Escola não motiva e perde alunos 07/01/2007
- Antonio Gois e Luciana Constantino - Folha de S.Paulo
¨Deu preguiça de andar até a escola.¨ Essa é a primeira razão citada por Aline (nome fictício) para explicar por que parou de estudar aos 15 anos. Aparentemente, a resposta indica que foi a larga distância ou a falta de transporte público entre sua casa, no complexo da Maré (zona norte do Rio), e o antigo colégio que a fez desistir.
Com um pouco mais de conversa, porém, ela explica que a preguiça não era causada pelos 20 minutos de caminhada. O problema era outro: ¨Os professores eram muito chatos. Não sabiam explicar nada e repetiam todo mundo. É por isso que só tinha marmanjo na 6ª série [do ensino fundamental]¨. Com tanto desestímulo para aprender, ela parou e, logo depois, engravidou. Hoje, com 16 anos, é mãe de uma menina de cinco meses.
Esse breve relato da história de Aline ajuda a sintetizar em um único exemplo as principais razões que levaram 1,7 milhão de jovens entre 15 e 17 anos (16% do total) a não estudar em 2005. Para saber quem são eles, o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) elaborou um estudo com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE em que três conclusões se sobressaem:
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1) três em cada quatro desses jovens (75%) não completaram o ensino fundamental, mas a maioria (68%) ao menos chegou até a 5ª série;
2) ter tido filho diminui a probabilidade de a jovem estudar. Entre as que freqüentam a escola, apenas 1,6% é mãe, percentual que sobe para 28,8% entre as que estão fora;
3) mais do que a falta de vagas, de transporte ou mesmo a necessidade de trabalhar, é a falta de vontade de estudar que os empurra para fora do sistema de ensino. Essa razão foi identificada em 40,4% dos casos entre os que não estão em sala de aula. A necessidade de trabalhar vem depois (17,1%).
A primeira observação indica que o problema da evasão está concentrado entre a 5ª e a 8ª série do ensino fundamental. A segunda mostra que a fecundidade precoce tem impacto significativo na desistência de muitas meninas. Já a terceira sugere que, se a escola não for atraente e fizer algum sentido ao jovem, ele vai abandoná-la mesmo que suas chances no mercado de trabalho sejam nulas ou pouco convidativas.
Prova disso é que, desse 1,7 milhão de jovens fora da escola, 43,4%, ou 740 mil, não trabalham nem sequer estão procurando emprego. Mesmo quando conseguem achar um trabalho (caso de 44% dos que não estudam mais), no entanto, trata-se de emprego precário, já que apenas 8% do total de jovens fora da escola trabalhando tem carteira assinada.
O presidente do Inep, Reynaldo Fernandes, aponta a repetência como fator de desinteresse dos jovens pela escola. Com baixo desempenho, o aluno deixa de ir à aula, e os pais já não têm tanta influência para mantê-los estudando como tinham nas séries iniciais.
Para a professora de pós-graduação em educação da UnB (Universidade de Brasília) Benigna Villas Boas, as escolas precisam encontrar uma forma de avaliar o aprendizado e oferecer mecanismos de recuperação ao longo do ano.
Já Rubem Alves, educador e colunista da Folha, diz que o próprio sistema em que as escolas funcionam é pouco atrativo. Usa como exemplo o fato de as disciplinas serem ministradas separadamente. ¨Quem foi que disse que a cabeça da criança funciona como aparelho de TV em que você pode tocar uma campainha e mudar de português para matemática?¨
Na avaliação de Eliane Andrade, professora do departamento de educação da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e da UniRio, não há motivo único que leve o jovem a abandonar. Para ela, a necessidade de trabalhar não pode ser desprezada, mas o problema principal está na escola.
¨A escola não está pensando nesse menino que quer trabalhar. Dar recursos a ele é um passo importante, mas não é a solução. Não dá para ficar botando mil penduricalhos sem meter a mão na escola. Se formos acompanhar esse jovem, veremos que ele até tenta voltar várias vezes. Ele está sendo generoso com a escola, mas a escola não está sendo generosa com ele¨, diz Andrade.
Esse caminho de ida e volta foi feito três vezes por Mara Mônica da Silva, 18, aluna do programa ProJovem no município do Rio. ¨Eu até era boa aluna, mas quando chegava outubro desistia de estudar porque precisava trabalhar¨, diz.
Seu colega no programa, João Batista Cavalcante, 24, também está tentando voltar a estudar após abandonar a escola aos 15 anos, ainda na 6ª série: ¨Eu ficava sem ânimo. Acho que era rebeldia. Hoje me arrependo de ter parado¨.