são direcionamentos às empresas e não ao governo.
Em entrevista em outubro, a ministra Dilma Rousseff afirmou que o PAC tem 2.392 obras. Consideradas as de saneamento e habitação, o número vai para 16.651.
"O tribunal deu como tendo problema 15 obras, 0,09% do PAC. Não vamos chamar de fiasco o que não é." O número baixou para 14 porque uma das obras listadas pelo TCU --a construção da barragem Berizal, em Minas- foi excluída do PAC.
O Dnit informou que as determinações do tribunal estão sendo atendidas e, no caso de sobrepreço, haverá adequação de valores.
Por e-mail, a Petrobras afirmou que não há superfaturamento, sobrepreço ou qualquer irregularidade em suas obras. "O que se verifica nos casos apontados pelo TCU são formulações e interpretações divergentes das adotadas pela companhia."
Segundo a empresa, "em 95% dos casos, o TCU inicialmente apontou possíveis irregularidades, mas, ao fim da análise, concordou com os procedimentos adotados pela companhia".