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TEMA LIVRE : Marli Gonçalves
Vivi para ver: loucura, loucura, loucura
09/12/2012
Duvido-ó que você diga que não sente qualquer angústia nesta época de fim de ano, ou que consiga passar totalmente incólume pelos minutos finais do segundo tempo desse jogo. Ainda não inventaram, infelizmente, nenhum spray impermeabilizante contra essa temporada. Só nos resta sentar no balanço, e balançar muito a perninha, esperar que alguém empurre, enquanto discorremos mentalmente sobre nossas vidas e sobre o que o tempo fez...
A esta altura já parece que uma locomotiva nos atropelou e o tique-taque não para. Por mais que a gente queira ignorar - porque esse clima de todo mundo bonzinho para ganhar presente do Papai Noel é de matar - não dá. É o trânsito. O lufa-lufa. O pega-pega. O corre-corre. O snif-snif. O empurra-empurra. O calor memorável que derrete o cérebro com seu vapor. A pressão de todo mundo querer tirar o atraso do ano todo, mas com o seu pelo, pedindo coisas para ontem. E tem as propagandas, apelos e musiquinhas, as inevitáveis vinhetas de tevê, cada vez mais falsas, porque os coitados também não têm mais o que inventar. Por mim, de tudo, só sobrariam as luzinhas decorativas que adoro ver piscando por aí.
Mas, como pouco adianta fazer balanço do ano, vamos fazer do tempo? A coisa está tão rápida, mas tão alucinadamente rápida, que até criança já fala em "antigamente"; daqui a pouco elas vão começar a escrever biografias contando como sobreviveram no mundo em que a gente as colocou.
Quem imaginaria mudanças tão drásticas que veríamos nas últimas décadas? Mesmo aquelas pelas quais a gente pelejou passaram de nossa imaginação. Eu lutei pela libertação da mulher e pelo reconhecimento, pelos homens, de seu lado feminino. Mas pensei que não estaria aqui para presenciar homens tocando mulheres para fora das cozinhas, felizes com seus aventais, receitas e panelas. E, por mais otimista que seja a vida inteira, diria ser impossível ver tantas mulheres em postos de comando fundamentais, chefiando famílias, morando sozinhas, andando de mãos dadas e aos beijos nas ruas com outras mulheres.
Homens passeando felizes com seus cachorrinhos/ totós (tudo bem que vários ainda aproveitam justamente esse momento para dar, digamos, "aquela" telefonada básica; antes, era no orelhão, agora, com os seus idolatrados celulares) ou carregando, faceiros, sacolinhas de supermercado. Lembro que isso, até há pouco, era a "morte", e vejam que sou da cidade mais avançada do país e sempre morei na região onde nascem as tendências. Quem diria que eu veria os todo-poderosos machos passando cremes e etceteras. E tantos homens amando outros homens tão livremente. Muito bom.
Quem diria que o poderoso Japão, onde imaginávamos o futuro, tenha sido ultrapassado pela China que se espalha, e ainda mantém seus rigores execráveis? Nem sei como ainda não voltaram a proliferar restaurantes da culinária chinesa como era antes da invasão dos sushis e sashimis.
Quem diria que veríamos a Europa pedir água?
Por mais jovem que a pessoa seja há de se espantar, porque também conhece: 50 anos de Beatles. 50 anos de Rolling Stones. Meio século. É muito tempo. E, no caso dos Rolling Stones, os véinhos ainda dão um caldo e botam muito para quebrar, rock n`roll com suas bocas grandes, rugas e rusgas. Madonna, 54, já veio e já voltou. Prince, outros 54. Caetano, Gil, Milton, 70. Roberto e Erasmo, 71. Melhor parar por aqui para não causar depressão em mais ninguém.
Tanto tempo. Mas ainda não aprendemos que as guerras não levam a nada, que religiões não se misturam com política e poder, nem chiclete com banana.
Já conhecemos o violento e devastador poder de revide da natureza. Mas também não parece que aprendemos muito com isso.
Seguimos o caminho. Os dias passam, o ano que vem já tá aí. E lá no outro vai ter Copa. Andamos sempre com a cabeça longe, no futuro. Mas ainda não sabemos como lidar com ele. Muito menos o que fazer para chegar lá.
É isso que dá a angústia.
...São Paulo, quase virando o velocímetro, 12-13
...*Marli Gonçalves é jornalista - Nem em sonhos, antes, pensou que poderia praticamente ser um jornal inteiro. Que Niemeyer morreria. Que o Lula se meteria numa encrenca dessas, e muito menos que seria tão covarde com uma mulher que parece ter amado.
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Mais Marli em
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