"Maracanazo" social é o maior risco da Copa-2014, diz historiador 12/07/2010
- Carolina Araújo - Folha de S.Paulo
O que aconteceria com o Brasil se, em 2014, ocorresse uma reedição do "Maracanazo" de 1950, e a seleção voltasse a fracassar em casa?
Para Hilário Franco Júnior, professor da pós-graduação em história social da USP e autor de "A Dança dos Deuses - Futebol, Sociedade, Cultura", quase nada mudaria.
O historiador diz que o maior risco que o país corre não é uma derrota esportiva em 2014, mas a falta de mudanças estruturais durante a preparação para o próximo Mundial.
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Há pontos em comum entre a preparação para a Copa de 1950 e de 2014?
- A comparação entre os dois momentos históricos é inevitável e útil, mas não pode ser levada muito longe. Nem o país nem o futebol e, menos ainda, o mundo são os mesmos. Mas há pontos comuns inegáveis e preocupantes. Planejamento e abundância de recursos não caracterizam nem aquela época nem agora. A agenda política facilita os oportunismos, com dois meses e meio separando o fim da Copa e as eleições presidenciais e estaduais, tanto em 1950 como em 2014. E a população, nos dois momentos, considera a vitória esportiva inevitável e obrigatória.
Que consequências um revés em 2014 pode trazer para o Brasil? Como foi em 1950?
- O Brasil de 1950 pesava pouco no mundo em termos políticos, econômicos e futebolísticos. Então, a derrota externamente não mudou nada. Internamente, o gigante de pés de barro que caíra, em casa, diante do nanico vizinho reforçou aquilo que Nelson Rodrigues chamaria de "complexo de vira-latas". Mas, considerando os dados de Copas recentes, parece que, se a vitória de um país estimula o consumo interno e mesmo a produtividade, a derrota não altera muita coisa. O eventual 'Maracanazo' de 2014 que deve preocupar não é tanto esportivo, mas social. Vamos aproveitar a chance para fazer as obras de infraestrutura necessárias? Vamos conseguir evitar o desvio de dinheiro público? Vamos controlar a violência com a vinda de centenas de milhares de estrangeiros?
Apesar do intervalo de seis décadas entre as duas Copas, os desafios são os mesmos?
- Ainda não foi entre 1950 e 2014 que conseguimos mudar nosso modo de ser coletivo baseado no improviso, no jeitinho, nas meias soluções de última hora. Nosso desafio é comportamental. Não conseguimos ou não queremos antecipar um problema. Só vamos pensar nele quando estiver grande, e a solução for mais difícil ou cara. Nos anos 50 e 60, o slogan de São Paulo era "a cidade que mais cresce no mundo", mas o que se fez para acompanhar esse crescimento? O metrô ou o Rodoanel não deveriam ser obras de hoje, mas de décadas atrás. Não era preciso ter uma Copa para diagnosticar que nossos aeroportos são insuficientes e obsoletos.
Falta mobilização no país para a Copa de 2014? Houve essa mobilização em 1950?
- Raramente ocorre mobilização nacional, em qualquer país, na fase de preparativos. As decisões são, ou deveriam ser, técnicas, logísticas, econômicas, políticas. Os maiores debates se dão entre grupos de interesse, como ocorreu na construção do Maracanã. Também não vejo a Copa-2014 criando grande frisson muito antes de começar, a não ser na Copa das Confederações, em 2013. Até lá, as questões serão sobre o estádio paulistano, a reforma do Maracanã e o andamento das obras de infraestrutura.