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TEMA LIVRE : Eduardo Mahon
O tempo, o vento e o cargo
25/08/2010
Por que, afinal, a escolha indireta dos representantes de classe para o desembargo é injusta? O argumento é de ordem institucional e transcende oposição conjuntural a esta ou aquela gestão administrativa. É sempre bom sublinhar esse tópico, sob pena do leitor acreditar que a opinião restringe-se ao oposicionismo. Uma vez empossado, o julgador deixa de seguir qualquer direcionamento classista e passa a julgar todos os cidadãos indistintamente Por conseguinte, o candidato a este cargo não pode ser favorito de uma gestão passageira.
Isto porque a gestão administrativa dos conselhos (seja do Ministério Público, seja da Ordem dos Advogados) tem prazo certo para acabar. E o cargo de desembargador perdura até a aposentadoria do escolhido. Isto é, os nomes escolhidos por um conselho temporário ficarão no serviço público por prazo indeterminado. A gestão representa a categoria num espaço de tempo. Uma escolha que se posterga indefinidamente deve ser feita de forma direta a todos os profissionais.
Há um sofisma clássico na polêmica. Como os promotores e os advogados são os responsáveis pela eleição dos respectivos conselhos, então estará cada colegiado autorizado a decidir pela classe. É verdade para todos os aspectos administrativos da profissão e da carreira que têm prazo, tempo e conjuntura própria, mas não para a escolha do representante da classe junto aos Tribunais.
Porque, administrativamente, os conselhos podem e devem dirimir questões afetas ao tempo da gestão. Posicionamentos públicos ou reservados, sanções disciplinares, planos de carreira, organogramas internos, projetos para melhoria das condições de trabalho. Todavia, a gestão destes conselhos termina com dia e hora marcada, ou seja, a representatividade é limitada.
Ocorre todo o inverso com o desembargador. Sua representatividade não é marcada por um tempo, por uma gestão, por uma conjuntura política. No acesso ao tribunal, deve representar a classe e não um conselho. Deve representar a categoria, a profissão, a carreira e não a vontade dos dirigentes. Por que deve ser assim? Porque os dirigentes passam e o desembargador fica.
Os grupos se alternam no poder. Situação sai, oposição entra. Isso não importa. De relevo é a questão institucional. Ainda que os advogados sejam, de fato, representados por um conselho, assim como o são os promotores de justiça, o quinto constitucional não pertence a esta ou aquela gestão administrativa que foi eleita com uma determinada plataforma. O cargo pertence a todos, indistintamente, seja situação ou oposição.
Porque o tempo passará; felizmente, não fazendo distinção. A gestão que eventualmente elege o desembargador pode inclusive sofrer um revés e sair fragorosamente derrotada numa eleição. Mas então? Como ficará a representatividade dos escolhidos, se de um dia para o outro a posição da maioria mudou? Como o cargo transcende o prazo eletivo, nada mais coerente que a escolha direta dos componentes da lista.
Somente assim saberemos respeitada a vontade dos membros das instituições. Não se falará de conjunturas política internas, já que o mandato dos conselheiros extingue-se, mas a escolha do desembargador terá sido feita por toda a categoria e não apenas por mandatários passageiros. Eis aí o fundamento da validade da escolha direta: o cargo é público e vitalício. Aí sim teremos a verdadeira representação.
Tivesse o desembargo prazo certo, até poderíamos cogitar de indicações por conselhos. Evidente: cada conselho escolhe, em seu tempo, o que parece mais adequado e, ao findar do mandato de quem escolhe, o escolhido será substituído. É o critério da conveniência administrativa. Todavia, como o desembargador tem função pública sem prazo determinado, nada mais lógico do que ser escolhido por toda a categoria e não por alguns que serão substituídos em seus mandatos.
Afinal, "o tempo e o vento" é obra de ficção. Mas o cargo não.
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*Eduardo Mahon é advogado em Mato Grosso e Brasília/DF
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