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DE ÚLTIMA!

Empresário-sanguessuga envolve mais políticos no esquema
19/08/2006 - Marcelo Carneiro -- revista Veja



Em julho passado, após uma sucessão de depoimentos à Justiça Federal de Mato Grosso, o empresário Luiz Antônio Vedoin, 31 anos, implodiu o Congresso. Assumiu ter pago propina a uma centena de parlamentares e ainda revelou um esquema de tráfico de influência no Ministério da Saúde, levado à frente por José Airton Cirilo, dirigente do PT no Ceará. Na noite de quarta-feira, Vedoin recebeu VEJA em uma suíte de um hotel, em São Paulo. Ali fez novas revelações. Apontou a participação de outro senador – Antero Paes de Barros (PSDB-MT) – no esquema dos sanguessugas e disse que o lobby do petista Cirilo não se limitou à pasta da Saúde: chegou também ao Ministério das Cidades e ao das Comunicações, além do BNDES e da Petrobras. Sobre a sua relação com os deputados, resumiu: ¨Era um negócio: toma-lá-dá-cá¨.

Como a Planam conseguiu montar um esquema tão amplo de corrupção dentro do Congresso?


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Essa não era a nossa intenção. No início, fazíamos projetos de assessoria e planejamento para municípios. Começamos a montar e vender ambulâncias para as prefeituras apenas em 1999. Foi nessa ocasião que meu pai conheceu o deputado Lino Rossi (PP-MT). Eles trocaram de malas sem querer no avião e, quando o deputado passou na Planam para destrocá-las, começamos a conversar sobre o nosso trabalho com as prefeituras. O deputado disse que também tinha interesse, para ampliar sua base eleitoral.

Foi o deputado Rossi quem o apresentou aos outros parlamentares?

Ele nos apresentou muita gente. Os deputados iam ao seu gabinete. Às vezes, também à casa dele, em festas e churrascos. Eram sempre grupos de dois ou três. Isso começou em maio de 2000. No início de 2001, já tínhamos oito parlamentares trabalhando para a gente, a maioria em primeiro mandato.

Como parlamentares de primeiro mandato tinham tanta desenvoltura para fazer negócios com suas emendas individuais ao Orçamento?

Um candidato a deputado federal gasta entre 2 e 3 milhões para se eleger. Como vai pagar essa dívida com um salário de 15.000 reais? Ele já chega tentando fazer algum tipo de negócio. Se não for dessa forma, será de outra. Muitos tinham total familiaridade com o esquema das emendas. Alguns já diziam: ¨Eu quero um porcentual da emenda que for indicada, te levo aos prefeitos para você armar as licitações e fazer a venda¨. Era negócio, um toma-lá-dá-cá. Não tinha amizade, não tinha conversa. Em geral, eles recebiam 10% do valor da emenda apresentada.

Mas houve casos em que o senhor comprou eletrodomésticos e deu até carros de presente.

É verdade. O deputado Wanderval Santos (PL-SP) pediu para pagarmos uma parcela da prestação da BMW dele – e nós pagamos cerca de 50.000 reais. No caso do Lino Rossi, ele tinha se separado e estava montando uma nova casa. Passou numa loja, gastou 7.000 reais em fogão, geladeira, microondas, cafeteira, e pediu para a gente pagar. Tínhamos um acordo maior com o Lino Rossi. No caso de Mato Grosso, além das emendas individuais, havia as emendas de bancada. Foi aí que entraram outros parlamentares, como o senador Antero (Paes de Barros, PSDB-MT). Meu pai conversou pessoalmente com o senador, que era o líder da bancada do estado. O acordo era para a totalidade das emendas da bancada, que somavam 3,8 milhões de reais. Antero apresentou 400.000 reais e tínhamos de dar 40.000 reais de comissão. Ele pediu para passarmos o dinheiro diretamente para o Lino Rossi, que, naquele tempo, era do mesmo partido que ele (PSDB). Todos ali tinham consciência do que estava sendo feito.

O senhor tentou o mesmo esquema com a bancada de outros Estados?

Não deu tempo. Me pegaram antes.

O senhor também pagou propina em negócios intermediados no Ministério da Saúde por um dirigente petista do Ceará, José Airton Cirilo. Como foi a negociação?

Ele dizia que a liberação de nosso dinheiro no ministério só sairia com o pagamento de um porcentual. E conseguiu liberar não só esse dinheiro, mas vários empenhos de emendas ao Orçamento. O Cirilo não tinha nem mandato, mas atuava em vários órgãos. No Ministério das Cidades, ele pediu para nós fazermos os ofícios de liberação das emendas, com a assinatura do parlamentar, e foi até o então ministro Olívio Dutra para tentar o despacho. Não conseguiu a liberação. Mas, no Ministério das Comunicações, na gestão de Eunício Oliveira, ele conseguiu liberar o empenho para a compra de alguns ônibus. Ele dizia que tinha canal direto com o ministro. Só sei que o empenho saiu e nós pagamos um porcentual ao Cirilo. Ele também dizia ter acesso ao BNDES e à Petrobras, mas não citou nomes e nós não fizemos negócio nesses órgãos.

A presença do deputado Emerson Kapaz na lista dos sanguessugas causou espanto. O senhor negociou com ele o pagamento da propina?

Tratei diretamente. Assim que fui apresentado, ele logo falou em comissão. Lembro que até paguei parte de um flat que ele havia comprado, em Brasília. Nesse caso, inclusive, houve pagamento a mais, porque as emendas dele não saíram, por causa de cancelamento.

Como era feito o pagamento em espécie aos parlamentares, em pleno Congresso?

Nós levávamos o dinheiro no paletó e entregávamos no gabinete, diretamente ao deputado ou a um assessor que ele indicasse. Eu entrava tranqüilamente, em geral com 60.000 reais nos bolsos do paletó. Também entregávamos no nosso flat, em Brasília, ou em carros, no estacionamento do Congresso. No caso do deputado Júnior Betão (PL-AC), paguei 178.000 reais no estacionamento do flat. Era uma sacola de dinheiro, e ele mandou o sogro receber. No Congresso, nunca tive problema para entrar com dinheiro. Uma vez me pegaram em São Paulo, no raio X do Aeroporto de Congonhas, quando eu ia ao Paraná pagar uma comissão para o deputado Iris Simões (PTB-PR). Eu estava com 45.000 reais, disse que era pagamento de funcionários e fui liberado.

Esse esquema começou com um deputado, rapidamente passou para oito e, no fim, uma centena de parlamentares rebecia propina. Nunca passou pela sua cabeça que um dia seria descoberto?

A gente tinha medo de que tudo pudesse ruir, mas não acreditava nisso. Imaginávamos que o que a nossa empresa fazia era pequeno diante de tanta coisa que acontece em Brasília. Eu não pensei que ia ser tão problemático.

Dos dezoito parlamentares inocentados pelo CPI, oito foram acusados pelo senhor de ter feito acordo para receber propina. Contra quatro desses oito, o senhor chegou a apresentar provas. Por que a CPI os inocentou?

Não posso opinar sobre a decisão da CPI.

Por que o sengor decidiu falar à Justiça?

Só pensava em tirar o meu pai (o empresário Darci Vedoin, sócio da Planam) da prisão. Quando passei nove dias depondo, lembrei de coisas que eu até tinha esquecido – e me arrependi de muitas outras que fiz. Nada disso teria acontecido se eu não tivesse me deixado levar pelos deputados. É claro que eu também aceitava o que eles me pediam. Mas às vezes era um abuso. A partir do momento em que a gente fechava um acordo, muitos queriam um adiantamento de 10.000 ou 20.000 reais. Quando a gente não mandava o dinheiro, eles cobravam. A emenda era um produto, um pacote completo. Quem corria atrás dos prefeitos para acertar a licitação eram os deputados. Esse modelo já existia antes da nossa empresa.

O senhor acha que o seu depoimento ajudará a mudar a eleboração do Orçamento?

Eu gostaria, mas acredito que não. Se acabarem as emendas individuais, ainda continuarão as emendas de bancada, os recursos extra-orçamentários. Sempre vai haver um conchavo, uma negociata.

NOVE DIAS DE CONFISSÃO

Por nove dias seguidos, em depoimentos que duravam das 8 da manhã às 11 da noite, o empresário Luiz Antônio Vedoin detalhou à Justiça Federal o mais abrangente esquema de corrupção de que já se teve notícia no Congresso – o dos sanguessugas.

Além de apontar um a um os deputados e senadores com quem negociou, em troca de propina, a apresentação de emendas ao Orçamento para a compra de ambulâncias, o dono da Planam apresentou cópias de depósitos e transferências bancárias que comprovavam o pagamento de suborno.

A confissão de Vedoin é um bem-sucedido caso de delação premiada. A operação teve a participação decisiva do Ministério Público Federal e da Justiça Federal de Mato Grosso. Também fez parte da negociação o advogado Otto Medeiros de Azevedo Júnior, de Cuiabá, que defende a família Vedoin e o empresário Ronildo Medeiros, outro acusado de comandar o esquema.

Curiosamente, a operação do Ministério Público não tinha como foco inicial a investigação sobre os sanguessugas do Congresso, e sim uma autuação por sonegação fiscal. Foi a partir do trabalho de auditores da Receita Federal que os procuradores acionaram a Polícia Federal. Com a ajuda de escutas telefônicas autorizadas judicialmente, puderam achar o fio da meada que levou aos parlamentares corruptos.

¨Só tive a dimensão da importância do caso depois que vi a quantidade de provas levantadas na investigação. Percebi que o melhor caminho era mesmo assumir a culpa e contar tudo¨, diz Otto Azevedo, um advogado de 28 anos especializado em causas tributárias.

Antes dele, os Vedoin, que respondem ao processo em liberdade, já haviam dispensado outros dois advogados e insistiam em negar a existência do esquema dos sanguessugas

  

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