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TEMA LIVRE : Wagner Malheiros

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Um cachorro chamado Aparecido
25/02/2011

Era feio, muito feio. Típico vira-lata de cor amarelada e pêlo curto, não era pequeno nem grande. Eu morava na rua Thogo Pereira, mais conhecida como a rua do Hospital Geral. Naquela época a rua era toda em lajotas de concreto em forma de paralelepípedos. O carro quando passava tremia e fazia aquele vruuummmm, principalmente a velha Rural do meu pai. Jurava que ela ia desmanchar a cada vez que subia ou descia a rua.

Mas voltando ao Aparecido, ele era um cachorro de certa idade, um pouco maltratado pela vadiagem. Naquele tempo sem violência a garagem da casa de meu pai ficava aberta, o muro não dava um metro. As vezes entrava um cachorro ou outro, mas após uma soneca iam embora. Mas não o Aparecido.

O nome não foi a toa, ficou assim porque ele simplesmente apareceu e ficou. Apareceu, Aparecido ficou. A primeira vez que meu pai o viu, dormia embaixo do carro. No dia seguinte lá estava ele. Meu pai ligava o carro, ele acordava, rolava do lado e dormia. E foi ficando. Lá pelo fim da primeira semana ganhou seu prato de alumínio para a comida e uma vasilha para água. Daí ficou de vez.

Minha mãe não deixava ele entrar na casa, mas a garagem era ampla e eu com meu irmão adotamos aquele vira-lata como parceiro de brincadeiras. Mas quem ele gostava mesmo, era do meu pai. Volta e meio encontrava Aparecido ao lado de meu pai enquanto ele fumava, encostado ao muro da casa, olhando a rua. Meu pai e ele deitado preguiçoso aos seus pés.

Os meses, anos foram passando e todo dia meu pai ao sair para trabalhar, abrindo a porta, logo era saudado por Aparecido.

Um dia cheguei em casa e era uma confusão. Tinha uma ambulância na porta e um monte de carro. Da rua fui direto ao quarto do meu pai, onde ele deitado com um cigarro entre os dedos, estava sofrendo um burro de um infarto. Tio Cid Borges, compadre e cardiologista do meu pai estava pálido, a coisa era feia e meu pai era teimoso. Tinha que ir ao hospital para ser internado e com certo esforço, meu pai acabou concordando em ir, não sem antes acabar de fumar seu Du Maurier.

Lá se foi a ambulância com meu pai, e logo atrás parte Aparecido enlouquecido. Na época o Hospital modelo ficava no meio da subida da Comandante Costa, após atravessar a Isaac Póvoas. Nem na subida a correria afrouxou, ia a ambulância, seguia Aparecido e logo atrás outros carros.

Meu pai foi internado e, embaixo de uma grande mangueira no estacionamento do hospital, esbaforido se quietou o vira-lata. Não saía do lugar, não comia e seu olhar era fixo na porta que entraram com meu pai. Levávamos comida e Aparecido pouco queria saber, até o dia que meu pai teve alta.

Aparecido estava debilitado e acabou retornando de carro. Chegando em casa pela primeira vez deixaram ele entrar, e ao lado da cama de meu pai, deitado no chão ficou.

Após a recuperação, voltou a ser o rei da garagem, sempre cercado de muito carinho. O tempo passando, ele ficando velho, e o ritual do meu pai fumando junto a calçada, com ele deitado aos seus pés.

Mas um dia, Aparecido sumiu. Aberta a porta de manhã, ele não fez a costumeira festa. Ano após ano, nenhuma falta, e naquele dia, cadê o Aparecido?

Meu pai voltou do serviço, e ele nada, tinha evaporado. Era desaparecido. Saímos pelo bairro procurando, perguntando, até que, a notícia.

O Luís Pinga, que vivia alcoolizado de um lado pelo outro do bairro, mas incapaz de mentir, revelou, tinha visto todo o ocorrido.

Na rua Major Gama tinha um amplo terreno e lá se montavam todos os Circos que perambulavam de uma cidade a outra. Tinha bichos o circo que lá estava, um elefante, uma girafa e dois leões magros.

Aparecido tinha sido recolhido por funcionários do Circo e virado comida de leão.

Após a descoberta meu pai tentou achar o dono do circo, mas nada, ele sumiu alertado por vizinhos, prevendo no mínimo, uma bela surra.

O meu pai, de volta para casa sentou na varanda e pela primeira vez eu o vi chorar, parecia uma criança se vertendo em lágrimas.

Foi o fim do Aparecido, o vira-lata mais amado e fiel que tivemos. E eu nunca mais quis saber de circo.

...

*Wagner Malheiros é médico pneumologista, novo membro do Grupo Fazendas Reunidas Perereca Enterprise, Broadcasting & Corporation e não gosta de Circos.


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