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Brasil não vai exigir garantias da Bolívia
10/11/2007 - Lu Aiko Otta - O Estado de S.Paulo

Para Marco Aurélio Garcia, País terá as mesmas garantias de hoje, ¨que não foram descumpridas¨

O Brasil não deverá exigir garantias adicionais à Bolívia antes de a Petrobrás retomar os investimentos naquele país. Questionado sobre que tipo de proteção o País teria contra novos sustos no país vizinho, o assessor para Assuntos Internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, afirmou: ¨As mesmas garantias que temos hoje, e que não foram descumpridas em nenhum momento.¨

Segundo Garcia, o governo brasileiro, está disposto a ¨reconstruir os laços¨ entre os dois países e por isso as relações econômicas serão aprofundadas a partir da visita que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fará à Bolívia no mês que vem.


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Na avaliação de Garcia, a América do Sul vive uma situação paradoxal. Somadas as reservas de petróleo, potencial hidrelétrico, biocombustíveis, energia solar e energia eólica, a região deve concentrar a maior reserva energética do mundo. ¨No entanto, quase todos os países estão ameaçados pela crise energética¨, disse. ¨O que falta? Falta integração.¨ Os novos investimentos na Bolívia, explicou, garantirão o abastecimento futuro não só do Brasil, mas também da Argentina e do Chile - se este chegar a um entendimento com o governo boliviano, que exige uma saída soberana para o Pacífico como condição para fornecer o combustível.

A segurança energética foi também tema de uma reunião privada de Lula com o presidente do Paraguai, Nicanor Duarte Frutos. Eles falaram sobre a construção de uma nova linha de transmissão entre a usina de Itaipu e Assunção. A obra deverá custar US$ 200 milhões, será bancada por Itaipu e facilitará a industrialização do país, segundo Garcia. Na avaliação do assessor, o projeto também ajudará a deixar claro que Itaipu não é um instrumento de dominação do Paraguai pelo Brasil.

Há, em partes do setor privado brasileiro, o temor de que o país vizinho se transforme numa ¨nova Bolívia¨ e ponha em risco o abastecimento de energia elétrica. A preocupação é aumentada pelo fato que o Paraguai está em período pré-eleitoral e os candidatos fazem campanha atacando um suposto ¨imperialismo brasileiro¨.

Facilitar a industrialização do país vizinho é, na visão de Garcia, a melhor forma de reduzir a assimetria entre as economias brasileira e paraguaia. Em meados deste ano, a relação entre os dois países ficou tensa depois que a Receita Federal do Brasil apertou a fiscalização na fronteira. A pressão paraguaia levou o governo brasileiro a propor ao Congresso a legalização dos chamados ¨sacoleiros¨. A proposta está no Congresso e anteontem foi tema de discussões dos parlamentares com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Lula e Duarte também falaram sobre o tema.

Ontem, além de participar da 17ª Cúpula Ibero-americana e receber o presidente do Paraguai, Lula teve várias reuniões privadas. Do secretário-geral da Cúpula, Enrique Iglesias, recebeu cumprimentos pela descoberta das reservas de petróleo. Com o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento, Luis Alberto Moreno, tratou de financiamentos para projetos de biocombustíveis que beneficiem pequenos produtores.

Hoje pela manhã, Lula deve se reunir com o presidente da Bolívia, Evo Morales. O encontro deveria ter sido ontem à noite, mas foi adiado por causa do atraso na programação oficial do evento.

Bolívia descumpre acordos com Brasil, diz Itamaraty*

Documento revela que problemas não se restringem ao gás. Vão de embaraços a brasileiros aos mistérios sobre a coca.

O texto ocupa 11 páginas. É assinado pelo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, segundo homem na hierarquia do Itamaraty. Redigiu-o há 54 dias, por requisição da Comissão de Relações Exteriores da Câmara. Revela que os contenciosos que envenenam as relações do Brasil com a Bolívia vão além dos problemas relacionados ao fornecimento de gás. Muito além.

Envolvem, por exemplo, o descumprimento de um acordo bilateral firmado em 2005. Previa a regularização de imigrantes ilegais. Desde então, informa o documento do Itamaraty, o departamento de imigração da Polícia Federal brasileira regularizou a situação de 38 mil bolivianos que viviam irregularmente no Brasil. A Bolívia, em contrapartida, não legalizou nenhum dos brasileiros que residem em seu território à margem da lei –estima-se que são 35 mil.

“O governo de La Paz reconhece estar atrasado na implementação do acordo”, anota Samuel Pinheiro, responsável pela secretaria-geral do Itamaraty. “Alega falta de recursos humanos e materiais [...]”, além da “inexistência de regulamentação específica” que permita dar conseqüência prática ao acordo diplomático. O embaixador menciona, no condicional, uma informação vaga: “Autoridades migratórias do Departamento de Pando [norte da Bolívia] teriam iniciado a regularização de alguns brasileiros ali residentes.” Quantos? Não há vestígio de números.

Os dados repassados por Samuel Pinheiro à Câmara respondem a uma série de perguntas formuladas pelo deputado Raul Jungmann (PPS-PE) e convertidas num requerimento de informações da Câmara. Perguntou-se, por exemplo, como anda a situação de dois tipos específicos de brasileiros: os fazendeiros que plantam soja e criam gado na cidade boliviana de Santa Cruz de La Sierra (cerca de 100 famílias) e os agricultores familiares que vivem na localidade de Pando (algo como 7 mil famílias).

Quanto aos fazendeiros, o documento do Itamaraty anota que, em missão oficial realizada em abril de 2007, um diplomata brasileiro “tomou conhecimento das incertezas que afligem os brasileiros [...], sobretudo no que toca à reforma agrária que o governo de La Paz pretende implementar.” O Itamaraty considera-se de mãos atadas. Alega que só poderá agir, se for o caso, depois que for aprovada a nova Constituição boliviana, cuja tramitação legislativa está empacada há três meses.

O drama dos brasileiros que vivem da agricultura familiar em Pando é ainda mais agudo. É gente pobre. Se estivesse no Brasil, seria clientela típica do Bolsa Família. Diz o texto do Itamaraty: “Correm o risco de ser desalojados das terras que ocupam por força da decisão do governo boliviano de aplicar o dispositivo constitucional de segurança da faixa de fronteira.”

Numa tentativa de evitar a expulsão em massa, Lula editou e o Congresso aprovou medida provisória destinando R$ 20 milhões a um projeto de agrovila para os brasileiros sob ameaça. O problema, diz o Itamaraty, é que “a viabilização da agrovila depende da aprovação de lei na Bolívia que permita a posse de terras por estrangeiros no perímetro urbano da cidade” de Cobija, capital de Panda. E nada do projeto.

A Câmara também requisitou ao Itamaraty informações sobre a cooperação entre Brasil e Bolívia no combate ao tráfico de drogas. Os dados são, de novo, preocupantes. “Entre 2005 e 2006, a área de produção de folha de coca na Bolívia cresceu de 24.400 para 27.500 hectares”, informa o texto. Sob Evo, a Bolívia adotou a política de combater o narcotráfico, mas, simultaneamente, “valorizar” a folha de coca, destinando-a à “industrialização e exportação de produtos derivados.”

O diabo é que a Bolívia é hoje grande fornecedor de matéria-prima para a cocaína que abastece praças como o Rio e São Paulo e é exportada para outros países a partir do Brasil. E o governo de Evo Morales se recusa a compartilhar informações com o Brasil e com os organismos multilaterias de combate ao narcotráfico. O texto do Itamaraty dá detalhes encrenca: “A Bolívia foi suspensa, em julho de 2007, do Grupo Egmont”, entidade internacional que reúne órgãos de inteligência de 105 países, voltados à repressão da lavagem de dinheiro e do terrorismo.

“A pedido do Brasil, a expulsão foi postergada”, acrescenta o texto do Itamaraty. Enviou-se à Bolívia delegação integrada por brasileiros e chilenos. Avistaram-se com autoridades bolivianas entre 24 e 26 de junho de 2007. “Sem resultado”, anota Samuel Pinheiro. A recusa da gestão Evo em compartilhar informações ameaça a Bolívia de exclusão também do GAFISUD (Grupo de Ação Financeira da América do Sul).

O Brasil vem tentando, de sua parte, reativar as comissões mistas antidrogas que mantém com La Paz. O último encontro ocorreu em 2004, antes da posse de Evo Morales, em janeiro de 2006. Em fevereiro de 2007, numa visita ao Brasil, o presidente boliviano assinou comunicado conjunto comprometendo-se em relaizar, “no mais breve prazo possível, reuniao da comissão mista antidrogas.” Até agora, nada.

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*Blog de Josias de Souza - Folha Online

  

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