Esse dia não tem muito tempo, um dia como ontem, hoje ou amanhã. Era àquela hora da tarde em que onde ainda existem sábias começa-se a ouvi-los cantar.

Então estava eu, vivendo passo a passo, quando de súbito, um segundo após a normalidade tudo mudou.

Soou uma música ao longe, leve, quase que imperceptível e sem querer sabendo ser inevitável comecei a dançar.

Num lento suspiro fechei os olhos, senti dedos frios de camurça em minhas costas e ao som daquela estranha valsa, lentamente comecei a girar, valsando por sobre os segundos, contando-os como se bebesse perfumes e de forma doce e enjoativa, me inebriei naquele sentimento de finitude.

Senti o hálito gélido de minha parceira, me prendendo prisioneiro do que fosse o resto dos meus segundos, dias e anos. Senti saudade de mim mesmo e de forma egoísta lembrei-me dos meus, dos olhos miúdos das crianças e do rosto condescendente de minha amada com o comportamento bobo e infantil que dirijo a vida.

Bebi um gole do ar que lentamente ainda fluía em meu peito, abri os meus olhos e enxergando o infinito nos olhos da minha parceira de dança, sem nada a dizer afastei-me de seus braços e abracei a dor.

A música ainda soava, o tempo ainda corria e resolvi correr também.

E aqui estou.

...

*Wagner Malheiros é médico pneumologista em Cuiabá/MT

Compartilhe: