capa | atento olhar | busca | de última! | dia-a-dia | entrevista | falooouu
guia oficial do puxa-saco | hoje na história | loterias | mamãe, óia eu aqui | mt cards
poemas & sonetos | releitura | sabor da terra | sbornianews | vi@ email
 
Cuiabá MT, 23/11/2024
comTEXTO | críticas construtivas | curto & grosso | o outro lado da notícia | tá ligado? | tema livre 30.917.861 pageviews  

Tema Livre Só pra quem tem opinião. E “güenta” o tranco

TEMA LIVRE : Marli Gonçalves

Outras colunas do Tema Livre

Boa-fé, fé demais
30/05/2011

Andar com fé eu vou, mas a fé costuma falhar, sim, quando atingem a sua, diretamente, o que acusamos ao sentir antes de mais nada uma angústia forte e um terrível aperto no coração. Na hora a fé, conceito religioso, pessoal, do caráter, se mistura ao meio jurídico, e de uma forma muito cruel. Porque o problema é que a boa-fé não tem papel; é só a moral que assina, e isso deveria ser reconhecido. Deveria bastar. Mas fé cega, faca amolada.

O sangue corre quente nas veias. Você quase pode sentir o veneno inoculado, circulando por todo ele - o seu corpo - subindo para a cabeça igual se falava antigamente da menstruação, para aterrorizar as meninas sobre o perigo de lavar a cabeça durante o período. O estômago levou um soco, o gosto de fel amarga o apetite e estanca até a emissão das boas palavras e sentimentos. Uma enjoativa sensação de que não vale mais a pena acreditar em nada, em ninguém, que o mal está sempre à espreita. Logo há um tipo de solidão que se instala, e o equilíbrio pode demorar a ser recuperado.

A vida toda é mesmo cruel porque feita justamente desses retalhos, costurados com os momentos bons. Mas só depois você pôde distinguir melhor o que eram apenas nuvens mesmo, sem anjos. Nuvens da sua imaginação e das atitudes desprendidas.

Fé? No amor, sempre acontece assim: você vai e põe fé em pessoas que ama, e elas te deixam a ver navios destroçados, jogados em mar bravio. Já no dia a dia, a gente põe fé nas pessoas com que tratamos olhos nos olhos e quando você não interessa mais, ou a elas só interessa ganhar algum, surgem traiçoeiramente. Evocam leis e contratos que elas mesmas quebraram, ou que apenas podem servir para tentar amparar suas más intenções, na cara dura. Até em família a boa-fé pode fazer quebrar sua cara.
A traição anda com cara lambida, displicente, balançando a bunda, batendo chinelinho, tentando não ser percebida quando ou enquanto te golpeia.

Tem um monte de tipos a tal fé. A coqueteleira do mundo louco mistura de tal forma os conceitos que às vezes nos deixa sem entender bem nenhuma filosofia, seja vã ou utilitária. Fé, para lembrar, é uma opinião firme de que algo é verdadeiro, de forma natural, sem direito a dúvida. Onde uma existe, a outra deveria estar longe. A boa-fé é agir de maneira honrosa, em um contrato oral, em que partes se comprometem com algo, até o fim, mesmo com percalços, sempre analisados em conjunto e em bom tom.

Há a tal fé pública, que parece papel, no fundo inventado porque os homens são desde sempre chegados a traições; costuma ser acompanhada de um carimbo de alguém de fé, mesmo que concursada, que "deu fé!".

Entendeu? Burocracias puras. E em geral burras e inoperantes. Sobe e desce de arquivos.

Juristas de respeito já definiram uma boa-fé, diante de tudo isso: "a virtude de dizer o que acredita e acreditar no que diz". Dessa forma, para eles, na hora do vamos ver deveria ser definido assim: "aquele que se encontra em uma situação real, e imagina estar em uma situação jurídica, age com boa-fé subjetiva". Ou, primeiro, o sentimento. A boa-fé.

Mas a coisa é muito mais complexa. Há o botar fé, expressando o sentimento de confiança, reconhecimento e aceitação. Tomar fé é conhecer, saber. Acredito que pode ser usado em outra forma, variada mas precisa: quando alguém vem para roubar a sua, na mão grande.

Aqui no Brasil, a forma mais conhecida e popular, acho que até mais do que reza, é o "fazer uma fezinha". Na loteria, na buena, na sorte. Nos jogos, loterias, heranças, acertos, ou na má-fé, decerto. Está para nascer Nação igual aqui, onde tanta gente quer mais é ganhar dinheiro fácil, sem trabalho, caído do céu, colhido de árvores, roubado do outro. Ah, leitor amigo! Se você está onde acredito - entre os de boa-fé na vida - sinto muito. Estamos mesmo em extinção.

Paro para refletir sobre tudo o que é relativo à Fé e à Justiça, por mim, no momento às voltas com minha própria incorrigível ingenuidade e boa-fé. Mas também por você, outro brasileiro, que clama por Justiça de tal forma que pode se comprazer essa semana com a prisão - mesmo que atrasada - do velho jornalista assassino; e acabou distraído e não reparou em tantos outros pequenos assassinatos por aí, encontros de pessoas com a morte nas esquinas, dentro de casa, no quarto de um motel. Tudo por causa de um momento de boa-fé que depositaram, abriram "a guarda".

Digo ainda pelos que acreditam que promessas são dívidas e acabam em fila indiana andando atrás de algum pregador. Mas se lá na frente alguém brecou, descobrirá a fragilidade do castelo de cartas que caiu de lá em cima de você. Ou sentiu o tranco, ao contrário, se alguém lá atrás não brecou.

Solução para tantos perrengues, não sei. Mas sei que o que temos de combater, curiosamente também tem fé no nome. A má-fé, um crime, porque é procedimento utilizado só para enganar. Em geral a boa-fé dos outros. Aquela que não costuma ter papel, nem recibo de comprovação.

O problema é que só há uma arma para conseguir isso: a fé. Que costuma falhar, e bem na hora que a gente mais precisa dela.


São Paulo, inferno astral, 2011, e nem estão me dando tempo para pensar nisso

...

*Marli Gonçalves é jornalista. Dedico esse texto às pessoas que mantêm a fé na boa. E à minha amiga e advogada Tania Lis que, com conhecimento, força e jeito guerreiro, confia na boa fé, e desbrava uma forma de demonstrar isso, com alegria e solidariedade tal que recupera a minha.

...

Mais Marli em:

www.brickmann.com.br
marligo.wordpress.com



OUTRAS COLUNAS
André Pozetti
Antonio Copriva
Antonio de Souza
Archimedes Lima Neto
Cecília Capparelli
César Miranda
Chaparral
Coluna do Arquimedes
Coluna do Bebeto
EDITORIAL DO ESTADÃO
Edson Miranda*
Eduardo Mahon
Fausto Matto Grosso
Gabriel Novis Neves
Gilda Balbino
Haroldo Assunção
Ivy Menon
João Vieira
Kamarada Mederovsk
Kamil Hussein Fares
Kleber Lima
Léo Medeiros
Leonardo Boff
Luciano Jóia
Lúcio Flávio Pinto
Luzinete Mª Figueiredo da Silva
Marcelo Alonso Lemes
Maria Amélia Chaves*
Marli Gonçalves
Montezuma Cruz
Paulo Corrêa de Oliveira
Pedro Novis Neves
Pedro Paulo Lomba
Pedro Pedrossian
Portugal & Arredores
Pra Seu Governo
Roberto Boaventura da Silva Sá
Rodrigo Monteiro
Ronaldo de Castro
Rozeno Costa
Sebastião Carlos Gomes de Carvalho
Serafim Praia Grande
Sérgio Luiz Fernandes
Sérgio Rubens da Silva
Sérgio Rubens da Silva
Talvani Guedes da Fonseca
Trovas apostólicas
Valéria Del Cueto
Wagner Malheiros
Xico Graziano

  

Compartilhe: twitter delicious Windows Live MySpace facebook Google digg

  Textos anteriores
26/12/2020 - MARLI (Marli Gonçalves)
21/12/2020 - ARQUIMEDES (Coluna do Arquimedes)
20/12/2020 - IDH E FELICIDADE, NADA A COMEMORAR (Fausto Matto Grosso)
19/12/2020 - 2021, O ANO QUE TANTO DESEJAMOS (Marli Gonçalves)
28/11/2020 - OS MEDOS DE DEZEMBRO (Marli Gonçalves)
26/11/2020 - O voto e o veto (Valéria Del Cueto)
23/11/2020 - Exemplo aos vizinhos (Coluna do Arquimedes)
22/11/2020 - REVENDO O FUTURO (Fausto Matto Grosso)
21/11/2020 - A INCRÍVEL MARCHA DA INSENSATEZ (Marli Gonçalves)
15/11/2020 - A hora da onça (Coluna do Arquimedes)
14/11/2020 - O PAÍS PRECISA DE VOCÊ. E É AGORA (Marli Gonçalves)
11/11/2020 - Ocaso e o caso (Valéria Del Cueto)
09/11/2020 - Onde anda a decência? (Coluna do Arquimedes)
07/11/2020 - Se os carros falassem (Marli Gonçalves)
05/11/2020 - CÂMARAS MUNICIPAIS REPUBLICANAS (Fausto Matto Grosso)
02/11/2020 - Emburrecendo a juventude! (Coluna do Arquimedes)
31/10/2020 - MARLI (Marli Gonçalves)
31/10/2020 - As nossas reais alucinações (Marli Gonçalves)
31/10/2020 - PREFEITOS: GERENTES OU LÍDERES? (Fausto Matto Grosso)
26/10/2020 - Vote Merecimento! (Coluna do Arquimedes)

Listar todos os textos
 
Editor: Marcos Antonio Moreira
Diretora Executiva: Kelen Marques