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TEMA LIVRE : Gabriel Novis Neves

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Outros tempos
26/01/2011

O presidente do Brasil era o sociólogo Fernando Henrique Cardoso. Durante o seu mandato, um grupo de patriotas lutadores pela justiça social no campo, invadiu o seu sítio, no estado de Goiás. Na época as invasões de propriedades privadas ainda eram raras. Em se tratando do presidente da República, o fato foi um prato cheio para a mídia nacional e internacional. As principais redes de televisão nacionais ficaram de plantão, com a sua numerosa equipe, na cancela do sítio presidencial.

Logo apareceram as redes americanas e inglesas. Tinha mais gente do lado de fora que do lado de dentro da casa. A expectativa era de um confronto a qualquer momento entre as forças do exército e as vermelhas da estrelinha. Um mastro fazia a bandeirinha do MST (Movimento dos Sem Terra) tremular ao vento goiano-mineiro.

Várias tendas foram montadas pelos revolucionários da ONG (Organização Não Governamental), para organizar a entrada de jornalistas no interior da casa do sítio do presidente. Gente treinada e habilitada esse pessoal - a maioria com curso no Caribe. Após o credenciamento individual, ou do consórcio de agências de notícias com contrato assinado e pago em moeda estrangeira, os jornalistas recebiam um crachá e uma senha para a entrada no lugar da tão esperada reportagem.

As imagens em tempo real e coloridas que recebíamos em casa eram dignas de um filme de Glauber Rocha. Revolucionários bebendo o vinho predileto do presidente, roupas da professora doutora em Antropologia da USP (Universidade de São Paulo) servindo de tapete e para enxugar pratos na cozinha. Gente dormindo nos sofás e nas camas dos dormitórios. Gente no chão lendo os livros em alemão do presidente professor. Crianças brincando com algumas condecorações, assim como os meninos jogando futebol com bola de meia na imensa biblioteca da casa do sítio. Na verdade essa tomada do sítio do presidente foi planejada com assessoria externa para desestabilizar o regime e o real. No final foi uma tremenda farra, com vantagens comerciais para os revolucionários.

O que fez o presidente FHC? Nada.

As forças armadas não foram incomodadas, e o movimento vitorioso foi esvaziando. A imprensa retirou-se do local e o confronto imaginado por alguns não aconteceu. O presidente FHC ocupou uma cadeia de rádio e televisão e disse que a negociação com os heróis guerrilheiros teria que ser realizado por vias diplomáticas. Tratamento idêntico a qualquer outro conflito semelhante. Esclareceu que, como presidente em exercício do Brasil, tinha direito somente à segurança pessoal. O seu patrimônio, não. Mesmo sendo um sítio, era um patrimônio privado. A lei não concede exceções, nem para o presidente do Brasil.

Por aqui está se discutindo há três anos se os futuros ex-governadores, após deixarem os seus cargos, terão direito à segurança pessoal e patrimonial. O autor intelectual da ideia transformada em lei foi aprovado na Assembleia Legislativa, por TODOS os partidos, sem exceção. Ao sancionar a lei, considerou legítima a sua segurança pessoal e patrimonial. Ainda bem que o seu patrimônio é menor que o sítio do FHC. Se fosse um abonado, teríamos que criar uma Força Nacional de Segurança.

O governador da continuidade, passadas as eleições, achou um absurdo o tal privilégio da segurança patrimonial. Talvez conheça a extensão do patrimônio do seu antecessor, e sentiu que o nosso Estado não teria recursos suficientes para cumprir esse artigo aditivado no decreto que regulamentou a lei. Dez dias antes da sua nova posse (era suplente do que saia com segurança pessoal e patrimonial), anulou o decreto do seu antecessor e publicou outro. Antes, teve o cuidado de retirar a segurança patrimonial e outros penduricalhos.

Como não entendo de leis, gostaria de uma explicação. Cada dia fica mais difícil, para os de outros tempos, entenderem os tempos modernos.

...

*Gabriel Novis Neves é médico obstetra, professor-fundador, primeiro reitor da Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT, ¨ginecologista¨ estatutário e compulsório do Grupo Fazendas Reunidas Perereca Enterprise, Broadcasting & Corporation e nas -- poucas -- horas vagas, compositor.


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