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TEMA LIVRE : Xico Graziano

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Mordida na banana
27/05/2014

Quando o lateral Daniel Alves, jogador do Barcelona, deu uma mordida naquela banana atirada dentro do campo de futebol, esconjurando com seu inusitado gesto a intolerância humana, todos aplaudimos.

Depois, confesso, meu pensamento de agrônomo se desviou para outro assunto: por que, afinal, a coitada da fruta carrega essa maledicência associada ao preconceito racial? Difícil explicar.

A família botânica das musáceas origina-se nas regiões tropicais do Sudoeste Asiático. A Índia lidera o ranking mundial da produção de bananas, seguida por Filipinas, China, Equador e Brasil.

Certamente os cachos da Musa spp têm sido descascados pelos peludos símios naquelas terras de olhos puxados desde seu surgimento no planeta Terra.

Acontece, porém, que o preconceito racista se originou aqui, no Ocidente, onde os macacos, como os nativos do Brasil, só conheceram uma banana após o Descobrimento. A fruta, afinal, veio trazida pelos portugueses.

Um macaco-prego ou um bugio gostam mesmo é de coco babaçu ou de caroço de jerivá, ambos frutos de palmeiras nativas. Mas pegou a fama de a exótica banana ser seu alimento predileto. Vá entender.

De forma semelhante, ninguém jamais explicou ao certo por que Carmen Miranda, ao se exibir para plateias norte-americanas, se empetecava da cabeça aos pés com cachos e folhas, cantando seu inesquecível refrão "yes, nós temos banana". Os gringos adoravam.

Curioso. A fruta serve também aqui, no Brasil, para figuras de linguagem inusitadas, algumas depreciativas.

"Plantar bananeira", em certas regiões, como em Araras (SP), minha terra natal, significa ficar de ponta-cabeça, ou seja, virar-se com as pernas para cima.

O sentido da expressão dá a entender, obviamente, que nas plantações de banana tal prática é comum. Ledo engano.

Na formação dos pomares, as mudas, chamadas perfilhos, são colocadas dentro de profundas covas sempre em sentido normal, com as raízes para o solo e a gema apical para cima.

Ora, como se explica, então, essa expressão popular? Jamais encontrei respostas.

Noutro caso, a fruta serve ao raciocínio irônico. Comumente as pessoas, numa molecagem, quando querem desdenhar algo, fazem um conhecido sinal com os braços entrelaçados, cruzando o punho com o antebraço: "Aqui, ó, uma banana para você".

Soa, claro, como se a fruta simbolizasse algo rejeitável. Pior de tudo, especialmente aos olhos dos bananicultores, é alguém dizer que uma coisa qualquer, por barata na compra, está com "preço de banana".

Imaginem como se chateiam os agricultores do ramo. É como se nada valessem.

Não tem sido fácil a vida dos bananicultores nacionais. Além da desvalorização da fruta no mercado, doenças terríveis têm ameaçado as plantações há tempos.

A mais recente e preocupante delas, a Sigatoka negra, causada por um fungo, chegou ao Brasil em 1998, trazendo pesadelos ao bananal.

Técnicos apressados chegaram a afirmar que estariam liquidados os pomares e seria decretada a extinção das lavouras. Exagero.

A boa agronomia, embora arduamente, está conseguindo enfrentar mais essa peleja patogênica. Sorte dos consumidores.

Fruta mais consumida no mundo, unindo sabor, sustância e saúde, a banana é adorada pelos esportistas, pois estes creem que suas benesses combatem as cãibras. É verdadeiro.

A falta de potássio no organismo leva os músculos a se contraírem e uma banana média supre 30% das necessidades diárias de potássio do corpo humano.

Estudo realizado nas Filipinas indica, ademais, que ingerir duas a três bananas por dia combate a depressão e melhora o humor das pessoas.

O efeito benéfico atribui-se ao elevado conteúdo de triptofano, responsável pela sensação de bem-estar.

Mal-estar. Nesse estado, apreensivos, se encontram atualmente os bananicultores do Vale do Ribeira (SP), tradicional região produtora da mais gostosa fruta encontrada na quitanda. O grande temor desta vez vem do Equador.

Ou melhor, da caneta do governo brasileiro. Acontece que, pressionado pelos interesses de grandes empresas norte-americanas, o Ministério da Agricultura cogita de autorizar a importação da fruta oriunda desse país.

Se concretizada, a medida poderá pôr em risco a produção da banana nacional. Razões da competitividade.

Apenas cinco multinacionais controlam a produção e o comércio internacional das excelentes bananas produzidas no Equador. Trabalham com elevada tecnologia, alta escala, tudo mecanizado.

O padrão impecável de qualidade permitiu conquistar o mercado da Europa e dos EUA, locais onde nada se produz de banana por causa do frio do inverno.

Mas suas exportações caíram em razão da crise econômica lá fora e começou a sobrar banana no mundo. Azar do Brasil.

Pelas regras do comércio internacional -- nosso próprio país lutando há décadas para derrubar as barreiras do protecionismo agrícola --, sabe-se ser complicado fechar fronteiras.

Normalmente se utiliza uma saída técnica para impasses dessa natureza, invocando problemas fitossanitários, ou seja, a ameaça, que sempre existe, da introdução externa de patógenos (fungos, bactérias, vírus) nas lavouras internas.

Tenta-se, assim, não escancarar as portas das importações, dado o perigo de elas arrasarem a produção local.

No caso brasileiro, os produtores ainda padecem de uma desgraça apelidada de "custo Brasil": elevada carga tributária, logística deficiente, legislação trabalhista, burocracia. Concorrência desleal.

Nesse governo, que nunca decide nada, resta uma alternativa: ao contrário do Daniel Alves, se essa banana do Equador aparecer, que ninguém a morda.

Seria um boicote do consumidor em defesa do emprego no campo.


...

*AGRÔNOMO, FOI SECRETÁRIO DE AGRICULTURA E SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO
DE SÃO PAULO. E-MAIL: XICOGRAZIANO@TERRA.COM.BR


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