capa | atento olhar | busca | de última! | dia-a-dia | entrevista | falooouu
guia oficial do puxa-saco | hoje na história | loterias | mamãe, óia eu aqui | mt cards
poemas & sonetos | releitura | sabor da terra | sbornianews | vi@ email
 
Cuiabá MT, 09/10/2024
comTEXTO | críticas construtivas | curto & grosso | o outro lado da notícia | tá ligado? | tema livre 30.810.988 pageviews  

Hoje na História Saiba tudo que aconteceu na data de hoje.

TEMA LIVRE : Xico Graziano

Outras colunas do Tema Livre

Apagão da mamona
17/11/2009

Apagão deu também no programa nacional de biodiesel. Gorou uma invencionice do governo Lula. Por sorte, a lavoura da soja evitou o efeito dominó advindo do fracasso da mamona. Menos mal.

Introduzir óleo vegetal na matriz energética dos transportes espelha uma excelente ideia. A novidade surgiu em 1970, quando a Universidade Federal do Ceará registrou uma patente para fabricação do biodiesel. Ninguém, entretanto, acreditou no processo.

Há apenas cinco anos, com a alta do petróleo, o assunto esquentou. Com o preço do diesel castigando os distantes agricultores de Mato Grosso, alguns produtores começaram a colocar óleo de soja direto no motor de suas máquinas agrícolas. Por incrível que pareça, o trator, mesmo fumaçando branco, andava.

A ousadia espelhava apenas uma angústia. Os motores careciam de alterações técnicas para bem funcionar. E o óleo vegetal precisava ser transformado em biodiesel. Caberia ao governo federal aprontar a nova legislação. Tudo ocorreu rapidamente.

Por meio da transesterificação se modifica óleo vegetal em biodiesel. Consiste numa reação química do óleo de cozinha comum com o etanol (álcool etílico), ou metanol, estimulada por um catalisador. O produto resultante ganha poder de combustão, reduz a viscosidade e libera glicerina, um subproduto valioso no mercado de cosméticos. Vale também para gorduras animais, como sebo de boi.

A legislação, aprovada em 2005, estabeleceu a obrigatoriedade de, a partir de 2008, misturar 2% de biodiesel no óleo combustível derivado do petróleo comercializado no País. Em 2013 tal quesito deverá ser elevado para 5%. De olho no mercado, as empresas fabricantes de motores aceleraram seus investimentos para a adaptação à nova realidade. Tratores ecológicos.

O desafio maior residia na disponibilidade da matéria-prima. Seriam necessários perto de 900 milhões de litros de biodiesel para assegurar a mistura B2 logo em 2008. Mais que dobraria a quantidade para garantir o B5 em 2013. Foi aqui, na equação da oferta de biodiesel, que o governo cometeu seu grande equívoco.

Dezenas de espécies vegetais oleaginosas se propiciam à produção do biodiesel. Destacam-se soja, mamona, dendê, girassol e pinhão manso. Cada qual apresenta vantagens e desvantagens. A soja, por exemplo, vence na escala de produção e na tradição de cultivo. Mas perde no teor de óleo da semente, entre 18% e 20%. Bastante proteica, a soja esmagada gera grande quantidade de farelo, ótimo para ração animal, um estorvo, porém, para uma fábrica de biodiesel.

O girassol apresenta de 40% a 45% de óleo na semente, bem mais que a soja. Inexiste no País, todavia, tradição de plantio de girassol. O pinhão manso, planta com elevado teor de óleo, acima de 50%, virou coqueluche sem que nunca tivesse sido cultivada em escala. O dendê, ou a palma, palmeira de origem africana, oferece excelente óleo a partir de sua polpa. Rivaliza com a soja na produção mundial de óleo, graças aos grandes cultivos na Malásia e na Indonésia. No Brasil, porém, adapta-se somente na região úmida da Amazônia.

Resta a mamona. Resistente, apropriada para solos fracos, seus caroços são conhecidos desde a Antiguidade por causa do óleo de rícino, famoso purgativo na medicina popular. Sua semente traz de 45% a 50% de óleo. No mundo industrial, o óleo de mamona sempre guardou excelente valor como lubrificante, pois mantém boa viscosidade em ampla faixa de temperatura.

Nessa euforbiácea recaiu a aposta do governo para abastecer o mercado de biodiesel. O projeto incluiu uma grande novidade: a mistura da solução energética com a reforma agrária. Festiva solenidade comandada por Miguel Rossetto, então ministro do Desenvolvimento Agrário, lançou no Palácio do Planalto, há quatro anos, a inusitada proposta de grudar o biodiesel nos assentamentos rurais.

Criada para favorecer o negócio, a empresa Brasil Ecodiesel prometia sozinha fornecer 800 milhões de litros do novo combustível, sugado principalmente das terras do Piauí. Dinheiro público bancava o projeto. Tudo parecia uma maravilha. Mas nada deu certo. As lavouras não vingaram, os assentados desistiram, o dinheiro do Pronaf sumiu, a mamona murchou. E a Ecodiesel acaba de falir.

Na bomba do posto, todavia, felizmente o óleo combustível contém a mistura renovável. Mágica? Não, em vez da mamona, a soja garante o biodiesel para a Petrobrás, respondendo por 80% da oferta, seguida do biodiesel de sebo bovino (15%). Para sorte da sociedade e do meio ambiente, a lei se cumpriu.

Avança em todo o mundo a agricultura energética. Na agenda das mudanças climáticas globais, definitivamente a energia renovável se imporá. Que ninguém duvide: os biocombustíveis, tanto quanto a bioeletricidade, ostentarão lugar de destaque na economia verde do futuro. Energia renovável representa um passaporte da sustentabilidade.

Será importante, porque democrático, trazer a massa dos pequenos agricultores a esse decurso virtuoso. As novas tecnologias, amigáveis com a natureza, jamais poderão ser apropriadas apenas pelos ricos e poderosos. Nessa construção da economia de baixo carbono, todavia, inexiste espaço para a demagogia e o amadorismo. Muito menos para qualquer tentativa de sobrepor uma ideologia atrasada sobre o moderno desafio ambiental. Socioambientalismo, sim, manipulação política, não.

O mais curioso dessa história do apagão da mamona se descobre no fisiologismo do poder. O mesmo Rossetto que, naquela época, articulou a festa da Ecodiesel hoje comanda a Petrobrás Biocombustíveis. Não se descobriu ainda se lá está para tentar salvar a cria ou para enterrá-la de vez. Coisas da política.

...

Xico Graziano, agrônomo, é secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. E-mail: xico@xicograziano.com.br - Site: www.xicograziano.com.br


OUTRAS COLUNAS
André Pozetti
Antonio Copriva
Antonio de Souza
Archimedes Lima Neto
Cecília Capparelli
César Miranda
Chaparral
Coluna do Arquimedes
Coluna do Bebeto
EDITORIAL DO ESTADÃO
Edson Miranda*
Eduardo Mahon
Fausto Matto Grosso
Gabriel Novis Neves
Gilda Balbino
Haroldo Assunção
Ivy Menon
João Vieira
Kamarada Mederovsk
Kamil Hussein Fares
Kleber Lima
Léo Medeiros
Leonardo Boff
Luciano Jóia
Lúcio Flávio Pinto
Luzinete Mª Figueiredo da Silva
Marcelo Alonso Lemes
Maria Amélia Chaves*
Marli Gonçalves
Montezuma Cruz
Paulo Corrêa de Oliveira
Pedro Novis Neves
Pedro Paulo Lomba
Pedro Pedrossian
Portugal & Arredores
Pra Seu Governo
Roberto Boaventura da Silva Sá
Rodrigo Monteiro
Ronaldo de Castro
Rozeno Costa
Sebastião Carlos Gomes de Carvalho
Serafim Praia Grande
Sérgio Luiz Fernandes
Sérgio Rubens da Silva
Sérgio Rubens da Silva
Talvani Guedes da Fonseca
Trovas apostólicas
Valéria Del Cueto
Wagner Malheiros
Xico Graziano

  

Compartilhe: twitter delicious Windows Live MySpace facebook Google digg

  Textos anteriores
26/12/2020 - MARLI (Marli Gonçalves)
21/12/2020 - ARQUIMEDES (Coluna do Arquimedes)
20/12/2020 - IDH E FELICIDADE, NADA A COMEMORAR (Fausto Matto Grosso)
19/12/2020 - 2021, O ANO QUE TANTO DESEJAMOS (Marli Gonçalves)
28/11/2020 - OS MEDOS DE DEZEMBRO (Marli Gonçalves)
26/11/2020 - O voto e o veto (Valéria Del Cueto)
23/11/2020 - Exemplo aos vizinhos (Coluna do Arquimedes)
22/11/2020 - REVENDO O FUTURO (Fausto Matto Grosso)
21/11/2020 - A INCRÍVEL MARCHA DA INSENSATEZ (Marli Gonçalves)
15/11/2020 - A hora da onça (Coluna do Arquimedes)
14/11/2020 - O PAÍS PRECISA DE VOCÊ. E É AGORA (Marli Gonçalves)
11/11/2020 - Ocaso e o caso (Valéria Del Cueto)
09/11/2020 - Onde anda a decência? (Coluna do Arquimedes)
07/11/2020 - Se os carros falassem (Marli Gonçalves)
05/11/2020 - CÂMARAS MUNICIPAIS REPUBLICANAS (Fausto Matto Grosso)
02/11/2020 - Emburrecendo a juventude! (Coluna do Arquimedes)
31/10/2020 - MARLI (Marli Gonçalves)
31/10/2020 - As nossas reais alucinações (Marli Gonçalves)
31/10/2020 - PREFEITOS: GERENTES OU LÍDERES? (Fausto Matto Grosso)
26/10/2020 - Vote Merecimento! (Coluna do Arquimedes)

Listar todos os textos
 
Editor: Marcos Antonio Moreira
Diretora Executiva: Kelen Marques