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TEMA LIVRE : Antonio de Souza
Professores de Deus
23/09/2008
Faltando pouco menos de 15 dias para alguns políticos acertarem as contas com o eleitorado, a expectativa, para não fugir à velha regra, é de que “vencerá o melhor”. Pura mesmice. Como, de resto, em nada se alteram as campanhas eleitorais: os marqueteiros são sempre os mesmos, os candidatos idem (com as raríssimas exceções) e as promessas também – na verdade, estas mudaram de nome: agora, são “compromissos”.
Fazer jornalismo de campanha eleitoral é uma aventura, da qual se sai convencido de que não adiantam fantasias, jogos de cenas e, até mesmo, mentiras para tentar engabelar os eleitores. No final, o resultado, para melhor ou para pior, sempre depende do próprio candidato. Particularmente, considero o marketing eleitoral apenas um detalhe, ainda mais se exercido por indivíduos dados ao estrelismo, à arrogância e até à molecagem.
Há situações em que os candidatos são bons, têm projetos, são sérios. Seus marqueteiros é que carecem de seriedade. São, isto sim, aproveitadores que agarram com as mãos e os pés as chances de ganhar rios de dinheiro, cuja origem, na maioria dos casos, é indefinida. Ou suspeita. Eu arrisco afirmar que, em algumas situações, os candidatos são bons; seus marqueteiros é que são ruins. Na eleição para prefeito de Cuiabá, a bem da verdade, impera o amadorismo na maioria das equipes daquilo que se convenciona classificar de “marketing político”.
Quem vive no meio sabe muito bem que, no contexto das atuais eleições municipais na Capital, o marketing, em alguns aspectos, é apenas figuração. O prefeito Wilson Santos (PSDB), por exemplo, é quem faz o seu próprio marketing, mas paga rios de dinheiro para assessores que já deram mostras de incompetência em eleições passadas. O deputado cassado Walter Rabello (PP), além de ser ruim de serviço, é vitima do próprio marketing, também custeado a peso de ouro, mas feito por profissionais extremamente superados. Mauro Mendes (PP) cresce nas pesquisas pelos seus próprios méritos: ele também faz o seu próprio marketing, embora pague regiamente uma equipe, cuja maioria dos integrantes, ao que consta, segue as normas ditadas pelo Palácio Paiaguás, em especial, pela primeira-dama Terezinha Maggi. O deputado federal Valtenir Pereira (PSB) e o Procurador Mauro (PSol) dispensam comentários.
A mídia em geral também exerce um papel muito importante nesse processo, desde que faça com isenção a cobertura dos fatos. O que, lamentavelmente, não se observa em grande parte dos veículos de Comunicação da Capital. Os interesses financeiros vão muito além dos compromissos com os leitores/eleitores. Isso explica por que determinado candidato obtém privilégios e ganha muito mais espaço no noticiário específico em alguns veículos. É acintoso, mas nem a Justiça Eleitoral tem sido competente para fazer valer a legislação específica.
Um mês antes de iniciar a atual campanha eleitoral, reproduzi itens de um artigo que Carlos Alberto Di Franco, professor de Ética Jornalística e doutor em Comunicação, publicou no jornal “O Estado de S. Paulo”. Denominado “Jornalismo em ano eleitoral”, o trabalho é um alerta sobre a necessidade de uma reflexão acerca do papel da mídia na cobertura eleitoral, além de uma janela para se compreender, por exemplo, as razões pelas quais o marketing, quase sempre, é utilizado (e muito bem pago) só para satisfazer desejos pirotécnicos de candidatos, nos já notórios shows de efeitos especiais que iludem os incautos.
Vejamos, a seguir, alguns fragmentos do artigo do professor Di Franco que julgo extremamente importantes para uma reflexão de nossa parte:
- Ano eleitoral. Campanhas milionárias, promessas irrealizáveis e imagens produzidas: é o marketing de candidatos. Assistiremos, diariamente, a um show de efeitos especiais capazes de seduzir o grande público, mas sem conteúdo e carente de seriedade;
- O marketing, ferramenta importante para a transmissão da verdade, pode, infelizmente, ser transformado em instrumento de mistificação;
- Os programas eleitorais vendem uma bela embalagem, mas, de fato, são paupérrimos na discussão das idéias. Nós, jornalistas, somos (ou deveríamos ser) o contraponto a essa tendência. Cabe-nos a missão de rasgar a embalagem e desnudar os candidatos;
- Uma cobertura de qualidade será uma questão de foco. É preciso declarar guerra ao jornalismo declaratório e assumir, efetivamente, a agenda do cidadão. Não basta um painel dos candidatos, mas é preciso cobrir a fundo as questões que influenciam o dia-a-dia das pessoas. É importante fixar a atenção não nos marqueteiros e em suas estratégias de imagem, mas na consistência dos Programas de Governo;
- É necessário resgatar o inventário das promessas e cobrar coerência. O drama das cidades não pode ficar refém de slogans populistas e de receitas irrealizáveis;
- O centro do debate tem de ser o cidadão, as políticas públicas, não mais o político, tampouco a própria Imprensa;
- Precisamos fugir do espetáculo e fazer a opção pela informação. Com equilíbrio e didatismo, separa-se notícia do lixo declaratório;
- Atores políticos não medirão esforços para fazer com que a mídia, à sua revelia, destile veneno nos seus adversários. É preciso combater o vírus da leviandade, revalorizando perguntas como: Checou? Tem provas? A quem interessa essa informação?;
- O leitor espera uma imprensa combativa, disposta a exercer o seu intransferível dever de denúncia; quer um quadro claro, que lhe permita formar um perfil dos candidatos: antecedentes, evolução patrimonial, desempenho em cargos atuais e anteriores etc.;
- Impõe-se um bom levantamento das promessas de campanha. É preciso mostrar eventuais descompassos entre o discurso e a realidade;
- Os políticos, pródigos em soluções de palanque, não perdem o sono com o rotineiro descumprimento da palavra empenhada. Para muitos, a política é a arte do engodo. E contam com a amnésia coletiva;
- O jornalismo de qualidade deve assumir o papel de memória da cidadania. Precisamos falar dos planos e do futuro. Mas devemos também falar do passado, das coerências e das ambigüidades;
- Transparência nos negócios públicos, ética, qualificação e competência são as principais demandas da sociedade. E também as pautas de uma boa cobertura eleitoral. Deixemos de lado a pirotecnia do marketing e não nos deixemos aprisionar pelas necessárias pesquisas eleitorais.
A verdade é que, se todos esses preceitos do mestre Di Franco fossem levados a sério, muitos jornalistas e marqueteiros (alguns, notoriamente, trapaceiros) estariam desempregados. De qualquer forma, tais observações são extremamente oportunas para o momento político-eleitoral, especialmente em Cuiabá e noutras cidades, onde a baixaria tem sido a tônica de campanhas eleitorais.
A pergunta que não quer calar: Isso é possível onde grande parte dos jornalistas é engajada (inclusive, toma publicamente as dores de certos políticos), outros fornecem opiniões e alguns marqueteiros acham que são professores de Deus, enquanto outros têm absoluta certeza disso?
...
*Antonio de Souza é jornalista em Cuiabá.
af-souza1957@uol.com.br - asouza80@hotmail.com
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Comentários dos Leitores
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Comentário de Carlão P da Silva (carlaopsilva_49@yahoo.com.br) Em 23/09/2008, 08h42 |
Rara lucidez |
Antonio de Souza matou a cobra e mostrou o pau. É lamentável a proliferação dessa "raça", principalmente dos oportunistas em busca de seus 15 segundos de fama no palco de quem deveriam iluminar. Não existem homens de marketing sérios, competentes e honestos operando na nossa região. Existem aproveitadores, puxa-sacos e megalômanos em busca de aplausos comprados de uma galera de beócios. E as campanhas demonstram essa anemia intelectual e esse viés hipócrita escorrendo de cada produçãozinha mequetrefe metida a "roliúde". No afã de se agachar cada vez mais pra agradar aos patrões e tentar ir para o trono da Cinderela na história da Carochinha que cada um inventa pra sí próprio e para seus lacaios, terminam oferecendo à platéia o triste espetáculo de exposição das nádegas flácidas e varizentas. É uma vergonha!! |
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