¨E o que os deputados fazem? Não roubam também?¨ 14/07/2006
- O Estado de S.Paulo
Líder do PCC disse que a facção criminosa ajuda a refrear a violência ¨natural¨ dos presos.
No depoimento à CPI do Tráfico de Armas, em 8 de junho, o líder do PCC, Marcos Camacho, o Marcola, afirmou acreditar na origem social da violência, se disse leitor de Nietzsche, Voltaire e Victor Hugo, declarou que não acredita em recuperação de criminosos, e, discutindo com um parlamentar que atribuiu a ele a liderança da organização criminosa, atacou: ¨E o que que os deputados fazem? Não roubam também?¨
Trechos do depoimento foram publicados ontem no blog do jornalista Reinaldo Azevedo.
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Leia alguns deles abaixo:
Marcola - Eu acho que é o seguinte. Nós todos somos praticamente filhos da miséria, todos somos descendentes da violência, desde crianças somos habituados a conviver nela, na miséria, na violência. Isso aí, em qualquer favela o senhor vai ver um cadáver ali todo dia. Quer dizer, a violência é o natural do preso, isso é natural. Agora, essas organizações (como o PCC) vêm no sentido de refrear essa natureza violenta, porque o que ela faz? Ela proíbe ele (o preso) de tomar certas atitudes que pra ele seria natural, só que ele estaria invadindo o espaço de outro, o senhor entendeu? De outro preso. E elas vêm no sentido de coibir isso mesmo. É claro que se...
Paulo Pimenta - Certo, mas qual é a contrapartida que a organização exige dele? Ele paga para isso?
Não, ninguém paga dentro da prisão pra nada, acabou isso. Houve uma época que parece que pagavam R$ 20, alguns presos que são ligados a uma determinada organização. Eram R$ 20 de caixinha, mensalmente, pra que pudessem ter advogados, assistência jurídica, muitas vezes... Só que isso foi abolido. Dentro do sistema penitenciário, ninguém dá R$ 1 pra ninguém. Agora, é claro que, por exemplo, pra impor essa política de respeito... Por exemplo, dentro do sistema penitenciário de São Paulo, é proibido o uso de crack, de uma droga chamada crack.
Pimenta - Isso foram os próprios presos que estabeleceram essa regra.
Foi essa organização criminosa, que viu a degradação a que os presos estavam chegando e viu que estava totalmente sob... em falta de controle. Não tinha como controlar o crack dentro da prisão. Então foi simplesmente abolida, pro cara... Como se abole uma droga que faz o cara roubar a mãe, matar a mãe e tudo o mais? É difícil. Então, tem que mostrar a violência e falar: ¨Ó, cara, se você usar isso, pode te acontecer...¨.
(...)
O Brasil tem uma fronteira muito grande. É óbvio como é que entra arma.
Pimenta - Eu tenho uma opinião. Quero saber qual é a tua.
Não é questão de opinião, é questão de o senhor pegar um delegado da Polícia Federal, pegar quem conhece a situação... Não tem que ter opinião, tem que ter a certeza. A certeza é esta: o Brasil tem fronteiras enormes e dificilmente eles vão conseguir policiar o tempo todo ela toda. Então isso vai dar margem pra entrada não só de armas, mas de tudo que se imaginar. É óbvio, muito simples também. Tem a Lei do Abate, que não permite mais vir por cima, então por onde é que vão vir as armas?
Pimenta - Terrestre.
Não tem outro jeito.
Pimenta - Pelo Paraguai.
Pode ser. Paraguai, Bolívia, Colômbia. Tem várias...
Pimenta - Várias rotas.
Muito simples.
(...)
Moroni Torgan - Em todos esses livros que tu lês é a mesma coisa. Agora, eu só quero dizer o seguinte: eu ia acreditar em PCC, que fosse uma organização boa, se ele trabalhasse para pagar educação para o preso, se ele trabalhasse para conseguir emprego.
Trabalhasse como?
Moroni - Ué! Com o dinheiro. Esse que vocês arrecadam.
Do tráfico e do crime?
Moroni - Não. O dinheiro que vocês arrecadam normalmente.
Esse dinheiro é ilícito. Não é ilícito? Como que a gente...
Moroni - Não pode arrecadar o dinheiro licitamente, não?
Como?
Moroni - Todo preso que sai para rua, para ele sair em condicional, ele não tem que trabalhar?
Senhor, mas só tem marginal no nosso meio. De onde eu vou tirar dinheiro lícito?
Moroni - Então, tu não acredita em recuperação de marginal? Não acontece recuperação?
Eu não vejo como, porque...
Moroni - Com o sistema de vocês...
Até hoje eu não vi.
Moroni - Não acontece recuperação nenhuma?
Não.
Moroni - Nenhuma?
Não existe. Claro que não.
Moroni - Nenhuma.
A gente nunca falou que existe.
Moroni - Vocês incentivam o cara a continuar bandido o resto da vida.
Isso é o que o senhor está dizendo.
Moroni - Não. Isso é o que tu estás dizendo junto comigo. Tu mesmo disseste que...
Não. Eu estou dizendo que nunca vi...
Moroni - ...não tem ressocialização nesse sistema.
E tem?
Moroni - Nesse sistema não tem de jeito nenhum.
Qual o sistema que tem?
Moroni - O sistema que tem é o sistema que leva para a educação...
Onde tem isso?
Moroni - ...no sistema que leva para a profissionalização.
Onde?
Moroni - Em muitos Estados há isso.
Me fala um Estado.
Moroni - Eu tenho. O Paraná tem, tem unidade disso.
O Paraná tem o quê?
Moroni - Ceará tem unidade disso.
Paraná tem o quê? Rebeliões.
(...)
O senhor quer me intimidar. O senhor quer me intimidar com grito. Eu não me intimido com grito.
Moroni - Essa técnica de intimidação é besteira. Não tem técnica de intimidação aqui.
Então, não grita comigo.
Moroni - Não estou gritando com ninguém.
O senhor não tem esse direito.
Moroni - Eu tenho o direito de falar com a voz que eu quiser,...
De falar.
Moroni -...na hora que quiser.
De falar, sem gritar. Com respeito.
Moroni - Agora eu quero dizer, com todo o respeito que eu tenho pela humanidade: o PCC existe para explorar os coitados dos presos que têm que sair para rua e trabalhar para eles. Tem que trabalhar, tem que ser criminoso. Se tu saíres, pagar tua pena, tu tens que ir para rua para ser criminoso.
E o que que os deputados fazem?
Moroni - Tu tens que ir para rua.
E o que que os deputados fazem? Não roubam também? Roubam para c(...), meu.
Moroni - E isso vai ser outra coisa que tu vai ser indiciado também. Disso tu vai ser indiciado também.
Só porque deputado rouba eu vou ser indiciado?
Moroni - Por desacato. Disso tu vais ser indiciado. Eu quero dizer uma coisa: tu tens que saber de uma coisa:...