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TEMA LIVRE : Valéria Del Cueto
MT em nova polêmica carnavalesca no papel de vilão
08/01/2017
Dá para acreditar? Todo mundo no mesmo saco, um Estado inteiro no erro? Nada disso!
Assim se criam as polêmicas virais. Uma informação retirada do contexto. A afirmação categórica que a unidade é o todo. Com um tom de indignação se desconstrói o conceito previamente deturpado.
Enredo pobre e medíocre é assim. Eis a indignada manchete com o conteúdo seguindo o script: “Escola de samba do RJ vai criticar agro na Sapucaí”.
As reações nas redes sociais, diante do apresentado, foram superlativas. Negativas em sua esmagadora maioria.
Com ampla utilização de termos chulos, preconceitos variados explícitos e assinados contra a escola, o carnaval, o povo carioca e o Rio de Janeiro como um todo.
Só a página que repercutiu o alerta indignado original teve mais 700 comentários até o fechamento desta edição. Muitos impublicáveis em veículos de comunicação.
Agora, o Rio é a Geni. Aquela em que jogam pedras depois de vários enredos carnavalescos, patrocinados ou não, muito bem-sucedidos sobre o agronegócio.
“Parábola dos Divinos Semeadores”, em 2011, pela Mocidade Independente de Padre Miguel (CNA). “A Vila canta o Brasil, celeiro do Mundo”, deu o último campeonato à azul e branca, em 2013 (Basf). O vice-campeonato de 2016 foi da Unidos da Tijuca com “Semeando Sorriso, a Tijuca festeja o solo sagrado”.
Foi neste último que vimos passar pela avenida as matas seriam derrubadas, arados, colheitadeiras, aviões agrícolas para aplicação de defensivos.
E, sim, uma fantasia similar a uma das que estão causando protestos. As composições de carro com lindas larvas do último carnaval reaparecem numa ala chamada “fazendeiros e seus agrotóxicos”. Mas lá podia...
“Olhos da cobiça” e “Doenças e pragas” fantasias de alas comerciais, são apresentadas como provas cabais de que com o enredo de 2017 a Imperatriz é inimiga mortal do agronegócio.
Três fantasias num universo de mais de 30 alas num total 5 mil componentes fazem o link megalômano, um canal suficiente para defenestrar e destruir o universo inteiro do carnaval e botar no mesmo balaio de (pré)conceitos todos os envolvidos no processo e adjacências.
Mas afinal, qual o enredo da escola de Ramos?
“Xingu, o clamor que vem da floresta”.
Cá entre nós, serão todos os agricultores do Brasil os vilões citados no samba enredo que diz que “o belo monstro rouba a terra de seus filhos, devora e seca as matas e seca os rios, tanta riqueza que a cobiça destruiu”?
Ou seria... Belo Monte, a usina hidrelétrica?
O que será pior: quem veste a carapuça de destruidor do meio ambiente ou quem deveria reconhecer que, por não ter feito a lição de casa, novamente a nota de interpretação de texto não dá pra passar de ano?
A direção da Imperatriz Leopoldinense não vai se manifestar sobre o episódio.
Com a palavra Cahê Rodrigues, carnavalesco e autor do enredo da Imperatriz Leopoldinense.
Você esperava uma reação dessa proporção do “agro” ao enredo?
- Sempre me preocupo muito com uma mensagem de amor e paz. Fujo de todo tipo de polêmica, de agressão ao próximo. Eu nunca fui um carnavalesco de entrar em polêmicas.
Desde o início o objetivo desse tema foi exaltar os povos do Xingu dando voz a esses índios que lutam durante tanto tempo, tantas décadas, em prol da sua liberdade, do respeito com a sua terra, pela sua cultura, pelo seu povo.
A proposta do enredo da Imperatriz é uma exaltação aos índios do Xingu. Eu realmente não esperava, uma repercussão negativa na área do agronegócio.
O enredo do Xingu é um enredo patrocinado?
- Esse ano a Imperatriz não teve nenhuma proposta de enredo patrocinado. Trouxe três ideias de enredo como eu sempre faço. E, é claro, que eu tinha um carinho especial por esse tema do Xingu, porque já era um desejo meu de um dia poder exaltar os índios em algum dos meus enredos.
O agronegócio é um tema muito explorado no carnaval carioca...
- Várias escolas já fizeram carnavais muito bem-sucedidos homenageando o agronegócio. A própria Imperatriz, no último carnaval fez uma homenagem a vida do sertanejo, a vida do caipira. Exaltou o trabalho do agronegócio, dos agricultores, na figura do caipira, do homem do campo e com muito orgulho levou essa história para o sambódromo.
Alguém do setor te procurou para dialogar ou pedir informações sobre a abordagem do enredo?
- Ninguém me procurou pessoalmente, podem ter procurado a assessoria de imprensa da escola. Para mim ninguém ligou. Acho um pouco demais e desnecessária a posição agressiva de algumas pessoas que desconhecem a proposta de carnaval da Imperatriz e estão falando bobagens e coisas sem sentido, agredindo o carnaval da Imperatriz e o carnaval carioca.
Essas pessoas realmente não devem ter conhecimento da grandiosidade que essa festa representa para o país, o número de empregos que o carnaval gera o ano inteiro.
Eu não tenho o que falar, o que responder para essas pessoas que realmente estão a fim de aparecer e de agredir desnecessariamente uma escola que está fazendo um projeto lindo, um projeto de respeito ao ser humano.
Um projeto que pretende exaltar não só os índios do Xingu, mas todo indígena brasileiro.
Esse enredo é uma ode a todos os índios do Brasil, não só os índios do Xingu e, infelizmente, eu não tenho como mudar a história.
A proposta do enredo não é agredir ninguém, mas eu não vou omitir nem vou deixar de mostrar na avenida aquilo que de fato agride, sim, a vida do índio.
Ele depende da floresta para sobreviver, depende da água para pescar o seu peixe e o índio depende do ar puro para respirar assim como todos nós.
O índio depende desse verde. Por isso o clamor da floresta que a Imperatriz vai levar para a avenida é para que todos possam olhar para as nações indígenas do Brasil com respeito e com o carinho que eles merecem.
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*Jornalista, fotógrafa, gestora de carnaval e porta-estandarte do Saite Bão. Essa crônica faz parte da série “É carnaval”, do SEM FIM... delcueto.wordpress.com
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