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TEMA LIVRE : João Vieira
Emblema de Pirenópolis
19/01/2010
Ele tem suporte referencial forte: veio de Ouro Preto, Minas Gerais. Tem na pintura sua atividade-matriz; e tem no adro da Matriz de Pirenópolis o seu “lócus” preferencial de trabalho e vivência pública. É jovem, tendendo à madurez. Preto. Retinto – como os há em profusão onde houve lavra e/ou lavoura, por estes brasis da colonização histórica. Assim, pois, Ouro Preto, Diamantina, Sabará, São João Del-Rey e Tiradentes, em Minas Gerais. Cuiabá , Vila Bela da Santíssima Trindade e o sempre esquecido Diamantino – sim, lá também tem – no Estado do Mato Grosso. Igualmente em toda a Bahia colonial e no Maranhão velho, campo de vigência do mandonismo de Ribamar Sarney.
Ademais, afro-descendentes brasílicos são encontradiços onde quer que exista pauta de produção em território nacional pátrio; ou área de prevalência das artes, como Rio de Janeiro, São Salvador-BA ou Pirenópolis, entre outros lugares. Conclua-se: ele tem origem, identidade e, pra sorte do Brasil, qualidade! Queremos insinuar, sim, ele daria filme. Afinal, é mais um brasileiro a se prestar à excepcionalidade; a ter trajetória de vida não trivial...
Mirim pintor e capoeirista, além de iniciado nas artes da percussão, recreação e, de quebra, restauração, teve o reconhecimento de cidadania honorária concedida pela Câmara Municipal de Pirenópolis. Quisera eu fazer-me presente, ali naquele ato, para aplaudir em nome de toda comunidade ouropretana que, de resto, considero minha. Nostalgicamente!
Mirim consagra o seu tempo livre adestrando crianças, adolescentes e alguns marmanjos – retardatários – na arte (marcial) da Capoeira e técnica apurada da percussão. Enquanto afiliado assumido, da tradição expressional-vivencial (matricial) de raiz afro – desse nosso rico e fortificado mosáico étnico. Brasileiro.
Mirim pintor de aquarelas; paisagens barrocas; pedagogicamente barrocas, muitas vezes! (Ele recusa retratar a visão da banda oeste da Praça da Matriz, em protesto pela desfiguração sofrida com o moderno de suas construções...).
É estética, é cultura, é vida. É turismo. Mas, o tal do “desenvolvimento”... Que um dia desenvolveu (inapelavelmente), a cidade-irmã Luziânia, em Goiás – matando-a para a história. Lançando-a na vala comum da modernidade. (Modernidade?). Modernosidade – seria mais condizente! Muito embora tenha lá um baluarte de expressão cívica e cultural, qual seja, a Academia de Letras e Artes do Planalto - ALAP! E que evoca, conduz a seus santos cívicos Gelmires Reis e Dilermando Meireles. Como se vê, nunca se perde tudo, tudo! Cabe, sim, ficar muito atento. Atenta a velha “Meia Ponte” (Pirenópolis de hoje), arremate-se.
Não resisto ao impulso de descrição de uma performance, emblemática, do pintor Mirim nas ocasiões de pico do fluxo turístico nesse mui barroco burgo. Dá-se à noite em tempos de clima perfeito, já que bom-clima, tropical, é permanente, porquanto serrano, com tudo de exuberante que a tropicalidade de altura oferece; e o terráqueo planaltense tem direito. Assim, sol, claridade, frescor. Calor, chuvas torrenciais ou apenas uma barrufada ligeira de umidificação – eis a ambiência básica da cidade, no seu normal.
Em ocasiões especiais de turismo e clima, dizíamos, na noite primorosa de Pirenópolis, e sua Rua do Lazer discretamente iluminada, ou se preferir – de recatada penumbra – desafogada de veículos, excetuando-se os carrinhos de bebês (viva a família; viva a juventude), Mirim de cavalete armado, pincel-em-riste, sob luzinha-mirim, azulada, em razão da claridade refletida no rosto negro, pinta paisagens que, às vezes inconclusas, não dão pra quem quer!
Esse é Pirenópolis do Mirim / o Mirim de Pirenópolis, o “Jair Afonso Ignácio” de Ouro Preto – maior restaurador e pintor modernista, brasileiro, daquela fase de lua nova de nossas vidas. O Jair-gênio autodidata, guia, em fluente inglês, de Robert Oppenheimer (ele mesmo, o pai-da-bomba), então em visita ao Brasil. Uma só diferença: Mirim dos Santos ainda não domina o inglês... Tenho dito!
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*João Vieira -- joaovieira01@pop.com.br -- é sociólogo, professor-fundador da Universidade Federal de Mato Grosso e escreve quando bem entende neste espaço. Texto elaborado com a colaboração de Silvio Cavalcante -- cavalcante.silvio@gmail.com --, arquiteto do IPHAN em Pirenópolis – GO. Foto de capa: Nivaldo Trindade -- nivaldoclickfoto@gmail.com
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