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TEMA LIVRE : Wagner Malheiros
A bomba no Verdão
07/04/2011
Creio ser uma das poucas lembranças que ainda guardo dos meus quatro anos de idade.
Um dia por curiosidade o meu pai resolveu conhecer as obras do novo estádio de futebol e me levou junto.
Lembro com perfeição a imagem das arquibancadas sendo construídas. Era um buraco imenso e um monte de tratores trabalhando. Ficamos sentados um bom tempo observando. Creio que até meu pai ficou espantado.
Antes íamos ao Dutrinha torcer pelo Mixto. Nas arquibancadas o clima era semelhante à reunião de clube, todos se conheciam, se cumprimentavam, brincavam e riam.
Respeitava-se até a torcida adversária e não havia brigas. Se alguém brigava não era pelo futebol.
Algumas personalidades mais ou menos queridas pela torcida recebiam coro de saudação, tal e qual como se jogador fosse. Meu pai carregava sempre nos ombros um imenso rádio. Assistindo ao Mixto jogar ia escutando os jogos do Vasco da Gama narrado pelo Washington Rodrigues, o Apolinho.
O som do aparelho subia e baixava, a coisa chiava e mal se escutava. Tinha uma antena imensa arrematada na ponta com um chumaço de bombril.
Um dia meu pai recebeu um coro da torcida saudando sua “eletrola”. No próximo jogo ele levou um rádio menor. Depois ficou culpando a torcida do operário pela má-criação.
Quando meu irmão ficou um pouco maior íamos a todos os jogos. Desta vez já no inaugurado Verdão. O melhor jogo era contra o Operário. Tínhamos bons jogadores e o que guardo maior lembrança foi o Bife. Era um craque.
O Mixto disputava o campeonato brasileiro e grandes times jogavam por aqui.
Uma tarde creio um domingo, não me recordo qual era o jogo, mas com certeza deve ter sido o Mixto contra outra equipe.
Estávamos como sempre nas cadeiras, logo abaixo do setor das rádios e da tv.
Antes do final do primeiro tempo costumávamos sair para comprar cachorro quente e bebidas.
À direita da entrada do setor de cadeiras ficava um senhor vendendo cachorro quente.
Naquele dia eu estava com um na mão, meu irmão com outro e meu pai com um copo de cerveja.
O barulho foi imenso. Eu caí no chão com meu irmão e meu pai deixou cair o seu copo. Os ouvidos doíam. O chão tremeu e por onde se olhava às pessoas estavam aturdidas.
Corremos para as cadeiras e vimos pessoas saindo desesperadas. Uma mulher era carregada desmaiada.
Crianças choravam e muitos corriam em direção ao estacionamento.
A fumaça subia ao céu. Cadeiras ainda caíam do ar.
Saímos correndo do estádio, o medo era a explosão de outra bomba.
Nunca mais meu pai voltou ao Verdão.
Hoje passando a rua ao lado do estádio percebi a mesma coisa, jamais voltarei a nossa velha arena de futebol.
Desta vez a bomba que malcriados jogaram em nosso estádio foi oficial.
...
*Wagner Malheiros é médico pneumologista em Cuiabá/MT
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