Bolivianos cruzam a fronteira e se refugiam no Acre 17/09/2008
- O estado de S.Paulo
Entre os que buscam refúgio no Brasil estão senador da oposição e a presidente do Comitê Cívico de Pando
Pelo menos 100 bolivianos fugiram do Departamento de Pando, na fronteira com o Acre, para se refugiarem na cidade de Brasiléia, já em território brasileiro, onde pediram às autoridades locais para serem alojadas em abrigos, informou a imprensa local na noite de terça-feira, 16. Entre os quase mil bolivianos que fugiram desde quinta-feira passada, está Paulo Bravo, senador do departamento autonomista de Pando pelo partido Podemos (de oposição a Evo Morales), e a presidente do Comitê Cívico de Pando, a opositora Ana Melena.
O exôdo teve início após o massacre de pelo menos 18 camponeses que faziam um protesto pró-Evo na semana passada. Os bolivianos cruzaram a fronteira de Cobija, onde na terça-feira foi detido o governador de Pando, Leopoldo Fernández, acusado de ¨genocídio¨ por sua suposta responsabilidade na morte de pelo menos 15 pessoas.
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Emissoras de La Paz mostraram imagens de vários bolivianos pedindo às autoridades de Brasiléia, no Acre, um lugar onde pudessem passar a noite, já que não queriam permanecer na Bolívia por medo de serem detidas pelos militares que ocupam Cobija desde que, na semana passada, foi decretado estado de sítio na região. Segundo o canal Unitel, um dos bolivianos que está em Brasiléia é a presidente do Comitê Cívico de Pando, a opositora Ana Melena.
O defensor público boliviano, Waldo Albarracín, visitou o grupo e pediu às autoridades de seu país garantias para que o grupo possa voltar para casa em segurança. Um dos bolivianos disse à Unitel que estava sendo feita uma lista de todos que ganhariam abrigo em asilos e no Corpo de Bombeiros de Brasiléia e da vizinha Epitaciolândia, ambas na fronteira com Cobija.
O fluxo de famílias recém-chegadas ao Brasil ameaça sobrecarregar os serviços públicos tanto de Brasiléia quanto da vizinha Epitaciolândia e já colocou em alerta o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), que manteve reuniões com o Itamaraty e Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) na tarde de terça, em Brasília. ¨Se esse fluxo continuar, vai sobrecarregar a prefeitura¨, disse o vice-prefeito de Brasiléia, Antônio Pacífico (PSB). ¨Muitos se hospedam em casa de amigos, mas não sabemos onde isso vai parar.¨
Do lado brasileiro, os recém-chegados foram recebidos em casas de amigos e parentes, mas alguns buscaram hotéis da cidade. Um grupo de dez bolivianos chegou a acampar próximo do ginásio local, antes de ser transferido pela prefeitura. O representante da Secretaria de Articulação Institucional do Governo do Estado do Acre, José Alvani, foi enviado à cidade e não descartou a necessidade de campanhas públicas de arrecadação de alimentos: ¨Por enquanto temos prédios públicos que servem de abrigo, colchões e comida, mas, se for o caso, vamos aumentar a ajuda e pedir contribuições.¨
Os brasileiros que fugiram de Pando nos últimos dias foram acomodados na Casa de Cultura de Brasiléia, mantida pelo Sindicato de Trabalhadores Rurais. Metade dos desabrigados é de crianças. Entre os adultos, a maioria é de mulheres. ¨Fugi com meu marido e os dois filhos, um de 8 anos e outro de 1 ano e meio¨, contou Maria Raimunda Silva Abreu, caseira de uma chácara em Estrada Porto Rico, próxima de Cobija, capital do departamento boliviano. ¨Quando ocorria tiroteio de noite as crianças se agarravam em mim, chamando ?mamãe, mamãe?. Eu tinha a sensação de que ia morrer¨, conta Maria Raimunda. ¨Vamos ficar por aqui agora. Não sei até quando.¨
Para prestar ajuda humanitária aos recém-chegados, a Defesa Civil montou um grupo de trabalho com representantes das prefeituras, sindicatos, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros. O grupo avalia que as famílias que fogem para o Brasil têm medo das ameaças, dos tiroteios e dos bloqueios de estradas, mas poucos chegam feridos ou doentes. ¨Eu estava agora na ponte da divisa com a Bolívia e posso assegurar que o trânsito de pessoas está completamente liberado¨, disse o vice-prefeito de Brasiléia.