Brasileiros temem que moratória em Dubai agrave situação de trabalhadores imigrantes 02/12/2009
- BBC
Brasileiros que vivem nos Emirados Árabes Unidos disseram temer que o anúncio de moratória em Dubai, na semana passada, agrave ainda mais a já precária situação de trabalhadores imigrantes. Segundo brasileiros ouvidos pela BBC Brasil, a situação nos emirados - especialmente em Dubai - vinha deteriorando desde 2008 devido à crise econômica mundial, com cancelamento de projetos e perda de frentes de trabalho.
"De repente, tudo começou a mudar, os grandes projetos pararam, e outros tiveram o ritmo de construção reduzido. A sensação ficou estranha, parecia o fim do sonho e da euforia de se ganhar dinheiro de forma rápida", explicou o promotor de eventos e guia turístico João Elton Bezerra Nascimento.
Natural do Ceará, Nascimento chegou a Dubai na metade de 2006, atraído pelos sonhos de ofertas de trabalho abundantes para estrangeiros e o "dinheiro rápido".
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"Desde que começou a crise no ano passado, as coisas em Dubai mudaram bastante. Como trabalho no setor de turismo eu vi uma queda significativa no número de turistas, principalmente na metade deste ano", afirmou ele, dizendo que em seu setor o pior já passou e que continuará na cidade apesar da crise.
Efeitos
Dubai é um dos sete emirados que formam os Emirados Árabes Unidos e se tornou um importante polo turístico e comercial com ambições internacionais. A cidade ganhou fama graças à construção de suntuosos hotéis de luxo e um badalado condomínio erguido sobre uma ilha artificial em forma de uma palmeira.
"As pessoas aqui não juntavam dinheiro, gastavam tudo que ganhavam. Com a crise, elas se viram sem reservas, e sem dinheiro para manter o estilo de vida e pagar as contas. Muitas tiveram que ir embora, inclusive alguns brasileiros", completou Nascimento.
O administrador de empresas Fabrício do Nascimento Senna Martins, natural de Brasília, também relatou que a vida em Dubai não é mais a mesma de quando chegou, em 2005.
Apesar de morar em Abu Dhabi, ele trabalha numa empresa de alimentos brasileira em Dubai e disse que houve uma acentuada diminuição de trabalhadores estrangeiros no emirado.
"Os sinais são bem visíveis. O trânsito está menos intenso, o ar menos poluído. Os efeitos da crise foram bem perceptíveis no dia-a-dia de Dubai", disse Martins.
"Vários planos de expansão da minha empresa foram adiados, assim como promoções e aumento de salários. Mas, apesar dos cortes no orçamento, não houve demissão local", explicou ele.
A gaúcha Débora Munaretti também chegou a Dubai, em 2005, atraída pela ofertas de trabalho e oportunidades no setor de exportação e importação de frangos congelados do Brasil e Estados Unidos.
Ela explicou que o setor em que trabalha foi bem afetado pela crise e que muitos frigoríficos menores tiveram que fechar as portas ou diminuir os turnos.
"Na minha área de alimentos, a demanda diminuiu consideravelmente. As pessoas começaram a optar por produtos mais em conta e não mais pela qualidade ou marca".
"O desemprego já vem de algum tempo, e muitos brasileiros já deixaram Dubai em função da crise do ano passado. Não sei o que poderá acontecer com esta última da semana passada", enfatizou ela, que é natural de Porto Alegre.
Nova crise
As dificuldades econômicas se agravaram na semana passada quando a Dubai World, responsável pela vasta expansão imobiliária de Dubai, anunciou que atrasará o pagamento de suas dívidas, avaliadas em US$ 58 bilhões.
A ameaça de calote sacudiu os mercados internacionais, que ainda estão tentando se recuperar da crise global financeira iniciada com a crise de crédito do mercado imobiliário americano, em setembro de 2008.
Apesar das incertezas que cercam Dubai, Fabrício Martins não pensa em sair do país.
"Imagino que no curto prazo apenas os setores bancário e de construção serão afetados. Preciso aguardar o desenvolvimento dos fatos para avaliar se outros setores da economia local também serão afetados", disse.
Abu Dhabi
Visto como seu "irmão mais forte", o emirado de Abu Dhabi vinha socorrendo e injetando dinheiro em Dubai para não afetar a economia de todo o país.
Segundo o brasileiro Francisco Pereira Rocha Neto, que é diretor-geral de uma empresa de materiais de construção, a situação em Dubai sempre foi mais delicada que de Abu Dhabi.
"Desde de que a crise começou a se instalar em Dubai, o fluxo de pessoas mudando para Abu Dhabi aumentou muito, e foi facilmente perceptível no trânsito e no mercado imobiliário, que se aqueceu ainda mais", explicou.
Ele enfatizou que a situação de Abu Dhabi é de maior segurança se comparada a Dubai.
"Eles querem fugir da dependência do petróleo como única fonte de renda, atraindo investimentos e investidores do mundo todo", afirmou.
Neto acredita que Abu Dhabi sempre foi muito crítica pela forma como os negócios em Dubai estavam sendo conduzidos.
"Abu Dhabi, ao contrário de Dubai, produz os próprios recursos. E isso garante uma economia mais sólida. Aqueles que fugiram de Dubai tentaram vir a Abu Dhabi. Alguns tiveram a sorte, outros não e retornaram a seus países", disse.
O carioca Carlos Alberto dos Santos está há oito anos em Abu Dhabi, onde treina a o Exército local, membros da família real e outros estudantes no jiu-jitsu brasileiro. Para ele, não há crise perceptível em Abu Dhabi, pois o emirado seria muito mais forte que Dubai.
"Desde que cheguei aqui só realizei meu projetos. A minha área de esporte e educação cresce cada vez mais", afirmou.
Ele notou que houve desaceleração no ritmo das construções, mas acha que tudo voltará ao ritmo de antes, pois os negócios em Abu Dhabi "sempre foram feitos com pés no chão".
"Os únicos brasileiros que eu conheço e que foram demitidos por causa da crise foram aqueles de Dubai", enfatizou Santos.