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TEMA LIVRE : Antonio de Souza
O jornalismo e as eleições
04/05/2008
Entre os formadores de opinião, Carlos Alberto Di Franco é um desses sujeitos cujo currículo dispensa comentário. Senão vejamos: é diretor do Master em Jornalismo para Editores, professor de Ética Jornalística e doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra (Espanha) e ainda dá consultoria em Estratégia de Mídia.
Seus artigos, publicados no jornal “O Estado de S. Paulo”, são leitura obrigatória para estudantes e profissionais da Comunicação, mas também são lidos por quem se interessa pelo cotidiano da mídia.
Chamou atenção o artigo “Jornalismo em ano eleitoral”, que Di Franco publicou no jornal paulista, em abril. Em resumo, é um alerta sobre a necessidade de uma reflexão acerca do papel da mídia na cobertura eleitoral. O mestre dedica um trecho especial do seu artigo ao marketing, que, pela sua ótica, muitas vezes, é utilizado (e muito bem pago) apenas para satisfazer desejos pirotécnicos de candidatos, nos já notórios shows de efeitos especiais que iludem os incautos.
A seguir, alguns fragmentos do artigo do professor Di Franco que julgo extremamente importantes para uma reflexão de nossa parte:
- Ano eleitoral. Campanhas milionárias, promessas irrealizáveis e imagens produzidas: é o marketing de candidatos. Assistiremos, diariamente, a um show de efeitos especiais capazes de seduzir o grande público, mas vazio de conteúdo e carente de seriedade;
- O marketing, ferramenta importante para a transmissão da verdade, pode, infelizmente, ser transformado em instrumento de mistificação;
- Os programas eleitorais vendem uma bela embalagem, mas, de fato, são paupérrimos na discussão das idéias. Nós, jornalistas, somos (ou deveríamos ser) o contraponto a essa tendência.
Cabe-nos a missão de rasgar a embalagem e desnudar os candidatos;
- Uma cobertura de qualidade será uma questão de foco. É preciso declarar guerra ao jornalismo declaratório e assumir, efetivamente, a agenda do cidadão. Não basta um painel dos candidatos, mas é preciso cobrir a fundo as questões que influenciam o dia-a-dia das pessoas. É importante fixar a atenção não nos marqueteiros e em suas estratégias de imagem, mas na consistência dos programas de Governo;
- É necessário resgatar o inventário das promessas e cobrar coerência. O drama das cidades não pode ficar refém de slogans populistas e de receitas irrealizáveis;
- O centro do debate tem de ser o cidadão, as políticas públicas, não mais o político, tampouco a própria Imprensa.
- Precisamos fugir do espetáculo e fazer a opção pela informação. Com equilíbrio e didatismo, separa-se notícia do lixo declaratório;
- Atores políticos não medirão esforços para fazer com que a mídia, à sua revelia, destile veneno nos seus adversários. É preciso combater o vírus da leviandade, revalorizando perguntas como: Checou? Tem provas? A quem interessa essa informação?;
- O leitor espera uma imprensa combativa, disposta a exercer o seu intransferível dever de denúncia; quer um quadro claro, que lhe permita formar um perfil dos candidatos: antecedentes, evolução patrimonial, desempenho em cargos atuais e anteriores etc.;
- Impõe-se um bom levantamento das promessas de campanha. É preciso mostrar eventuais descompassos entre o discurso e a realidade;
- Os políticos, pródigos em soluções de palanque, não perdem o sono com o rotineiro descumprimento da palavra empenhada. Para muitos, a política é a arte do engodo. E contam com a amnésia coletiva;
- O jornalismo de qualidade deve assumir o papel de memória da cidadania. Precisamos falar dos planos e do futuro. Mas devemos também falar do passado, das coerências e das ambigüidades;
- Transparência nos negócios públicos, ética, qualificação e competência são as principais demandas da sociedade. E também as pautas de uma boa cobertura eleitoral. Deixemos de lado a pirotecnia do marketing e não nos deixemos aprisionar pelas necessárias pesquisas eleitorais.
O tratado do mestre Di Franco vem bem a propósito do momento político-eleitoral em Mato Grosso. Claro que o leitor-eleitor quer um jornalismo de serviços. Mas, será que isso é possível diante de um quadro em que grande parte dos jornalistas é engajada (inclusive, toma publicamente as dores de certos políticos), outros fornecem opiniões e alguns marqueteiros acham que são professores de Deus, enquanto outros têm absoluta certeza disso?
...
*Antonio de Souza é jornalista em Cuiabá/MT
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Comentários dos Leitores
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Comentário de Montezuma Cruz (montezuma@agenciaamazonia.com.br) Em 06/05/2008, 07h07 |
DIFÍCIL, HEM? |
Estimado Antonio: você já deu a resposta no final do artigo, ou seja, não será fácil fazer o jornalismo dos sonhos num território minado por assessores. E as consultorias estão cada vez mais organizadas, atuantes e prósperas ($$$), meu. Traduzindo: dinheiro no caixa, repórter na rua e texto sob autocensura. Seria diferente em outras épocas neste rico Mato Grosso? Óbvio que não. Quanto ao "Mestre Di Franco", representante da Opus Dei em algumas redações de diários neste País, ele também tem os mais altos interesses em ser moralista e vestal. Não é, propriamente, o símbolo da lisura e do professor. Gerações mais novas, no entanto, crêem nele como se fosse o salvador da pátria da profissão. Nunca foi, nem será. Representa, sim, o poder de parte da Igreja Católica no jornalismo brasileiro. Algo que os bem informados estão cansados de saber. Saúde e paz,camarada. |
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