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TEMA LIVRE : Ronaldo de Castro
Dos abusos e absurdos da cleptocracia nacional
03/07/2001- Ronaldo de Castro*
Cleptocracia nacional, sim, porque a compulsão mórbida à pecúnia ilícita, fácil e rápida não mais está adstrita à superestrutura político-administrativa, desceu ao plano mais baixo de doença social contagiante, metastática, sistêmica, contagiante do todos os estratos sócio-econômicos da população, nas classes A, B, C, D e por aí afora, até à Z.
A diferença está em que dirigentes e membros mais chegados e preeminentes dos poderes formais constituídos praticam a pilhagem direta e impune nos cofres públicos como fiéis sacerdotes da corrupção pública explícita, declarada, enquanto a corrupção social entre a população é a do roubo puro e simples mesmo,em carne viva e na marra, do cidadão contra o cidadão, praticado contra o próximo mais próximo e terminando, na ponta terminal do processo de corrosão moral coletiva, na explosão da violência urbana com a onda avassaladora de assaltos, latrocínios, tráfico de armas e drogas, prostituição infanto-juvenil, sequestros, estupros e outras quizumbas do gênero (l).
Esta, a cleptocracia nacional, a realidade objetiva neste país e a violência urbana é o retrato mais evidente e grave da insidiosa doença, representando de fato a projeção, no seio popular, do poder cleptocrático superior instalado oficialmente em Brasília, antes de, com e sem FHC no trono. Mais agora com FHC, claro, chefe supremo do poder tucanocrático, isto é, dessa merda que aí está.
A cleptocracia brasileira, reconheça-se, não é cancro patognomônico produzido em isolado pelo sistema de poder político interno, qual Aids burocrática diferente, própria, exclusiva do Brasil; antes, é o reflexo no Brasil de uma epidemia mundial gerada pelas relações econômicas capitalistas de produção e distribuição (má) de riquezas, em que a minoria pecuniosa e empanturrada escraviza e explora a maioria excluída e faminta.
Ampliada e em ponto maior, a equação é a mesma nas relações econômicas entre os países ricos e os menos ou mais pobres, com a exploração e a escravização destes últimos por aqueles.
Capitalismo é isso aí, com a exploração interna do homem pelo homem nos diferentes países resumindo a exploração maior do capitalismo monopolista e financeiro entre as nações.
O objetivo único é o lucro extraído a todo custo da “mais valia”, pecúlio que é a institucionalização do roubo legalizado entre homens e nações.
Hoje, vende a mídia esportulada pelo primeiro poder (o Econômico), como também pelos poderes constituídos pelo primeiro (o segundo poder, o Executivo; o terceiro, o Legislativo; e o guarto, o Judiciário), a bazófia de que o capitalismo internacional atingiu o ponto apogístico, quando a realidade objetiva mostra vive o sistema exatamente o contrário, curtindo a fase terminal de esgotamento, pelo que o frenesi de corrupção e consumo no mundo atual nada mais é que a cerimônia de “rapa tacho” comum em todo fim de ciclo, com o surripiamento dos bens do defunto iminente.
Neste contexto, tudo bem, né? Ou em outras palavras: tudo é essa merda global intoxicante nos países e no planeta como um todo. E se o que interessa é resistir para mudar, pois, a partir do momento em que os países do primeiro mundo (Estados Unidos e Alemanha, por exemplo) explorarem menos ou não tiverem nações mais fracas para explorar ou roubar (Equador, Bangladesh, Mongólia e Zâmbia, por exemplo), então eclodirá a grande mudança com a humanização da economia em substituição à economia de guerra própria do capitalismo.
No respeitante ao Brasil, se a hora é a de resistir para mudar, o crime maior do atual governo é o de lesa-pátria, com a entrega gratuita do patrimônio estratégico nacional ao capital especulativo internacional.
A política de privatização de empresas e bancos, estatais e privadas, nos moldes como vem sendo implementada, é o Brasil se oferecendo e se entregando de graça ao capital financeiro externo, numa posição ancilar que pederastiza e envergonha a nação aos olhos da comunidade internacional.
Sob a égide do neoliberalismo e da globalização, temos um governo de traição nacional gratuita colocando o povo de joelhos diante dos interesses absurdos e abusivos do capitalismo internacional, quando globalizar não é o que se faz e nem como se faz.
Globalizar é a incorporação natural do progresso científico e tecnológico nas relações econômicas internacionais, o que representa um novo “meio” e não um “fim” em si, fazendo-se hoje com os recursos eletrônicos da modernidade, via lnternet, o mesmo que antes se fazia através de longos percursos navais entre os continentes durante o regime feudal e no período relativamen-te duradouro de estratificação do sistema capitalista de produção, ou seja, a exploração do homem pelo homem e dos países entre si.
No caso brasileiro, o irônico é ter sido institucionalizada na prática a cleptocracia sob FHC, um homem que assumiu o poder supremo com um discurso moderno, democrático, nacionalista, ele e o seu hoje embosteado PSDB, para fazer exatamente o contrário sob a bandeira pífia, por falsa, do neoliberalismo e da globalização. É tudo quanto de-le o povo não podia esperar, logo ele, um homem com verniz (escrevemos “verniz”, heim!)de intelectual, probidade, competência.
Mas era só verniz mesmo, que o conteúdo e a substância não prestam, para arrepio e horror da “intelligentsia”.
Com efeito, lamentável e condenável é a clara situação do governo de Fernando Henrique Apagão Cardoso como agente direto ou participante subsidiário nas grandes operações de corrupção política neste país, ci-tando-se apenas como referencial, por mais óbvios, os ca-sos da “merenda” a deputados e senadores para aprovação da lei autorizativa da reeleição, da concessão de verbas orçamentárias individualizadas a senadores e deputados, da locupletação do juiz Lalau, da violação do painel eletrônico do Senado, dos escrunchos na Sudam e Sudene e, mais recente, a condução ao cleptômano de carteirinha Gilberto Mestrinno (talvez o único cassado pelo estratocrata Castelo Branco por crime de ladroagem pública) à presidência do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal.
E não há duvidar estejam metidos até o gogó, no peculato e estrepolias do gênero, o governo e o partido do governo FHC, um tal PSDB.
Uma nojeira!
Para terminar, um esclarecimento pertinente e necessário. A cleptocracia instalada é real e transparente, mas tem gue conviver com outra realidade (esta, providencial), possuidora de poder intrínseco para tirar o Brasil do fundo do poço.
Explicitando com detalhes: apontamos no início ser a cleptocracia doença endêmica, sistêmica, epidêmica, contaminando todos os estratos sócio-econômicos da população.
Continuamos a dizê-lo, ma esclarecendo que NÃO afirmamos ter a peste moral contaminado todos os elementos e pessoas dos diversos eestratos da sociedade. Porque a maioria da população brasileira, felizmente, ainda é constituída de pessoas pobres, sim, mas fundamentalmente simples, boas, honestas, humanas, solidárias, de bons sentimentos, portanto impermeáveis à corrupção geral e irrestrita e à violência geradas a partir do Planalto.
Essa maioria instintiva e intuitiva, com o respaldo intelectual e científico da “intelligentsia”, possui em silêncio uma concepção socialista do mundo, humana, solidária, com o homem amparando o homem, base material a respaldar e fortalecer o homem na grande escalada rumo à consciência cósmica.
Essa maioria pobre e boa representa a reserva moral e espiritual da nação, é o poderoso aríete a ser utilizado na construção do Brasil novo, humano, com justiça social, solidarismo, respeitoso à natureza ambiente. Saberá fazê-lo.
Eis aí a luz no fundo do túnel. A única.
Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo.
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(1) A Polícia nada tem a ver com a causa real do surgimento e expansão da violência urbana, até porque também é vítima na condição de componente da sociedade global afetada e seria impotente para coibir ou extirpar o mal e o mais lógico seria também roubar ou deixar que roubem, fazendo apenas de conta quando combate o crime organizado e o esporádico. E ainda querem mais? Prender bandido até que prende, desde não seja rico nem ocupante de altos postos nos poderes públicos. Afinal, cadeia foi feita pra pobre, que não é gente na ótica ao regime capitalista. Pobre e preto.
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*Ronaldo de Arruda Castro é jornalista, poeta e membro da Academia Mato-grossense de Letras.
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