|
TEMA LIVRE : Valéria Del Cueto
Essa é a minha!
18/09/2011

A coisa está tão feia que resolvi antecipar da data da comemoração em uma semana. Feia não. Melhor dizendo cinza, embaçada e sufocante!
Se os ipês já estão enlouquecidos na Lava Pés, os brincos de princesa ou pingos de ouro (a nomenclatura fica ao gosto do leitor) sacolejam balançando ao vento quase insuportavelmente quente da Praça do Chopão, em Cuiabá, por que não considerar a hipótese de que a primavera também esteja com pressa de chegar?
Por isso, hoje sexta feira, dia que costumo escrever a crônica, declaro aberta a primavera adorada. Uma semana antes da data oficial primeira e, agora, não mais única.
Não o faço apenas por constatação visual, baseada na incrível quantidade de cores extras que adornam e salpicam os castigados tons amarelecidos das folhas empoadas – como toda a cidade – pela poeira e secura que imperam no entorno, contorno, exterior e interior dos seres vivou ou não que habitam o espaço do centro-oeste em que me encontro.
O faço também por interesse puro e verdadeiro com a mais escancarada e óbvia das intenções: quero convencer o tempo e o clima reinante que é tempo de mandar uma água salvadora e refrescante.
Sou pretensiosa quando o assunto é influenciar o cosmo. Acho que o pensamento tem força e a escrita poder. Sei que eles são meios e, como tais, não funcionam como fim. Então, foi como meio que observei o grito alto e claro da natureza, chamando e clamando pela primavera idolatrada.
Imagine tubos de tintas coloridas, ressecados, reduzidos, que precisam de um solvente aquoso para que possam se derramar e espalharem sua beleza sobre a tela em branco do universo. Assim estão as plantas e a flora em geral por aqui. Expostas, brotantes, mas enrugadas como maracujá de gaveta.
É junto com cada uma delas que chamo pelas chuvas (uma só não vai aliviar muito) para ter o prazer de ver explodir e se expandirem as cores abundantes de luxúria cromática: rosas, brancos, lilases, amarelos, azuis... Hoje, todas elas enrustidas e sofridas, tentando encontrar seus lugares nesse mundo dominado pelos tons ocres do pó, poeira e vento quente.
Pensem nos verdes, verdinhos e verdões, então! Logo após a primeira chuvarada (ela vai chegar, digo com fé e munida de boas informações - diz que já choveu lá pros lados do Capão Grande, em Várzea Grande “de fazer água correr pelas valetas”, me contou todo animado um motorista de táxi bem informado) eles começam a salpicar as pontas dos galhos retorcidos e castigados que sobrevivem olimpicamente a secura geral, vendo ir para o chão, um a um, seus antigos adornos ressecados, levados pelo vento louco e rodopiante do agosto canino ensandecido que antecedeu este setembro suspirante.
Por isso, clamo, chamo e grito pela minha primavera. A estação das flores e dos amores, sopro refrescante que nos fará agüentar até a hora da molhação integral que, segundo o mesmo taxista do tempo, “só começará lá por novembro, por que antes é só uma cusparada aqui, outra ali, pra enganar a gente”.
E, se o assunto é ilusão (melhor que enganação), declaro aberta e antecipada a temporada primaveril. Não só para mim, mas para todos aqueles otimistas que consideram esse um tempo de esperança e renascimento. Tempo de cores, louvores e, principalmente, renovação de ideais.
É... porque desses últimos estamos precisando demais. Mais até do que da água redentora que sem dúvida virá, mais dia menos dia, do céu que nos protege, alivia e alimenta!
Bem vinda ó sublime estação das flores!
...
*Valéria del Cueto é jornalista, cineasta, gestora de carnaval e porta-estandarte do Saite Bão. Outros textos em http://delcueto.multiply.com


Compartilhe:
|
|