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O novo peleguismo
23/07/2007 - O Estado de S.Paulo

Houve época em que parecia estar mudando, para melhor, a mentalidade dos sindicalistas brasileiros. Muitos dirigentes sindicais surgidos nas últimas décadas deveram seu prestígio junto a suas bases às críticas ao velho modelo sindical criado pela ditadura do Estado Novo chefiada por Getúlio Vargas. Na essência, esse modelo, em boa parte ainda em vigor, atrelava a estrutura sindical ao Estado, transformando-a numa correia de transmissão do governo - expressão sempre utilizada pelos que condenavam o sindicalismo varguista - e propiciando o surgimento dos pelegos, dirigentes comprometidos não com os trabalhadores que diziam representar, mas com seus interesses pessoais e políticos. Os “novos” sindicalistas diziam que seu objetivo era mudar tal modelo. Agora, seu objetivo é outro.

O que o País esperava ser o novo sindicalismo se revelou uma nova forma do velho peleguismo. Em troca do dinheiro que o governo lhes repassará, as centrais sindicais nascidas a partir da década de 1980, todas prometendo romper a estrutura varguista, agora aceitam gostosamente fazer parte dessa estrutura.

As centrais diziam que sua grande guerra seria contra o Imposto Sindical - a atual contribuição sindical -, o dinheiro que o governo retira de todos os assalariados, na base de um dia de trabalho por ano, e repassa para as organizações sindicais. É esse repasse que, na prática, subordina as organizações sindicais (sindicatos, federações e confederações) ao governo.


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As centrais sindicais, que deveriam ser sustentadas por contribuições voluntárias das entidades a elas filiadas, serão as grandes beneficiadas com a proposta do governo - com a qual concordaram alegremente - de mudar a repartição do dinheiro arrecadado como contribuição sindical. Isoladamente, o dinheiro descontado do salário de cada trabalhador parece pouco. Mas, somadas, as contribuições de todos os assalariados do País formam um bolo enorme. Nos cinco primeiros meses do ano passado, como mostrou reportagem de Carlos Marchi, do Estado, na quinta-feira, a arrecadação dessa contribuição alcançou R$ 1,24 bilhão.

Desse bolo, 60% vão para os sindicatos, 15% para as federações, 5% para as confederações e 20% para o governo (que transfere a maior parte para o Fundo de Amparo ao Trabalhador). As centrais passarão a receber 10%, fatia que será retirada da parcela do governo. A distribuição para as centrais, conforme proposta já negociada com os representantes das diversas entidades sindicais, será feita de acordo com o número de filiados de cada uma.

Quem mais ganhará será a Central Única dos Trabalhadores (CUT), o braço sindical do PT. Com base nos resultados da arrecadação de 2006, seu orçamento, hoje de R$ 6 milhões, pulará para R$ 33 milhões com o dinheiro da contribuição sindical. Na média, as centrais terão seus atuais orçamentos multiplicados por dez. As que não cumpriam as exigências mínimas para se habilitar a receber a parcela da contribuição sindical (número mínimo de filiados, base nacional, entre outras) trataram de fundir-se - mas seus antigos dirigentes estão certos de que, do ponto de vista da atuação, nada mudará, a não ser seu orçamento, que engordará muito.

Para tentar salvar a face dos dirigentes das centrais, o secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho, Luiz Antônio de Medeiros - ex-dirigente da Força Sindical, a segunda maior central do País -, diz que, num segundo passo, se tratará da extinção da contribuição sindical.

É difícil acreditar. Até agora independentes, as centrais caíram na malha da subserviência ao Estado, como observou a este jornal o cientista político Leôncio Martins Rodrigues. Sua adesão ao governo Lula, claríssima no apoio à mudança da contribuição sindical, foi antecipada no 1º de Maio deste ano, quando, em suas comemorações, todas o elogiaram.

Já mais fortes do que as confederações, federações e sindicatos de trabalhadores, as centrais juntarão à força política o poder financeiro, desequilibrando ainda mais uma estrutura sindical capenga, que adota a pluralidade na cúpula (podem existir várias centrais sindicais), mas impõe a unicidade na base (só pode haver um sindicato por categoria em sua base territorial) - e alimenta a sobrevivência do velho peleguismo, ainda que com novo discurso.

  

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