capa | atento olhar | busca | de última! | dia-a-dia | entrevista | falooouu
guia oficial do puxa-saco | hoje na história | loterias | mamãe, óia eu aqui | mt cards
poemas & sonetos | releitura | sabor da terra | sbornianews | vi@ email
 
Cuiabá MT, 24/09/2024
comTEXTO | críticas construtivas | curto & grosso | o outro lado da notícia | tá ligado? | tema livre 30.752.080 pageviews  

De Última! Só lendo para acreditar

TEMA LIVRE : Xico Graziano

Outras colunas do Tema Livre

Chico Bento e a imagem do campo
20/08/2013

Terminou com farol baixo o Congresso Brasileiro do Agronegócio, realizado recentemente na capital paulista. Seus participantes ficaram com a impressão de estar discutindo os mesmos problemas há anos, sem avanço na agenda. Percebem o enfraquecimento do Ministério da Agricultura. Parece até que a agricultura não tem importância na vida nacional.

Essa frustração pega longe. Nas fronteiras do Centro-Oeste, onde mais brilha a produção agropecuária, os produtores rurais não conseguem entender por que razão as ferrovias, hidrovias e rodovias nunca saem do papel. Estatísticas são conhecidas e consequências, avalizadas: sem boa logística os ganhos de produtividade dentro da porteira se esvaem pelos tortuosos e esburacados caminhos pós-colheita. Fora os discursos, nada acontece.

Assim como não anda, ao contrário, regride, a agricultura energética. Avançam as energias renováveis em todo o mundo, com decidido apoio público; por aqui, no país campeão mundial da fotossíntese, se estimulam os combustíveis fósseis. Mata-se o etanol, nossa "galinha dos ovos de ouro". Nos grãos, anuncia-se com estardalhaço crédito farto para o plantio, mas o seguro rural continua fora do jogo. Resultado: mais endividamento, menos garantia na renda agrícola.

A pesquisa com biotecnologia, que deveria deslanchar, encontra-se freada no acesso aos recursos genéticos da biodiversidade. Problemas variados. Fiscais do trabalho enxergam escravos onde bem entendem. Indígenas aculturados, apoiados pelo governo, tornam-se invasores de terras lavoradas, enquanto verdadeiros índios, abandonados pelo mesmo governo, desfalecem nas aldeias. Aumenta a insegurança jurídica da propriedade rural.

Se não fosse a pujança do campo, a economia brasileira estaria bem pior. No primeiro trimestre de 2013 o setor rural cresceu 9,7%; os serviços, 0,5%; e a indústria mostrou queda de 0,3%. A balança comercial do agronegócio no ano passado apresentou um superávit de US$ 79,4 bilhões, no mesmo período a indústria registrou déficit de US$ 94,9 bilhões. Quer dizer, os agronegócios pagam as contas externas do País. Em retribuição, migalhas.

Na geração de empregos, cerca de 15 milhões de pessoas trabalham nas atividades agrícolas, quase 20% da população economicamente ativa (PEA). Para comparação, nos EUA apenas 2,7% da PEA milita no agro. Embora o avanço da tecnologia, principalmente a mecanização, poupe emprego, a demanda por gente qualificada segue firme, principalmente nas recentes zonas de expansão agropecuária, onde faltam tratoristas, mecânicos, serviçais variados. Existe um verdadeiro "apagão de mão de obra".

Por que a agricultura brasileira, sendo tão importante, recebe pouca atenção da sociedade? Por que a política pública desmerece o campo? As respostas devem ser buscadas em sua representação simbólica: a imagem. Aqui reside o xis da questão. Na Europa e nos EUA a sociedade olha o campo de forma positiva, sabendo que sua permanência na terra propicia a segurança alimentar. Ademais, manter a população no campo significa menos disputa pelo emprego na cidade.

No Brasil, infelizmente, ao invés de valorizar, a urbe desdenha o campo. Em que pese a modernidade ter avançado, a opinião pública nacional ainda mantém uma imagem atrasada, quase sempre negativa, do mundo rural. Que razões levam a sociedade brasileira a menosprezar, a quase esquecer sua agricultura? Por que, ao contrário dos países desenvolvidos, nosso setor rural se encontra tão estigmatizado?

Difíceis são as respostas. Primeiro, a ocupação histórica. O Brasil iniciou sua agricultura com base no latifúndio e na escravidão. Os coronéis do sertão e, depois, a oligarquia agrária formaram um contraste marcante da opulência com a miséria rural. Mais tarde, já nos anos 1950, ao latifúndio, juntamente com o imperialismo, se imputou todo o mal que freava o progresso da Nação. Essa carga histórica, e ideológica, pejorativa permanece até hoje na consciência coletiva, sendo cultivada nos rançosos livros escolares. A imagem repudiada de outrora ofusca o brilho do presente.

Envolve, também, razões culturais. O Brasil rapidamente transitou de sociedade agrária para industrializada. O violento êxodo rural inchou as cidades. Novos valores, urbanos, passaram a predominar fortemente, sem tempo para acomodações. Resultado: a agricultura virou sinônimo de passado. Os famosos filmes de Mazzaropi, a começar do impiedoso Jeca Tatu (1959), ajudaram a substituir a imagem bucólica pelo preconceito.

No ambientalismo também se encontram justificativas. O Brasil ainda incorpora fronteiras agrícolas - e, portanto, derruba florestas e cerrados - numa época em que a consciência ecológica domina a elite da civilização pós-industrial. Antes, desmatar era sinônimo de progresso; agora, de destruição. Para não falar do uso descuidado de agrotóxicos, que macula a estampa da agricultura.

Como mudar essa situação? Como mostrar à sociedade que a agricultura não é problema, e sim solução para o Brasil?

O desafio passa pela melhoria da comunicação. Mas, com ela, deve-se implementar a lição de casa, e esta atende pelo nome de "agricultura sustentável". Mais, ainda: o ruralismo precisa renovar suas lideranças para se conectar com a juventude, trocar o discurso tradicional, chorão, pela atitude proativa. Investir no marketing para fortalecer sua posição na sociedade.

Maurício de Souza anunciou recentemente que Chico Bento vai estudar Agronomia. Que legal! Tomara que a inspiração dos quadrinhos traga uma mensagem positiva sobre nossa agricultura. Pode manter o sotaque puxado. Não pode discriminar.


...

*Xico Graziano é agrônomo, foi secretário de Agricultura e secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. E-mail: xicograziano@terra.com.br


OUTRAS COLUNAS
André Pozetti
Antonio Copriva
Antonio de Souza
Archimedes Lima Neto
Cecília Capparelli
César Miranda
Chaparral
Coluna do Arquimedes
Coluna do Bebeto
EDITORIAL DO ESTADÃO
Edson Miranda*
Eduardo Mahon
Fausto Matto Grosso
Gabriel Novis Neves
Gilda Balbino
Haroldo Assunção
Ivy Menon
João Vieira
Kamarada Mederovsk
Kamil Hussein Fares
Kleber Lima
Léo Medeiros
Leonardo Boff
Luciano Jóia
Lúcio Flávio Pinto
Luzinete Mª Figueiredo da Silva
Marcelo Alonso Lemes
Maria Amélia Chaves*
Marli Gonçalves
Montezuma Cruz
Paulo Corrêa de Oliveira
Pedro Novis Neves
Pedro Paulo Lomba
Pedro Pedrossian
Portugal & Arredores
Pra Seu Governo
Roberto Boaventura da Silva Sá
Rodrigo Monteiro
Ronaldo de Castro
Rozeno Costa
Sebastião Carlos Gomes de Carvalho
Serafim Praia Grande
Sérgio Luiz Fernandes
Sérgio Rubens da Silva
Sérgio Rubens da Silva
Talvani Guedes da Fonseca
Trovas apostólicas
Valéria Del Cueto
Wagner Malheiros
Xico Graziano

  

Compartilhe: twitter delicious Windows Live MySpace facebook Google digg

  Textos anteriores
26/12/2020 - MARLI (Marli Gonçalves)
21/12/2020 - ARQUIMEDES (Coluna do Arquimedes)
20/12/2020 - IDH E FELICIDADE, NADA A COMEMORAR (Fausto Matto Grosso)
19/12/2020 - 2021, O ANO QUE TANTO DESEJAMOS (Marli Gonçalves)
28/11/2020 - OS MEDOS DE DEZEMBRO (Marli Gonçalves)
26/11/2020 - O voto e o veto (Valéria Del Cueto)
23/11/2020 - Exemplo aos vizinhos (Coluna do Arquimedes)
22/11/2020 - REVENDO O FUTURO (Fausto Matto Grosso)
21/11/2020 - A INCRÍVEL MARCHA DA INSENSATEZ (Marli Gonçalves)
15/11/2020 - A hora da onça (Coluna do Arquimedes)
14/11/2020 - O PAÍS PRECISA DE VOCÊ. E É AGORA (Marli Gonçalves)
11/11/2020 - Ocaso e o caso (Valéria Del Cueto)
09/11/2020 - Onde anda a decência? (Coluna do Arquimedes)
07/11/2020 - Se os carros falassem (Marli Gonçalves)
05/11/2020 - CÂMARAS MUNICIPAIS REPUBLICANAS (Fausto Matto Grosso)
02/11/2020 - Emburrecendo a juventude! (Coluna do Arquimedes)
31/10/2020 - MARLI (Marli Gonçalves)
31/10/2020 - As nossas reais alucinações (Marli Gonçalves)
31/10/2020 - PREFEITOS: GERENTES OU LÍDERES? (Fausto Matto Grosso)
26/10/2020 - Vote Merecimento! (Coluna do Arquimedes)

Listar todos os textos
 
Editor: Marcos Antonio Moreira
Diretora Executiva: Kelen Marques