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Santa Cruz dá início a polêmico referendo por autonomia
04/05/2008 - Folha Online com France Presse

Os postos de votação no departamento de Santa Cruz, na Bolívia, foram abertos neste domingo por volta das 8h locais (9h de Brasília), dando início a um polêmico referendo sobre a aprovação de um estatuto que determina mais autonomia em relação ao governo central.

O texto prevê que o departamento (Estado) seja responsável em questões como direito de propriedade, administração, educação, transporte, distribuição de terras e hidrocarbonetos, atualmente controladas pelo governo de La Paz.

Apesar da tensão que precedeu os dias antes da votação, os centros de votação foram abertos com tranqüilidade neste domingo. Mesmo assim, algumas estradas em zonas rurais amanheceram bloqueadas como forma de protesto à consulta popular. O objetivo dos bloqueios é atrapalhar o andamento do referendo, informaram líderes civis do departamento.


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Estradas

Ao menos duas estradas importantes que ligam a região aos departamentos de Cochabamba e Beni foram bloqueadas na altura de San Julián e Yacacaní, contaram líderes camponeses de grupos aliados ao presidente Evo Morales, que considera o referendo ilegal.

¨As urnas de votação não serão abertas em San Julián¨, afirmou à imprensa o dirigente Juan Barrea, que anunciou o fechamento temporário da estrada.

¨Tivemos uma concentração de camponeses em San Julián e decidimos pelo bloqueio da estrada que nos liga à cidade de Trinidad, que já começou¨, confirmou por telefone à agência de notícias France Presse o líder agrário de San Julián, Venancio Cortez Méndez.

Em Yapacaní, a estrada Santa Cruz-Cochabamba, importante trecho da estrada que liga o país aos vizinhos Brasil e Chile, também foi bloqueada, segundo Ambrosio Choque, da prefeitura da comarca de San Germán.

O porta-voz da Presidência Iván Canelas denunciou que os líderes do referendo estão ¨levando pessoas em vários caminhões até Santa Cruz para manter o controle da votação ou para votar¨. ¨Tomara que não estejam indo para criar enfrentamentos¨, disse.

As zonas rurais de San Julián, Yapacaní e Cuatro Cañadas são fiéis bastiões eleitorais do presidente Evo Morales e questionam o comitê civil-empresarial de Santa Cruz, que promove a votação do estatuto para formar o primeiro governo regional autônomo da Bolívia.

Ameaças

Nos últimos dias, os grupos partidários a Evo Morales na região ameaçaram impedir as votações com queima de urnas e bloqueio de estradas, alegando que o estatuto é separatista e a sua aprovação ¨dividiria¨ o país.

A votação está sendo organizada pela Corte Eleitoral Departamental (Estadual) de Santa Cruz e será realizada entre 8h (9h em Brasília) e 18h (19h em Brasília). Cerca de 900 mil eleitores são esperados às urnas, mas o voto não é obrigatório.

Os líderes civis de Santa Cruz que pedem mais autonomia são coordenados pelo governador Rubén Costas. A Corte Nacional Eleitoral considera o referendo ilegal e afirmou que não reconhecerá o seu resultado, baseada no argumento da falta de poderes legais do departamento para realizá-lo.

A elite econômica de Santa Cruz lidera o anseio de que a região, de 370 mil km2 e 2,5 milhões de habitantes, alcance autonomia do poder central, o que permitiria ter um maior controle político e, principalmente, econômico. O departamento é responsável por 30% do PIB da Bolívia.

Santa Cruz está localizada, em grande parte, em uma extensa planície fértil na fronteira com o Paraguai e o Brasil, em um local propício para a agricultura e a pecuária --atividades que se converteram em fonte importante para a riqueza do país, principalmente a soja, a cana-de-açúcar, o algodão, a carne, o couro e a madeira.

Outros referendos

Além de Santa Cruz, outros três departamentos querem conseguir a autonomia: Beni, Pando e Tarija. Os dois primeiros marcaram referendos, separadamente, para o dia 1º de junho. No dia 22, será a vez de Tarija.

O poder econômico dos quatro departamentos representa cerca de 80% do PIB da Bolívia, o que permite um confronto direto dos governadores locais com o presidente Evo Morales.

As divergências começaram em janeiro de 2006, com o começo da administração Morales, que pretende fazer uma economia com grande intervenção estatal para buscar um maior acesso às terras para os indígenas e camponeses, os governos locais, ao contrário, querem uma economia de livre comércio, com grandes empresas e latifúndios.

Acusações

A acusação mais dura contra a tentativa autonomista de Santa Cruz é a de expressar um projeto separatista que colocaria em risco a unidade e a integridade territorial do país. ¨Querem separar Santa Cruz do território nacional e isso não permitiremos¨, disse o porta-voz oficial, Alex Contreras.

O vice-ministro da Descentralização Administrativa, Fabian Yaksic, afirma que ¨por trás dos estatutos autonômicos está a tentativa de estabelecer Estados associados que rompam com a unidade da Bolívia¨.

O Conselho Supremo da Defesa Nacional também sustenta que a eventual aplicação desse estatuto autonômico seria ¨uma ameaça ao território nacional¨, de acordo com informe apresentado pelo comando militar ao presidente Morales.

O ex-ministro Guillermo Capobianco, alinhado com a oposição, qualificou neste sábado (3) como ¨uma calúnia¨ as acusações de separatismo em sua coluna no ¨El Deber¨, principal jornal de Santa Cruz.

A possibilidade de vitória do ¨sim¨ na consulta declarada ilegal prevê também a questão jurídica de adequação depois do projeto de nova Constituição, que o governo propõe e a oposição repudia, ao estatuto autonômico regional.

¨Isso é como ter um bebê sem mãe, não é possível. Primeiro é necessário ter uma mãe, assim como a Constituição política. E a partir disso nasce o bebê, o estatuto autonômico¨, afirmou o presidente Morales.

Os opositores a Morales se recusaram a dialogar antes da votação, o que sinaliza que pretendem utilizar um suposto resultado positivo para negociar uma posição.

  

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