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Curto&Grosso O que ainda será manchete

TEMA LIVRE : Marli Gonçalves

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O Horror bem diante de nós. E do nosso lado.
23/02/2014

Chega! Vamos parar com isso logo, que o tema não é brincadeira, nem para se falar, nem para se divertir com os amiguinhos da internet, tão mauzinhos que são, tanto quanto uns e outros gostam de gargantear, tão mascarados quanto os que estão nas ruas. Dá nojo. É o que dá. Sinceramente falando. Não somos animais para matar, torturar, esquartejar, muito menos para amarrar em postes.

Então, tudo era mesmo mentira? Nascida bons anos depois do pós-guerra cresci ouvindo uma promessa só, na qual até acreditava, mas está ficando cada dia mais difícil. Nunca mais o mundo permitiria novamente o horror, os genocídios, sempre haveria prevenção mundial; nunca mais o horror do holocausto, nunca mais o horror das matanças por diferenças sejam de nacionalidade, costumes, religião ou etnias. Nunca mais, nunca mais, nunca mais.

Onde é que ficaram essas promessas? Nos discursos dos líderes que nos dias seguintes costumam fechar a cara, ameaçar, lançar notas de solidariedade, e - invariável - marcar reuniões para discutir sanções? Pompas e circunstâncias, com ar condicionado, limusines, segurança extraordinária. Pose para a foto. Clic.

Do lado de fora, no entanto, bang, bang.

De quando nasci até hoje - literalmente, até hoje - são milhões de mortos por violências e violações em todos os continentes. Em guerras de poder, religião, territoriais. Aqui também matamos e morremos. Na Argentina, matamos e morremos. No Chile, também morremos mais que matamos. Na Colômbia, no México. E ainda nos chamamos humanos?

Todos os dias contamos baldes de mortos, na Síria, Egito, lá para os lados do Afeganistão, e agora na Ucrânia e, chegando perto, pertinho, da incongruência ditatorial, corre sangue nas ruas da Venezuela. A Rússia segrega. Cuba cala e esconde. A China censura. As Coreias se encarniçam. A África deixa morrer.

Lição? Aprendizado? Qualquer imbecil que fale qualquer abobrinha pró-violência, inclusive contra pés-rapados que são, sim, problemas, mas da polícia, agora ganha até abaixo assinado de orgulhoso apoio. Os casos se repetem, pipocam, com requintes de crueldade que essa semana chegaram até a alimentar um formigueiro. O nome disso é barbárie. Justiça é outra coisa.

Problema é que não vivemos na mitologia, e esses relatos são reais. Prometeu roubou o fogo celeste para ofertá-lo aos homens. Foi condenado por Zeus a ficar acorrentado no alto de um rochedo, e aonde todos os dias um pássaro vinha comer-lhe um pedaço do fígado. Mas, vejam que até esta história teve um fim feliz: Prometeu foi salvo por Hércules que pelo que se nota tinha muita força, e bom coração.

Onde andará o nosso Hércules? Aquele que virá para inocular bom senso? Aquele que desamarrará as cordas das ditaduras, dos exércitos perfilados, das ordens aceitas sem questionamento? Esperam que venha de onde? Um Papa é pouco, falando do púlpito, do balcão da Praça. Sua pomba branca da paz foi esmigalhada pelos gaviões numa simbólica imagem que vimos este mês. Prenúncio e afirmação desses tempos negros.

Realmente perplexa com o que leio e ouço praticamente obrigada, mas ouço, porque os meus ouvidos e os olhos estarão atentos enquanto tiver vida, me surpreendo com as reações insípidas ao noticiário do dia-a-dia. Amanhã tem mais, e mais depois de amanhã. Parece sempre piorando esse mundo, desgovernado ou distraído. Pior: sempre dividido. Nunca teremos consenso?

Busco nas belezas dos esportes das Olimpíadas de Inverno a imagem mais simples do que estamos fazendo: patinando. Patinamos na política internacional. Patinamos nas reais mudanças de comportamento. Escorregamos feio ao propor violência, medo e ameaças para acabar com a violência, o medo e as ameaças. Patinamos. Patinamos tanto que todos os dias ainda sabemos de mortes e surras em mulheres que dentro de suas casas são agredidas e obrigadas a calar, por exemplo, quando pensávamos que nunca mais.

Patinamos. E escorregamos feio.

...

São Paulo, 2014. E isso não é Carnaval.

...

*Marli Gonçalves é jornalista - Justamente para poder bater nessa tecla todos os dias.

...

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