Governo tenta abafar vaias com ato de apoio no Planalto 04/08/2007
- Agência Estado
Três dias depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmar que não tem medo de vaias e de ruas, o Cerimonial da Presidência da República aproveitou ontem uma solenidade de repasse de recursos para saneamento básico, no Palácio do Planalto, para promover um ato de apoio ao próprio governo.
Da lista de convidados, que incluía prefeitos e governadores aliados e da oposição, o cerimonial escolheu dois petistas para reclamar da ¨elite¨ e dizer que o povo ¨aplaude¨ o presidente. O Planalto quer assim minimizar o impacto político das manifestações contrárias ao presidente, ocorridas nas últimas semanas.
Em conversas reservadas, Lula afirmou que a oposição e a mídia não iriam emparedá-lo e prendê-lo no Planalto. Na última terça-feira, em Cuiabá, o presidente ressaltou que ¨ninguém¨ no País colocava mais gente na rua do que ele. O Planalto, no entanto, mostra-se cauteloso em marcar novos eventos em cidades com mais de 150 mil habitantes. Com a solenidade de ontem, Lula livrou-se da tarefa de visitar 12 capitais nas quais iria anunciar obras do PAC do Saneamento.
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O Palácio tomou cuidado, porém, de não incluir, no evento de ontem, os acordos com as prefeituras do Rio Grande do Sul e do Paraná. E Lula cancelou a visita que faria a Porto Alegre, cidade de boa parte das vítimas da tragédia com o avião da TAM, no dia 17, e Curitiba. A viagem para o Sul só ocorre depois do dia 10, quando ele volta de uma viagem ao exterior.
¨Traíras¨
Encarregados de defender o governo, a governadora do Pará, Ana Júlia Carepa, e o prefeito de Porto Velho, Roberto Sobrinho - ambos do PT -, recorreram a expressões típicas do presidente. ¨As elites não colocam em prática uma campanha para reverter a miséria¨, disse Carepa, diante de uma platéia formada por partidos aliados e de oposição.
Ao comentar indiretamente o movimento Cansei, que protestou nas ruas contra Lula, a governadora disse que o grupo não representa a maioria da população. ¨Todos sabem que falamos em nome do nosso povo, e o nosso povo te aplaude¨, comparou. Já o prefeito convidou o presidente a visitar Porto Velho. ¨O senhor jamais receberá uma vaia no nosso município, pois não somos traíras¨, disse ele, aos gritos.
A governadora e o prefeito foram os únicos convidados a discursar. Na platéia estavam 12 governadores de partidos diferentes, como DEM, PMDB, PSDB e PDT. Durante o evento, Lula anunciou uma estimativa de investimento de R$ 6,9 bilhões em saneamento e urbanização em 71 municípios com mais de 150 mil habitantes. Os 12 Estados beneficiados são Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Espírito Santo,Goiás, Maranhão, Pará, Rondônia, Roraima, Santa Catarina e Tocantins, além de cidades do Distrito Federal.
Saneamento
Em seu discurso, Lula destacou os investimentos feitos pelo governo na área de saneamento. E voltou a criticar seus antecessores pela falta de investimentos no setor. No governo deles, acusou, o Tesouro usava os recursos para fazer superávit. Também atacou prefeitos que não priorizam essas obras. ¨Saneamento básico não faz parte da cultura administrativa do País. Não há prefeito que consiga colocar o nome de um parente na manilha¨, acusou. E emendou: ´Não sei que diabo é que essas pessoas gostam tanto de ter dinheiro debaixo do travesseiro.¨
Os maiores problemas sociais do Brasil, prosseguiu, estão nas periferias das grandes cidades, ¨o centro nervoso da sociedade¨. É nesse espaço, avaliou, ¨que as pessoas disputam lugar com ratos e baratas¨.
Críticas à imprensa
Apesar do bom humor, Lula não deixou de criticar o que ele chamou de ¨gloriosa imprensa¨, que ¨resiste¨ a entender os critérios técnicos usados pelo governo para distribuir os recursos públicos.
¨É importante que a nossa gloriosa imprensa registre que nós utilizamos, eu diria, um paradigma técnico, que eu não sei se em outro momento foi feito, pode ser que em algum estado tenha sido feito, em alguma cidade, mas o critério de distribuição dos recursos foi eminentemente técnico e comprometido com os principais problemas de cada cidade.¨
Na avaliação do presidente, o PAC, lançado em janeiro, mudou o padrão de governabilidade do País, facilitando a vida de governadores e prefeitos e acabando com as ¨filas burras¨ dos empréstimos para Estados e municípios.