Aumenta concentração de indústrias no setor de leite 01/12/2009
- Mauro Zafalon - Folha de S.Paulo
O setor de leite começa a seguir o caminho dos frigoríficos. Há uma consolidação maior da indústria por meio da concentração de empresas. Mais um passo foi dado na semana passada, quando a gaúcha Bom Gosto adquiriu a catarinense Laticínios Cedrense.
Quarta colocada no ranking nacional, a Bom Gosto passa a industrializar 1,2 bilhão de litros de leite por ano, segundo a empresa, atrás de Nestlé (2 bilhões), Perdigão (1,6 bilhão) e Itambé (1,3 bilhão).
As empresas estão se consolidando para a cadeia ficar mais forte, segundo Wilson Zanatta, diretor-presidente do laticínio gaúcho. "Faz parte do jogo, embora não seja fácil." Os laticínios chegam a essa concentração um pouco mais tarde do que os frigoríficos, mas esse é o caminho a ser seguido, diz ele.
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Para Rafael Ribeiro de Lima Filho, zootecnista e consultor da Scot Consultoria, a concentração já é um fato e uma tendência do agronegócio, tanto interna como externamente. "Ela dá mais poder de barganha para as empresas no mercado internacional."
Maria Helena Fagundes, da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), diz que a concentração já fica evidente até nas estatísticas.
Há cinco anos, as empresas com SIF (Serviço de Inspeção Federal) somavam 1.700. Hoje, estão perto de 1.500. Esses números mostram que há o desaparecimento das pequenas e médias, "mas as atuais são mais bem organizadas e com escala maior".
Mas não são apenas as pequenas empresas que diminuem suas atividades no mercado. Assim como ocorreu com os frigoríficos, muitos laticínios apostaram no setor antes da crise do ano passado, fazendo grandes investimentos. A falta de crédito e o enxugamento do mercado trouxeram dificuldades financeiras para muitos.
Um dos exemplos é a própria Bom Gosto, que, além da compra da semana passada, já havia adquirido uma unidade da Parmalat em Garanhuns (PE) no início do ano. Recentemente, adquiriu também a fábrica da Nestlé em Barra Mansa (RJ).
Investimento
Assim como ocorre com várias commodities, o Brasil também será um dos grandes participantes do mercado mundial de leite. Competitividade nos custos, área disponível e avanço na tecnologia vão colocar o país na rota do mercado internacional, segundo a analista da Conab. Um dos gargalos, no entanto, é a qualidade do leite.
O país ainda necessita investir mais em qualidade, concorda Aline Barrozo Ferro, do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP. Mas a concentração que vem ocorrendo eleva a qualidade do leite porque as grandes empresas passam a exigir matéria-prima melhor.
O setor de laticínios segue os passos dos frigoríficos também no avanço ao setor externo. A Bom Gosto, que pretende se fortalecer ainda mais com a abertura de capital, está a caminho do Uruguai, onde tem um projeto ousado de abertura de uma nova indústria. "Vamos aproveitar a qualidade e o reconhecimento deles no mercado externo", diz Zanatta.
Se a qualidade do produto nacional ainda não está nos padrões de todos os mercados importadores, o país pelo menos já avança no mercado externo. Com saldo positivo nas exportações nos últimos anos, 2009 não foi favorável. De janeiro a outubro último, o país obteve deficit de US$ 93 milhões, após superavit de US$ 253 milhões em igual período de 2008.
O retorno do deficit neste ano se deve, em parte, à crise financeira internacional. A queda do petróleo retirou renda da Venezuela, um dos principais mercados do Brasil. Países africanos, também afetados pela crise, compraram menos.
Em 2010 o cenário será outro, segundo analistas do setor. Para Fagundes, a recuperação externa dos preços é importante porque dá sustentação à renda dos produtores nacionais.
Já Lima Filho acredita na retomada maior das exportações. O consultor da Scot diz que o país tem de buscar novos mercados. Na sua avaliação, o país deveria buscar importadores também na América Central, na Ásia e no Oriente Médio.
Ele alerta, no entanto para dois pontos imprescindíveis dessa abertura e sustentação de novos mercados: qualidade e oferta contínua de produtos. O efeito sazonal --safra e entressafra -- ainda afeta o comportamento do mercado brasileiro.